Mais do que nada
Menos do que nada
Tudo e nada
Tudo é nada
O que se soma
e o que se subtrai
a vida traz
a vida tira
a vida trai
Eis que o passado
se passou num átimo
a quem atônito
viu nascerem os dias
para morrerem nas noites
ardendo queimando
anos a fio
até o fim do pavio
Não obstante seguimos
atravessando os caminhos
entre os amores e dores
entre desejos e sonhos
tropeços sustos recomeços
dramas mortes de permeio
Que belo quadro compõe-se
na manhã primaveril
que Cronos come aos pedaços
com seus dentes de esmeril
O aceno ao longe do cais
as formas se desfazendo
as cores esmaecendo
a densa névoa escondendo
o adeus de cada partida
o vento contra levando
todas as vozes amigas
Mirando a vida é o que vejo
no exílio de um quinto andar
Vejo um renascer do quadro
cor a cor traço por traço
em arte de imitação
um quadro que se repete
sem qualquer renovação
E a mecânica celeste
joga os dados da ilusão...
...e tudo afinal é nada
aquém ou além do nada
nem mais nem menos que nada
a quem se afoga no agora
na aridez dessas horas
como um náufrago sem mar
Ayrton Pereira da Silva