COLUNAS
Segunda-feira,
31/3/2003
Amor à segunda vista
Alessandro Garcia
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Serão as comédias românticas, afinal, um gênero infalível, capazes de abrigar desde astros em fim de carreira, até promessas de Hollywood que acabaram não dando muito certo como grandes estrelas? Não é uma pergunta tão difícil de se responder, considerando-se o fato de que, na maioria das vezes, tal estilo consegue garantir um bom sucesso de bilheteria e, até em algumas vezes, ainda que não muitas, alça ao panteão da fama alguns atores e atrizes. Se existem aqueles que parecem ter de se resignar em trabalhar somente em tal categoria, existem aqueles também que ficaram conhecidos como fazedores de apaixonados inveterados, tentaram pulular em outros gêneros, e acabaram voltando para a casa que primeiro lhes acolheu. Como exemplo deste último tipo de artista, podemos citar se m medo de errar a eterna loirinha apaixonada Meg Ryan. Já, como exemplo da segunda questão colocada no alto do texto, é óbvio que estou falando de Sandra Bullock, uma estrela feita para rivalizar com a fama de Julia Roberts, e, apesar de nunca ter sido considerada um grande sucesso de crítica, nem arrebatado a legião de fãs de Julia, tem conseguido se manter na ativa com uma série de filminhos de comédia romântica - entremeados com algo mais, digamos assim, ousado, tal qual Cálculo Mortal -, e agradado aos namorados que se juntam no final de semana a fim de assistir a algo mais ameno e compatível com a aura apaixonada que os cercam.
De vez em quando eu mesmo me rendo ao apelo que as comédias românticas sugerem e de mãos dadas com minha menininha vou conferir o que estes fazedores de enlevo romântico têm aprontado para nós. E foi por isto (ah, a eterna justificativa para a questão "mas por que perder tempo com algo que você já sabe qual será o final?") que fui conferir o que me aguardava ao assistir a Amor à Segunda Vista. Apesar de sabermos que a coisa funciona mais ou menos regida por duas fórmulas...
a) homem-se-apaixona-por-mulher-que-também-se-apaixona-por-ele-mas-prefere-fazer-um-joguinho-para-ter-certeza-de-que-foram-feitos-um-para-o-outro-e-viverem-felizes-para-sempre. Exemplo: Escrito nas Estrelas.
b) homem-e-mulher-que-se-detestam-ou-não-tem-nada-a-ver-um-com-o-outro-se-descobrem-apaixonados-e-vivem-felizes-para-sempre. Exemplo: Amor à Segunda Vista.
...ainda assim nos fazemos de desentendidos e vamos, enlevados, nos deixar encantar por qualquer baboseira romântica que um roteiro furado nos impõe. Mas, mesmo com a melhor das boas vontades, é bem difícil de se conseguir engolir certas forçadas de barra ao extremo com argumentos tão inverossímeis quanto em Amor....
Bueno, que tudo tem início quando Sandra Bullock, uma advogada ativista e politicamente engajada em causas sociais, começa, sem mais nem menos, e sem grandes necessidades de insistência, a trabalhar para Hugh Grant, um mega empresário estilo Donald Trump (que, aliás, faz uma pontinha no filme, tal qual Norah Jones, cantando um jazzinho para encantar nossos protagonistas), símbolo de tudo o que ela mais insiste em dizer que abomina. Grant não se distancia muito dos seus papéis anteriores (com exceção, talvez de Um Grande Garoto e Medidas Extremas): faz o papel de um cara imaturo, atrapalhado e mulherengo, muito embora este último quesito fique mais sugestionado do que realmente mostrado e que funciona na empresa como uma bela fachada, já que os negócios são realmente tocados por seu irmão, destituído de belos dotes físicos. Com alguma dificuldade de roteiro, o diretor e também roteirista Marc Lawrence (autor de Miss Simpatia e Forças do Destino) demonstra a passagem do tempo e o suposto estreitamento de relação através de legendas que informam que tantas semanas e tantos meses se passaram e tudo entre eles vai ficando mais aproximado. Quando Bullock, com seus mesmos cacoetes de sempre e sua interpretação mestre de solteirona atrapalhada, mas com algum charme, demonstra que se encontra cansada e destituída de seus grandes ideais sociais - sempre abastecidos por seus pais, também advogados que implantaram na filha a luta pelas causas dignas - resolve pedir demissão da empresa onde se tornou uma espécie de peça indispensável para o fútil personagem de Grant. Desde escolher a gravata até elaborar seus discursos mais simples, é desta maneira que o diretor vai nos demonstrando, com sua sutileza de paquiderme, o quanto o casal vai se tornando importante mutuamente. Sendo assim, ela pede então seu aviso prévio de demissão (ah, então isto é o aviso de duas semanas, do título original?), e, na mesma medida que procura uma advogada tão perfeita quanto ela mesma para substituí-la (sim, a personagem de Sandra é a perfeita CDF), ela descobre que, além de ciúmes de Grant, existe algo mais nele que lhe atrai.
Até que os dois se dêem conta plenamente deste fato, transcorre muito tempo. Poucos, no entanto, demonstrando realmente uma atração, que surge de maneira meio apressada, próximo ao final do filme. Nada que não garanta alguns bons momentos de risadas, já que Hugh Grant consegue ser engraçado com aquele jeitão de inglês sofisticadamente desajeitado. Bullock também não derrapa ao todo, e, ainda que muitas vezes fique aquela sensação de déjà-vu constante, em relação à sua personagem, conseguimos, sim, nos encantar com sua atrapalhadinha que revela algum charme quando descobre que é uma mulher.
Não foi a melhor forma de juntar estes dois atores que ainda rendem bons filmes, mas a iniciativa é válida. Se as coisas transcorrem com uma superficialidade que não convence muito, também é verdade que, com algum esforço, conseguimos algumas risadas cúmplices. Cúmplices com a pessoa ao lado, que, assim como nós, precisou fingir que a história era nova e que não sabia que, ao final, eles seriam felizes para sempre.
Nota do Editor
Alessandro Garcia é escritor, publicitário e pode ser encontrado no Suburbana.
Alessandro Garcia
Porto Alegre,
31/3/2003
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