COLUNAS
Quinta-feira,
27/9/2001
País do Carnaval II
Sergio Faria
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Hoje vou comer uma pizza mezzo calabresa, mezzo aliche, mezzo marguerita
(ah, só tem duas metades? Então dispenso o aliche, o que se pode fazer?) na
Speranza, a velha e
querida casa dos Tarallo, no Bixiga. Serei recebido pelo abraço afetuoso do
meu amigo Gutierrez, que nunca na vida ouviu falar em blog. Conversaremos
sobre a última maratona que ele correu. Pedirei um chope e um pedaço de
tórtano, o generoso pão de lingüiça que só se faz naquele abençoado forno a
lenha. E aguardarei pacientemente que fique vaga a minha mesa, na primeira
sala, perto do forno, porque ali as noites sempre acabaram bem. E serei
feliz, porque a felicidade é feita de coisas simples. E muitas vezes
absolutamente previsíveis.
* * *
Rufos! Respeitável público! Hoje descobri um circo! Chama-se Internazionale Circo di Napoli. Lindo, todo iluminado,
lona nova, aquele jeitão crássico de circo que possui atmosfera de circo.
Deve ter serragem no chão, claro. E cheiro de circo, principalmente. Talvez
tenha o incrível e extraordinário Globo da Morte! E, certamente, terá uma
linda trapezista e uma tesudíssima partner de mágico! Merece aplausos!
Encontra-se armado numa avenida que eu não sei o nome, mas sei ensinar: você
vai pela Av. dos Bandeirantes [SP] sempre reto, reto, reto, reto, reto, como
se fosse para o ABC. Daí passa dentro de um túnel e continua reto, reto,
reto, reto, reto, até ver o circo à sua direita. Um baita circão dos
grandes! Êêê, beleza.
* * *
Ih cacete, e agora? O cônsul
honorário do Brasil em Jidá, na Arábia Saudita, é irmão de ninguém menos
que o fulano Osama Sin-salabin-bin Laden. Foi nomeado no tempo do Zé Sarney
presidente, porque é casado com uma maranhense. É a vocação inequívoca dos
Sarney: no passado, no presente e no futuro podemos contar com eles pra
fazer cagada.
* * *
Circunstâncias de trabalho, digamos, não-solucionáveis me obrigam a deixar o
carro estacionado o dia todo num lugar próximo ao escritório, e tem que ser
na rua. Circunstâncias. O bairro é de bacana. Depois de algumas perguntas
descubro uma praça, onde a prefeita Marta ainda não meteu a Zona Azul que ela
aumentou em 50%. Mas a praça tem dono. Alguém me apresenta. O cara cobra 15
real por semana de quem estaciona. Trabalha com o irmão e mais dois sócios.
Negociamos, ele acaba deixando por 10 real, mas não é para eu contar a
ninguém. Senão desmoraliza. Negócio fechado, mas cadê a vaga, que eu não
vejo? Imediatamente ele empurra e separa dois carros estacionados, e ela
surge. Ali os carros têm que ficar assim: desengatados e livres do freio de
mão. Você passa e pensa que não tem lugar. Mas, para o freguês, ele aparece
em segundos nessa operação. Sabe há quanto tempo o cara é o dono da praça?
11 anos, descubro depois, informado por outras pessoas. Terminada a
conversa, ele me pede o cartão de visita que não tenho. E me estende o dele,
que tem o nome dos 3 sócios, o telefone celular de cada um e o nome do
negócio: ESTACIONAMENTO AUTÔNOMO. Eu sei que você está pensando o mesmo que
eu estou pensando. Mas tem circunstâncias que a gente não escolhe, caro
cara.
* * *
Minha penúltima namorada foi uma egípcia, terapeuta corporal. Bunda grande,
estilo árabe. Reprimida, estilo árabe. Carinhosa, estilo árabe. Fodosa,
estilo árabe. Mão fechada, estilo árabe. Mas abria a mão para mim, em
generosas massagens nas quais era especialista: tuiná, tuiuiú, reflexologia,
do-in, ayurvédica, relaxamento, punheta, drenagem linfática, shiatsu,
ventosa, reiki, vivencial, crânio-sacral, o escambau. Todas. [Não, seu
viado, prostática não. O quequi há, cara, tá me tirando? Sou espada, vai
encarar?]. Um dia me convidou para participar de uma sessão num grupo
terapêutico. Como ia ser na base de 4 mulheres pra cada homem, topei. O
terapeuta era viado. Todo mundo deitado no chão, o cara ligou o Kitaro,
apagou as luzes e mandou relaxar. Incenso rolando. Eu ressabiado, relaxando
mas não muito. O cara disse, rolem e relaxem, rolem e relaxem. Todo mundo
rolava no carpete, eu também. Mandou a gente bater as pernas numas
almofadas. Mais forte, Sergio, mais forte, dizia. Eu no chão, barriga pra
baixo, batendo as pernas. Comecei a me sentir ridículo nadando no seco. E
você sabe, jacaré no seco anda. Terminou a bateção de perna, veio o convite
para respirar fundo e soltar suspirando alto. A egípcia entrou no clima e
exagerou. Baixou o Tuta. Tutankamón berrando no escuro. E todo mundo imitou.
O berreiro foi assustador. Perdigotos voavam. Os cachorros da vizinhança
latiam. O viado aumentou a música. Catarse geral. Entrei debaixo de um
almofadão para escapar da saraivada de perdigotos. Não sei como, o terapeuta
enxergava no escuro e me intimou, Sergio, não pare, não pare. Achei que ele
ia ejacular pra cima de mim e fugi, me arrastando até a porta. Localizei meu
tênis pelo cheiro, na escuridão. Passei a mão na sacola de roupa que estava
ao lado e me mandei. Na rua, peguei um táxi ainda de camiseta e calção. No
dia seguinte, a egípcia ligou e inventei que estava com câncer. Falei que ia
me tratar na Rodésia. Nunca mais a vi. De múmia, já basta uma sogra que eu
tive. Mas essa é uma outra história. Você nem queira saber.
* * *
Jamais vou dizer o nome, mas estou trampando numa agência onde o dono dá
incertas na sala, pra vigiar o que as pessoas acessam na web. Até em email
aberto ele põe a cara! Tipo, "puxa, isso é um email? Como é longo!". Não
parece agência. A disciplina é de quartel. E tem Sua Excelência o Filho do
Dono, o chamado "capítulo à parte". A ética me impede de revelar detalhes. Pelo amor de Deus. Se você souber de uma agência de
propaganda precisando de redator experiente, com prêmios internacionais, me
avise. É sério, não estou brincando. Obrigado.
Para ir além
¢AtaRrO vE®De
Sergio Faria
São Paulo,
27/9/2001
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