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Segunda-feira,
2/1/2017
Ano novo, casa nova.
ANDRÉ LUIZ ALVEZ
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Depois de quase duas décadas morando na mesma casa, eis que enfim nos mudamos para a casa nova. Mudanças me causam o assombro de tudo que é novo e qualquer pensar ligeiro, remete à antiga morada. Na casa antiga deixei meu pé de limão, boas lembranças e os gatos que não quiseram nos acompanhar. As paredes que agora nos cercam são azuis e até o cheiro daqui é diferente, mas posso ver da sacada a cidade abaixo, pulsando no ritmo acelerado de sempre. Dizem que para ser completo, todo homem precisa escrever um livro, ter filhos e plantar uma árvore. Eu já escrevi quatro livros e tenho dois filhos, então, só me falta plantar a árvore. A casa nova é de esquina, no cruzamento de duas ruas de pouco movimento, típico dos condomínios fechados, cortado pelo verde das árvores lá fora, o que me faz sentir falta da jabuticabeira no antigo quintal, que dá frutos adocicados, que eu tentava dividir com os passarinhos, mas que quase sempre acabava em brigas, porque os bichos bicavam as frutas maiores antes que os meus dedos a tocassem. Passarinhos existem aos bocados por aqui, como o casal de coruja que fez casa cavoucando o barranco que fecha os muros. As corujas também estão de casa nova. Num relance percebo que preciso mudar a posição da última lâmpada, que dela desprende um feixe luminoso que apaga o arco-íris. Um casal de tucanos corta o ar, seguidos de pássaros que desconheço, trazendo até a minha lembrança os tempos que as andorinhas tingiam de cinza o céu da cidade a todo entardecer. Que fim levaram as andorinhas? Ajeito meu corpo na almofada do sofá com todo cuidado, que o sofá me custou os olhos da cara. Dois mil e dezessete há de ser melhor que o ano passado. Os pássaros prosseguem atravessando o céu da nova casa, cortando o silêncio, que só não é completo porque é rota dos aviões, mas que na imaginação, faço deles desenhos de outros pássaros maiores, daqueles que não existem mais. Ainda há pouco, percebi a distante luz dos olhos de um novo vizinho e fiz com as mãos um aceno breve, sem jeito, que selou talvez o início de uma nova amizade. Algumas boas lembranças da casa velha me beliscam, provocando a dor da saudade: Meus filhos nasceram na casa velha, grandes amigos moram nos arredores, o meu nariz reclama a falta do cheiro das telhas de barro e uma aflição toma conta de mim ao perceber que tudo era perto da antiga casa e que agora, até para comer, tenho que atravessar a cidade. Detesto mudanças, mas entre um gole de café e outro, permito que a casa nova me preencha. Por aqui espero passar uma velhice tranqüila, observando a tinta dos muros secar nos anos vindouros, durante os quais, solenemente permitirei o sopro do vento esticar a manga da minha camisa, até que a irresistível vontade me faça tocar a terra com as mãos e cumprir a última missão, aquela de plantar uma árvore, o pé de jaboticaba, que é para recordar sempre da casa antiga e ter o pretexto para quando as frutas ficarem maduras, brincar de brigar com os passarinhos.
Postado por ANDRÉ LUIZ ALVEZ
Em
2/1/2017 às 18h43
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