Quando o cotidiano vira espetáculo | Pilar Fazito | Digestivo Cultural

busca | avançada
40629 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> LIVROS EM MOVIMENTO TERMINAIS PINHEIROS, PIRITUBA E CAMPO LIMPO PROMOVEM AÇÃO DE FOMENTO À LEITURA
>>> Circuito Arte e Cidade apresenta: Cidade Espetáculo - Aventura nos Três Poderes
>>> Cia Dança Sem Fronteiras no dia 08 de setembro em Jaraguá do Sul
>>> FÊNIX – onde nascem os sonhos com Clarin Cia. de Dança
>>> Leões, Vodka e um sapato 23
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
Colunistas
Últimos Posts
>>> Impromptus de Schubert por Alfred Brendel
>>> Karajan regendo a Pastoral de Beethoven
>>> Eric Schmidt, fora do Google, sobre A.I.
>>> A jovem Martha Argerich tocando o № 1 de Chopin
>>> Marilena Chauí lança sua Patrística (2024)
>>> Pondé sobre Olavo de Carvalho (2024)
>>> Milton Nascimento & esperanza spalding
>>> Gimme Shelter by U2, Mick Jagger & Fergie
>>> Cabo Wabo by Nerd Halen
>>> André Barcinski no Podcast do Thunder
Últimos Posts
>>> O jardim da maldade
>>> Cortando despesas
>>> O mais longo dos dias, 80 anos do Dia D
>>> Paes Loureiro, poesia é quando a linguagem sonha
>>> O Cachorro e a maleta
>>> A ESTAGIÁRIA
>>> A insanidade tem regras
>>> Uma coisa não é a outra
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Etapas da criação de uma pintura digital * VÍDEO *
>>> Cultura, gelo e limão
>>> Régis Bonvicino: voyeur-flânerie e estado crítico
>>> Propostas para o nosso milênio (I)
>>> Um Twitter só para escritores
>>> Viva a revolução
>>> Economia da Cultura
>>> Juan José Morosoli - a solidão, a pureza, a viagem
>>> Estevão Azevedo e os homens em seus limites
>>> Nós que aqui estamos pela ópera esperamos
Mais Recentes
>>> Nevada de Zane Grey pela Abrh (1972)
>>> Dois Exodos de Edouard Saab e Jacques Derogy pela Expressao e Cultura (1970)
>>> Dois Garotos Da Pesada de Manoel Caboclo pela Brasil (1986)
>>> Shakespeare’s Tragic Heroes de Lily B Campbell pela Better World Books (1986)
>>> Dois Para Conquistar de Marion Zimmer Bradley pela Circulo do Livro (1980)
>>> Tabu Do Corpo de Jose Carlos Rodrigues pela Achiame (1975)
>>> Dolores de Jacqueline Susann pela Circulo Do Livro
>>> Tantas Historias No Outro Lado Do Espelho de Edson Gabriel Garcia pela Ftd (1999)
>>> Tao Perto do Ceu de Teresa Noronha pela Brasiliense
>>> Salvador Dali Las Obras De Su Vida de Dosdearte Ediciones pela dosdearte ediciones (2015)
>>> Cancer O Poder Da Alimentacao Na Prevencao E Tratamento de Caroline Bergerot; Paulo Gustavo Bergerot pela Cultrix (2006)
>>> Febre de Robin Cook pela Circulo Do Livro (1984)
>>> Atlas De Anatomia Humana Sobotta Vol 2 de R Putz; R Pabst pela Guanabara Koogan (2000)
>>> Contra Natura Ensaios de Psicanalise E Antropologia Surreal de Oscar Cesarotto Org pela Iluminuras (1999)
>>> Contracorrente de Frederico Barbosa pela Iluminuras (2000)
>>> Lutero E A Igreja Do Pecado de Fernando Jorge pela Mercuryo (1992)
>>> Controle Externo Estudos Tematicos de Evandro Martins Guerra E Sebastiao Helvecio Ramos pela Forum (2012)
>>> Conhecendo Sao Paulo Dados Sobre a Cidade de Seminario da Caridade pela Edicoes Loyola (2002)
>>> Convergencia Lusiada revista do Real Gabinete Portugues De Leitura no de Real Gabinete Portugues De Leitura pela Revista Do Real Gabinete Portu (1995)
>>> Metodologia Do Ensino De Artes Comunicacao E Semiotica de Alberto Puppi pela Intersaberes (2012)
>>> Desigualdades E Justica Social Dinamica Estado Sociedade V I de Joanildo A Burity Cibele Maria L Rodrigues Marcond pela Fino Traco (2010)
>>> Cadernos Cedes Nro 47 Na Mira Da Violencia A Escola E Seus Agentes de Centro De Estudos Educacao E Sociedade pela cedes (1998)
>>> Esquimo de Olivier Douzou pela Hedra (2008)
>>> Cadernos Cedes Nro 43 Antropologia E Educacao Interfaces Do Ensino E D de Centro De Estudos Educacao E Sociedade pela cedes (1997)
>>> An Intoducion To Ancien Egyptian Literature de E A Wallis Budge pela Dover Publications (1997)
COLUNAS

Segunda-feira, 5/5/2008
Quando o cotidiano vira espetáculo
Pilar Fazito
+ de 4600 Acessos

ou "da novela e do circo de horrores"

Nem da Globo, nem da Record. A novela que tem atingido os mais altos pontos no Ibope, desde o início do mês passado, é da vida real: o caso Isabella. À moda dos anos 80, em que todos faziam apostas tentando desvendar "Quem matou Odete Roitman?", assistimos agora ao repeteco "Quem matou Isabella Nardoni (e como)?".

Isabella virou novela. Mais do que uma rima, isso é uma triste constatação. Em termos narrativos, o enredo da morte da menina é mais bem construído do que qualquer novela, folhetim, filme policial ou reality show que conste na programação dos canais de TV. Se não bastasse todo o suspense, o caso ainda conta com publicidade gratuita dos telejornais e uma providencial e impensada estratégia de marketing: poucos dias depois de Isabella morrer, sua mãe fez aniversário. Em seguida, seria o aniversário da própria vítima. E agora, o dia das mães! Um bombardeamento ininterrupto de datas que nos impede de esquecer a dor da mãe, a crueldade dos fatos e a alegria de uma criança que sequer conhecemos.

Não há como fugir disso. O assunto corre feito faísca em pavio de pólvora e já saiu da mídia e da internet para as rodas de bar. Todos comentam o caso, desde o promotor da vara da infância e juventude até o pipoqueiro da esquina. A gente senta para almoçar e o restaurante todo faz silêncio para ouvir uma hora de telejornal dedicado à menina que foi defenestrada em São Paulo. Uma morbidez sem igual? Nem tanto.

Pouco antes de Isabella virar manchete, a sociedade ficou escandalizada com a empresária que mantinha uma adolescente de 12 anos em cárcere privado com a conivência de toda a família. Mas o assunto esfriou assim que surgiu o caso Isabella.

Tempos depois, a notícia do austríaco que manteve a filha em cativeiro por 24 anos e teve seis filhos com ela, sob os olhos da esposa, surgiu como a mais nova notícia bizarra, atraindo o enxame de curiosos, justiceiros e revoltados solidários. Mas como o cenário dessa história não foi o Brasil, Isabella ainda terá que esperar o próximo espetáculo mórbido nacional para poder descansar em paz.

O circo da miséria humana funciona do mesmo modo como os términos de relacionamento: é preciso engatar um novo caso para se esquecer, de uma vez por todas, do anterior.

O caso de Isabella é triste. Assim como o de milhares de crianças que morrem diariamente seja por violência, fome ou negligência daqueles que deveriam zelar por elas. Mais triste ainda é ver o circo de horrores montado em torno disso tudo, transformando uma morte trágica num carnaval de luzes e cores.

Pessoas acampadas em frente à casa dos pais dos acusados ou diante da delegacia, com pedras nas mãos, cartazes, gritos e vaias; comerciantes que se aproveitam desse conglomerado medonho de linchadores de plantão e anunciam picolés, salgadinhos e churrasquinho de gato... Da Idade Média ― ou melhor, da idade da pedra ― aos dias de hoje, não mudamos nada. Há sempre os desocupados que se dedicam a cuidar da vida dos outros, como escape dos próprios problemas. O mundo pode dar quantas voltas quiser, a natureza humana é imutável.

Questionar o papel da mídia nessas horas me dá uma "preguiça monstra". Talvez por parecer óbvio demais que o Quarto Poder camufla o poder que tem de formar e, sobretudo, propagar opiniões. Do mesmo modo, não tenho boa vontade em ler textos ou dar corda às discussões sobre a perfídia dos meios de comunicação. É um qüiproquó todo em cima da culpa da mídia, como se o público não tivesse vontade própria e fosse incapaz de se levantar da poltrona e mudar de canal. Mídia má e público autômato, geralmente é assim que essas questões complexas são resumidas.

Seja a mídia ou o cidadão comum que se compadece da dor da mãe de Isabella, parece que é preciso um baque cada vez maior, mais ensurdecedor, uma situação bizarra ao extremo para chamar a atenção das pessoas e fazê-las se colocar no lugar dos outros. A sutileza tem perdido espaço em meio a tanto barulho. É drama demais. Tudo muito exagerado, contribuindo para a espetacularização de fatos banais e banalização de fatos relevantes.

O diretor Jean-Pierre Jeunet ainda recebe cartas e e-mails de pessoas do mundo todo que lhe agradecem pela filmagem d'O fabuloso destino de Amélie Poulain. Um filme que não tinha grandes pretensões e acabou sendo um sucesso de público, atraindo mais de 17 milhões de espectadores no globo. O que Amélie não tem a ver com Isabella?

A despeito da sutileza da personagem de Audrey Tautou, que faz com que as pessoas parem um instante e percebam a beleza das pequenas coisas do dia-a-dia, o filme de Jean-Pierre Jeunet é uma mensagem que desperta o otimismo. A gente sai do cinema mais leve, achando que o ser-humano pode ser bom.

O caso Isabella, o sensacionalismo que sobrevoa os cadernos policiais da imprensa do país e o circo armado por desocupados linchadores vorazes faz o contrário. A gente desliga o telejornal com aquele gosto amargo na boca de que "a humanidade é o câncer do planeta", como já disse o grande cartunista argentino Quino. O jornal impresso estraga o domingo e as conversas nos bares fazem a gente ter receio até dos amigos. Ninguém põe a mão no fogo pelo outro e é melhor puxar o tapete alheio antes que puxem o nosso.

Um pessimista poderia dizer que Amélie é ficção e, portanto, a bondade humana também o seria. Sou obrigada a discordar. A ficção se utiliza do material presente na realidade. Bondade e maldade fazem parte da natureza humana e estão presentes ao mesmo tempo em todas as pessoas. E ainda que Amélie seja ficção, foi capaz de despertar sentimentos bem reais em seu público.

Os programas de TV sempre omitem a duplicidade dos sentimentos individuais ― mesmo que tragam o contrário no título, como é o caso da novela Duas Caras. Na TV, o vilão é sempre vilão, o ladrão é sempre ladrão, a mocinha é sempre mocinha e por aí vai, seja nas novelas ou nos telejornais.

No cinema, é diferente. Quem escreve para cinema sabe que é preciso construir uma curva dramática para cada personagem. Se o personagem termina a história do mesmo modo como a começou, não há razão para ele existir e muito menos para se gastar milhões com um filme. No cinema, há espaço para que um mocinho se transforme em um vilão capaz de comover a platéia com suas fraquezas. É isso o que o torna humano. O cinema é uma fábrica de sonhos que se aproxima mais da realidade do que o simulacro platônico televisivo, em que personalidades são manipuladas como títeres numa caixa fechada, perfeita e ilusória, exemplo máximo da atualidade do mito da caverna.

O cinema ensina que é necessário haver conflitos internos para que os personagens se tornem humanos. Uma verdade que parece óbvia, mas da qual nos esquecemos toda vez que nos antecipamos em julgar aqueles que aparecem na TV.

Quanto aos acusados da novela Isabella, culpados ou não, cabe à Justiça se encarregar de seu futuro. E cabe à população retomar seus afazeres, cuidar da própria vida e tentar propagar ações realmente altruístas. Talvez assim consigamos reverter essa onda de sentimentos nefastos em contagiante otimismo e esperança, à moda dos reais sentimentos despertos pela ficção de Amélie Poulain.


Pilar Fazito
Belo Horizonte, 5/5/2008

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Confissões pandêmicas de Julio Daio Borges
02. O tigre de papel que ruge de Celso A. Uequed Pitol
03. Bruta manutenção urbana de Elisa Andrade Buzzo
04. Leitura, curadoria e imbecilização de Ana Elisa Ribeiro
05. A vingança dos certinhos de Marta Barcellos


Mais Pilar Fazito
Mais Acessadas de Pilar Fazito em 2008
01. Como esquecer um grande amor - 28/7/2008
02. Então, você quer escrever um livro... - 7/1/2008
03. Desligando o Cartoon Network - 11/2/2008
04. A verdade que as mulheres contam - 17/3/2008
05. Os pontos de um crochê - 17/11/2008


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Livro Ilustrado de Figurinhas- Duas Rodas- Hot Moto- Panini
Panini
Panini
(2005)



Livro Psicologia Unlearned Language New Studies in Xenoglossy
Ian Stevenson
University Press of Virginia
(1984)



Livro Um Romance Russo
Emmanuel Carrère
Alfaguara, Objetiva
(2008)



Livro de Bolso Literatura Estrangeira Mistérios Perdidos
Sir Arthur Conan Doyle
Tag
(2020)



Sinais Do Destino
Rebecca Brandewyne
Best Seller
(2003)



Coleção Oficial De Graphic Novels: Wolverine - O Velho Logan
Mark Millar
Salvat
(2014)



Principais Temas Em Clinica Medica Volume 1
Jose Paulo Ladeira
Medcel
(2007)



O Homem-máquina - a Ciência Manipula o Corpo
Adauto Novaes, Renato Janine e Vários Outros
Companhia das Letras
(2003)



Götter Und Dämonen Mythen de Völker
Rudolf Jockel
Holle
(1953)



Ligue o Foda-se e Seja Feliz - Diário do Zé CD
Fábio Lemos - Évelin Santos
do Autor
(2010)





busca | avançada
40629 visitas/dia
1,9 milhão/mês