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Domingo,
3/2/2019
MOMENTOS
Ayrton Pereira da Silva
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Hypocrite lecteur, mon semblabe, mon frère Baudelaire
Não recordo onde nem quando, mas faz muito tempo. Era madrugada e as luzes das casas estavam todas apagadas. Parecia uma cidade fantasma, enquanto eu perambulava pelas ruas desertas, quando me deparei com uma jovem deitada na grama de um jardim público, contemplando as estrelas. Era uma cena insólita. Movido pela curiosidade e vencendo minha habitual timidez, aproximei-me e lhe pedindo licença deitei ao seu lado.
Incomodo você? Não, pode ficar. Guardei, por precaução, uma distância regulamentar, nem muito longe nem muito perto. Você é formada em astronomia? Não, não sou. E ela parou por aí. Acho que chutei uma bola fora, pensei, mas fui compelido a não deixar a conversa morrer. Então o que você é?
Sou astróloga, pela conjunção dos astros e estrelas posso prever certos eventos, mas nem todos. A ideia de conjunções astrais me pareceu conter um toque erótico, embora fosse só uma suposição, talvez por causa de seu hálito envolvente, que me tonteava. A essa altura comecei a duvidar de minha sanidade mental. O que será que tá bulindo comigo, perguntei-me em pensamento. Era de fato muito estranho, como se algo surreal se intercalasse com a realidade e eu estivesse flutuando a esmo entre a verdade e a mentira dos sentidos. Então a moça indagou se não queria ler nos astros meu futuro.
Já sei qual é, querida: um dia qualquer vou morrer, viu?
Não me referi à morte, seu bobo, mas aos detalhes da vida. Estes é que valem! Um longo silêncio, denso, palpável desceu sobre nós. Bem, já que você não quer saber, vou tomar a iniciativa.
Me puxou pelas mãos e então levantamos juntos, nossos lábios quase se tocando... Sei que você aí, meu presumível leitor, está se babando de curiosidade para saber o que irá acontecer. Eu também. Mas isso é o futuro próximo e distante, e não seremos nós que iremos vivê-lo. Somente aqueles dois. Não eu e nem você. Nós viveremos cada qual o nosso futuro (se vivermos até lá).
Em suma: a eles o que é deles, a nós o que é nosso. Chato, não é? Mais que isso: frustrante. Mas assim funciona a dinâmica da vida, sempre imprevisível, desconcertante.
E ponto final.
Ayrton Pereira da Silva
Postado por Ayrton Pereira da Silva
Em
3/2/2019 às 16h47
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