Não sei quando foi que aprendi, nem como, mas alguém deve ter me ensinado a folhear um livro. Em geral, essas coisas são aprendidas de duas maneiras: pela experiência direta ou pela experiência mediada. Em outras palavras: ou a gente pega e fuça; ou alguém mostra para a gente como é que faz.
Há mediadores mais pacientes, daqueles que são amigáveis, que pegam na mão, que dão orientações precisas, que esperam que a gente aprenda no nosso ritmo e até os que dão bombom no final, para recompensar. Há mediadores mais ansiosos, que xingam, que enunciam frases rudes, mas que deixam a gente aprender mais ou menos em paz. Há mediadores que perdem a paciência e começam a fazer por nós, correndo na frente para despachar logo o "aluno" impertinente. Nesse caso, é comum que a gente não aprenda nada. Isso exige o esforço de pedir um repeteco, de ficar sofregamente observando, por cima das mãos e dos ombros do "professor", para ver bem o que ele está fazendo ou mesmo de, discretamente, pedir ajuda a outra pessoa. Há ainda a possibilidade de que esse último instrutor (sem discussões filosóficas sobre esses termos, ok? Aqui, não!) faça tudo lentamente, e a gente acaba aprendendo tudo. Acho que foi assim que aprendi a operar videocassetes e videogames (lembrando que sou da geração Atari, cujo joystick só tinha um pauzinho e um botão vermelho). Há, ainda, o mediador que xinga todas as nossas gerações passadas, chama a gente de burro e outros bichos, além de nos deixar deprimidos. Isso acontece.
Dada a relativa oferta do artefato nos meus arredores, provavelmente aprendi a operar livros por experiência direta. Peguei, descobri que tinha "cabeça pra cima" e "cabeça pra baixo" (depois que aprendi que as letras do alfabeto têm isso), percebi que o negócio era pra ser aberto com movimento para a esquerda, vi folhas empilhadinhas, presas por um lado, vi números de página etc. Há um vídeo no YouTube bem legal sobre isso (uma brincadeira, mas com um fundão danado de verdade) e alguns autores importantes trabalham nessa linha, como o badalado historiador francês Roger Chartier.
Ninguém aprende por aprender, apenas aprendemos a ler um livro na certeza de descobrirmos a leitura... A partir do momento em que já dominamos o código da leitura e da escrita. E passamos exercer este domínio pra descobrir um novo mundo, que é o dos livros...