Soap opera é como os norte-americanos chamam as suas novelas. A denominação
vem dos anos 50, quando o gênero nascia. O público era certo: as mulheres da
emergente classe média dos EUA no pós-guerra. Por isso, as novelas atraíram
os publicitários de produtos femininos que perceberam o filão que existia. Quem mais
anunciou foram as empresas de sabão. Daí o nome que permanece até os dias de hoje.
E foi este o título que o escritor e dramaturgo Marcos Rey escolheu para esta novela
ambientada nos anos 50 e que mostra uma família de classe média baixa enrolada em diversas
"trapalhadas" no melhor estilo das novelas de chanchadas.
A começar pelo chefe da família Manfredo Manfredi, dono de uma transportadora que faz
mudanças e seduz viúvas. Ex-fascista (deu o nome de Benito ao primogênito), ex-comunista
(o segundo filho acabou se chamando Lenine) e atual getulista, ficou totalmente louco
quando ouviu no rádio a notícia sobre o suicídio de Getúlio Vargas. Era 1954.
Não havia mais nada a fazer do que pegar seu revólver e ir até o Rio de Janeiro matar
o maior desafeto do seu presidente: o jornalista Carlos Lacerda. Como sabemos,
o italiano nunca chegou ao Rio. Antes, perdeu-se nas saias de uma viúva na Vila
Mariana.
E, na sua ausência, o resto da família Manfredi, já acostumada com os sumiços
do patriarca (e nunca levando muito a sério suas ameaças trágicas), decide mudar de
uma forma definitiva. A começar por sua mulher, Hilda, também conhecida como Madame
Zohra na rádio Ipiranga, que dá conselhos usando a astrologia e faz campanha
contra o aborto.
Às voltas com três filhos pouco interessados em conselhos maternos (Adriana é a
caçula), Hilda passará por uma completa reformulação de sua vida e de suas crenças
quando enfrentar a gravidez indesejada de uma namorada do filho Lenine.
O livro é um misto de intriga, de comédia de costumes e de novela de rádio, construído
com leveza e no estilo folhetinesco que lembra tão bem a chamada Idade de Ouro
paulistana. Ao final temos uma "ópera de sabão" divertida e interessante, com
personagens bem construídos e um final envolvente.
Como em toda novela (mais no sentido televisivo do que literário) a história
acaba sendo redonda demais, certinha demais. Mas isso deve ser um vício que Marcos
Rey adquiriu no rádio e na TV, onde trabalhou durante muitos anos. (Também se dedicou
à literatura infanto-juvenil.)
Essa falta de algum elemento de ruptura na trama torna-a superficial. E isso
pode ser melhor visto nos personagens que são tratados quase que apenas externamente.
O caso de Hilda, a mulher que, para salvar a família, acaba abrindo mão de suas
convicções e é, sem dúvida, a que mais sofre com as mudanças, mostra este problema
no livro: seu personagem não sofre por nenhum tormento interno, todas as mudanças são
externas (pedido de demissão, etc). Parece que todos são meros representantes de uma "fala".
Isso torna o livro um excelente divertimento, mas não muito mais do que isso.
Para ir além