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Quinta-feira,
9/1/2020
Quando estive em Hollywood
Anchieta Rocha
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Fiquei puto comigo porque perdi a menina prum amigo. Fiquei puto porque eu tinha que ser como os caras nos filmes. Tinha que fazer que nem o William Holden no Férias de Amor, num feriado, num tempo em que as pessoas faziam piquenique.
Saltando dum trem de carga numa cidade do interior, fazendo bico, limpando quintal, flertou com a Kim Novak na varanda da casa ao lado. De noite, fim de festa, a orquestra tocando Moonglow, os violinos nas notas agudas arrepiando a nuca, marcando a música com o estalar dos dedos, sem ninguém entender nada, roubou a moça do ricaço da cidade.
Num domingo à tarde fui com três amigos conhecer a BR-3. Nunca tinha visto uma rodovia asfaltada, só em filme. A BR-3 era a coisa mais bonita. Viajava de trem, em estradas poeirentas, esburacadas, os ônibus sacolejando o tempo todo.
Do Centro pegamos carona com um cara que tinha um sítio em Água Limpa. Descemos na Lagoa Seca, o paredão da Serra do Curral logo na frente. Bonito ficou quando o sol avermelhou pros lados de Betim.
— A reta da estrada tem que aparecer — eu disse pro vendedor de laranja ao receber a Kodak Caixote do Beto.
Todo mundo fazendo pose, me lembrei duma foto que tinha saído no Cruzeiro, o James Dean num dia chuvoso, encolhido de frio, as mãos enfiadas no bolso do sobretudo, a gola até o queixo, franzindo a sobrancelha como costumava fazer. Apesar do calorão danado, eu levantei a gola da camisa, botei um cigarro na boca, comprimi os olhos como ele e esperei o clique da máquina.
Em casa de noite minha irmã veio: “Andar o dia inteiro, subir e descer morro pra ver uma estrada?”
Eu tinha estado em Hollywood. Ela não entendia. Ela nunca ia entender.
Postado por Anchieta Rocha
Em
9/1/2020 às 22h29
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