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Sexta-feira,
4/5/2018
Filosofia no colégio
Felipe Pait
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Fiz uma leitura do artigo
EFEITOS DA INSERÇÃO DAS DISCIPLINAS DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NO ENSINO MÉDIO SOBRE O DESEMPENHO ESCOLAR
de Thais Waideman Niquito e Adolfo Sachsida, abril 2018. Um parecer de revisor seguiria as seguintes linhas.
O artigo apresenta 2 modelos lineares, as equações (1) e (2). Não fica claro qual dos modelos é usado, se algum deles. A modelagem consistiria em calcular valores dos parâmetros beta ou alpha, mas os parâmetros só aparecem uma vez no artigo. Sem explicitar a relação com os modelos, não é possível interpretar as tabelas.
Há variáveis indefinidas ou definidas multiplamente. Exemplo: O vetor de covariadas X_{it} contém dados dos indivíduos como dito após (1), ou das escolas como após (2)? O parâmetro epsilon também é multiplamente definido. As tabelas deixam dúvida sobre qual exatamente são as variáveis listadas. Parece ser apenas um problema de redação.
Os valores p são indicados com 1, 2, ou 3 asteriscos. E os números sem asterisco, qual a significância? Considerando que são apresentadas dezenas de variações, positivas e negativas, é provável que apareçam correlações meramente aleatórias com probabilidade individual menor que 5%.
Já que o artigo na forma distribuída não faz a conexão entre modelo e as tabelas, minha leitura tem que se restringir ao texto. A dúvida mais evidente é que as pioras referidas são da ordem de 1% do desvio padrão - quantidades muito pequenas em vista das mudanças qualitativas nos exames e nas mudanças de tamanho e composição dos estudantes mostradas na tabela 3.1. Minha maior dúvida é que a análise de efeito é forçosamente diferencial - mede a diferença entre as notas em um ano e outro. Mas as medidas são muito ruidosas, e a diferença entre medidas tem uma relação sinal-ruído baixa. Para ter uma noção disso seria indispensável saber algo sobre os parâmetros alpha, beta, e epsilon, que aparecem nos modelos mas não são discutidos na sequência.
A relação de causalidade expressa no resumo "Os resultados mostram efeito negativo da inclusão dessas disciplinas sobre diversas áreas do conhecimento, sobretudo sobre o desempenho em matemática" não encontra justificativa no artigo. Mesmo se variações significativas fossem detectadas, o que não fica claro devido às observações anteriores, é possível imaginar inúmeros mecanismos explicativos que não a causalidade. Por exemplo: auto-seleção da introdução de novas disciplinas por escola e por aluno correlacionada com desempenho. Mesmo um mecanismo fraco de causa comum poderia explicar as pequenas variações detectadas.
Outra possibilidade é que mudanças curriculares, concomitantes mas não necessariamente coincidentes com a introdução de novas disciplinas, tenham tido efeito de aumentar ou diminuir a preparação dos estudantes para exames padronizados, ou para seções dos exames. Isso poderia refletir o julgamento de algumas escolas e alunos de que a finalidade do ensino não é a preparação para o Enem.
Em resumo: embora possa conter contribuições publicáveis, o artigo é pouco acessível na forma como foi redigido. As afirmações feitas não estão devidamente apoiadas pela análise dos dados. A metodologia é discutível e, na forma apresentada, insuficiente para estabelecer causalidade.
(Enviei o texto acima ao 2o autor, que gentilmente disponibilizou preprint. Já que o artigo foi bastante comentado nas redes sociais, não me parece inadequado dar minha opinião nesse blog.)
Postado por Felipe Pait
Em
4/5/2018 às 11h24
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