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Sábado,
10/3/2018
E agora, Carlos?
Mirian de Carvalho (e-mail: [email protected])
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E agora, Carlos?
Ah! Mundo mundo! Ainda procuro a poesia.
Sentado de costas pro mar, minha angústia
burila inventário das raízes e pedras do verso.
Eu, que elaborei poéticas do comedimento, depois aprendi
que a poesia se revela entre contradições e inquietudes.
Por isso, cantei os acontecimentos da vida.
Eu, que um dia neguei ao poema sentimentos,
me deixei levar pelo lirismo.
E até pela sensualidade.
É, Carlos, sempre repito pra mim mesmo: um dia o poema
se faz de um jeito. No outro, diverge. Depois, não se sabe.
Entanto, guardo convicções: não mentir nem louvar dinheiros,
porque o poema traz, às claras, todas as farpas da hipocrisia.
Ocupam-me agora o canto e sua origem numa exata indefinição:
densa névoa do desvelamento ─ a poesia.
férrea fragilidade ─ minha chave de cristal.
Minha chave de abrir!
Assim, recusando ideias de antes, não deixei em paz
minha cidade. Itabira ─ coração do meu coração ─,
hoje e sempre, guardará retratos, bois, amores, utopias.
Também não deixei em paz esta cidade onde vivo.
Aqui sentado junto à praia, me acalenta
o ritmo das águas lavando tapetes de espuma.
A esse enlevo, dos espelhos às lembranças,
desdizendo outras certezas de antes,
dramatizei, invoquei.
E perguntei.
No íntimo, me persegue esta pergunta
que não pára de me perguntar: E agora, Carlos?
Neste momento, meu memorial de confissão:
Tendo eu um dia recusado ao canto a natureza,
conduziram-me encantamentos e verdades do olhar.
Então, iluminei o sol. E, diante da sua longa cabeleira de luz,
confesso meu maior engano: ter negado à poesia
a sociedade dos humanos. Para me redimir dessa falta,
junto ao corpo do leiteiro assassinado, fiz nascer
uma flor ─ minha rosa do povo.
Mas a violência perpetua-se.
E agora, Carlos?
Ah! Agora, tudo o que sei é indignação, ironia,
náusea. E ternura, ao giro da minha chave de cristal.
Despojada da palavra, a matéria desse objeto
me conduz ao nascedouro da linguagem,
pois que o poema não se faz de palavras prontas.
Voz do corpo e da alma, a poesia emerge dos desejos.
Silencioso grito primal gritando não ditos ─ o poema.
Quanto às palavras, insisto em rejeitar-lhes a face neutra
e essa mania de ficar em cima do muro do dicionário,
esquecendo-se da linguagem inascida.
Pois é, Carlos,
sempre digo a mim mesmo: vazias de sons e ritmo,
as palavras se dispersam em alheamento.
Ao exílio das palavras, aquela chave me conduz
ao verso, para dar voz aos sentimentos do mundo.
E esperanças àqueles que não podem falar.
Ad aeternum, procuro a poesia.
Postado por Mirian de Carvalho (e-mail: [email protected])
Em
10/3/2018 às 10h31
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