A suprema nostalgia | Marta Barcellos | Digestivo Cultural

busca | avançada
89046 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Hospital Geral do Grajaú recebe orquestra em iniciativa da Associação Paulista de Medicina
>>> Beto Marden estreia solo de teatro musical inspirado em Renato Russo
>>> Tendal da Lapa recebe show de lançamento de 'Tanto', de Laylah Arruda
>>> Pimp My Carroça realiza bazar de economia circular e mudança de Galpão
>>> Circuito Contemporâneo de Juliana Mônaco
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
Colunistas
Últimos Posts
>>> Lisboa, Mendes e Pessôa (2024)
>>> Michael Sandel sobre a vitória de Trump (2024)
>>> All-In sobre a vitória de Trump (2024)
>>> Henrique Meirelles conta sua história (2024)
>>> Mustafa Suleyman e Reid Hoffman sobre A.I. (2024)
>>> Masayoshi Son sobre inteligência artificial
>>> David Vélez, do Nubank (2024)
>>> Jordi Savall e a Sétima de Beethoven
>>> Alfredo Soares, do G4
>>> Horowitz na Casa Branca (1978)
Últimos Posts
>>> Escritor resgata a história da Cultura Popular
>>> Arte Urbana ganha guia prático na Amazon
>>> E-books para driblar a ansiedade e a solidão
>>> Livro mostra o poder e a beleza do Sagrado
>>> Conheça os mistérios que envolvem a arte tumular
>>> Ideias em Ação: guia impulsiona potencial criativo
>>> Arteterapia: livro inédito inspira autocuidado
>>> Conheça as principais teorias sociológicas
>>> "Fanzine: A Voz do Underground" chega na Amazon
>>> E-books trazem uso das IAs no teatro e na educação
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Laymert politizando novas tecnologias
>>> Quem sabe eu ainda sou uma garotinha
>>> Gabeira sobre os protestos
>>> A Symphonia da Metropole
>>> Bar ruim é lindo, bicho
>>> A crise dos 28
>>> Animismo
>>> Expectativas e apostas na Copa de 2010
>>> Paixão e sucata
>>> A pulsão Oblómov
Mais Recentes
>>> Germinal (capa dura) de Émile Zola pela Abril (1979)
>>> Rezas e Oferendas Poderosas de Dinan Dhom Pimentel pela Ideia Jurídica (2014)
>>> Quem Me Educa? de Dante Donatelli pela Arx (2004)
>>> Gabriela, Cravo E Canela de Jorge Amado pela Companhia das Letras (2017)
>>> Memórias Da Emília de Monteiro Lobato pela Lafonte- (2019)
>>> O Livro Do Amor - Vol. 1 de Regina Navarro Lins pela Best Seller (2012)
>>> Um Garoto Consumista Na Roça de Julio Emilio Braz pela Scipione (paradidaticos) (2021)
>>> Educação Básica Politica e Gestão da Escola de Sofia Lerche Vieira pela Liber Livro (2009)
>>> O Que Frida Faria? de Arianna Davis pela Principium (2021)
>>> As Aventuras De Benjamim. O Muiraquitã de Camila Franco, Marcela Catunda, Blandina Franco pela Companhia Das Letrinhas (2011)
>>> As cores da escravidão de Ieda De Oliveira pela Ftd (2013)
>>> Pântano De Sangue de Pedro Bandeira pela Moderna (2006)
>>> Pântano De Sangue de Pedro Bandeira pela Moderna (2006)
>>> Os Colegas de Lygia Bojunga pela Casa Lygia Bojunga (2008)
>>> Diga Não À Violência! de Fernando Carraro pela Ftd (2017)
>>> Paris E Uma Festa de Ernest Hemingway pela Bertrand (2013)
>>> O Segredo Do Violinista de Eva Furnari pela Moderna (2010)
>>> Homossexualidade, Reencarnação e Vida Mental de Walter Barcelos pela Boa Nova (2020)
>>> As Nove Mulheres De Ravensbruck de Gwen Strauss pela Nova Fronteira (2022)
>>> Mecanismos da Mediunidade de Francisco Cândido Xavier pela FEB Editora (2010)
>>> Marketing Educacional Em Ação de Sonia Simoes Colombo pela Penso - Grupo A (2005)
>>> O Poder Dos Quietos de Susan Cain pela Agir (2012)
>>> Poder No Pensamento Social, O: Dissonancias de Fernado Nobre pela Ufmg (2008)
>>> Sexo No Cativeiro. Como Manter A Paixao Nos Relacionamentos de Esther Perel pela Objetiva (2018)
>>> A Democracia Grega de Martin Cezar Feijó pela Ática
COLUNAS

Sexta-feira, 15/10/2010
A suprema nostalgia
Marta Barcellos
+ de 5800 Acessos
+ 2 Comentário(s)

Não se faz mais nostalgia como antigamente. A formidável frase do jornalista Geraldo Mayrink, resgatada em seu obituário no ano passado, me ocorre ao observar a reação dos espectadores ao filme A suprema felicidade, de Arnaldo Jabor, exibido no Festival do Rio. "Que saudade dos anos 50!", dizem os que sequer tinham nascido naquela década. Em um esforço para entrar no clima, tento encontrar em mim algum resquício da tal nostalgia que todos os meus amigos com mais de 30 anos parecem cultivar com algum orgulho. Mayrink vem ao meu auxílio, e me recordo com saudade dos tempos em que o jornalismo diário preocupava-se com o esmero de seus textos.

Quando cheguei ao jornalismo, além de profissionais admirados pela escrita caprichada, as redações tinham uma boa cota de nostálgicos a suspirar pelo fim das máquinas de escrever, das laudas coladas, do ambiente barulhento e enfumaçado. Como "foca", quase me envergonhava de ter começado a carreira em uma das primeiras redações informatizadas. Intimidava-me com o passado respeitável, mas percebia a confusão: os mais velhos tinham saudade da própria juventude, não dos empregos que certamente depreciavam antes de estarem afastados o suficiente para que suscitassem tanta nostalgia.

Assim como hoje evito criticar quem trata cachorro como filho (vai que na velhice preciso recorrer a tal afeto), esperei que o tempo me trouxesse a inevitável saudade das virtudes e dos valores de outrora. Comecei a desconfiar que a nostalgia não era regra quando a internet proporcionou os primeiros encontros de exs-algum-grupo-do-passado. Não conseguia me identificar. Havia os nostálgicos do colégio, que reencontravam a felicidade perdida e os apelidos de infância entre rodadas de chope, e também os nostálgicos da faculdade, ciosos do vínculo que os manteriam próximos para sempre da deliciosa irresponsabilidade juvenil. Depois da curiosidade inicial, e da constatação da pouca importância desse passado para mim, eu me desinteressava, percebia aquele ritual de recordações como um tanto excessivo.

Em conversas com amigos do presente, descobri outras pessoas que desconfiam da memória seletiva dos saudosistas e dessa constante celebração dos valores antigos, em geral desdenhando as conquistas do presente. A mania é especialmente estranha quando se trata de jornalistas que, por estarem superconectados com a atualidade, deveriam experimentar o estado de excitação diante de tanta novidade, da iminência de novas possibilidades, o mundo tão pequeno e próximo, tudo acessível por um clique.

Tanto assunto, e o meu cronista preferido só fica feliz discorrendo sobre o passado; o presente sempre tratado com azedume e rabugice. Viro a página do jornal, em busca de algum frescor verdadeiro, quem sabe um novo colunista, alguém que ainda perambule pelas ruas com curiosidade, e talvez escreva na internet.

Se o cronista ― talvez estimulado por seu talento para a ficção, mais utilizável no tempo pretérito ― perde-se com frequência em reminiscências, recorro ao ensaísta para organizar o meu pensamento. Roberto Pompeu de Toledo, escavando o conceito de felicidade, critica os pais que impõem esta pesada meta aos filhos e apresenta uma resposta à ardilosa pergunta: "Você é feliz?". Segundo ele, uma solução consequente para a questão exige que coloquemos na balança a experiência passada, o estado presente e a expectativa futura. A conclusão pode não ser clara, ressalta, mas eu concluo que a balança a favor do passado pode identificar nostálgicos em potencial.

Uma infância feliz, disse certa vez a psiquiatra Nise da Silveira, pode ser quase tudo na vida de uma pessoa, e quem sou eu para pregar as vantagens do sofrimento nas idades mais tenras. De qualquer forma, a tal balança mostra a armadilha de se instalar a felicidade em um tempo acessível apenas pela nostalgia, no caso das pessoas que tiveram uma infância e uma adolescência extremamente satisfatórias, repletas de momentos alegres que ficaram marcados na memória. Por sinal, Pompeu de Toledo começa seu ensaio com uma distinção providencial: "Felicidade é uma palavra pesada. Alegria é leve, mas felicidade é pesada."

O peso de ter a própria felicidade ― e não apenas as alegrias boas de relembrar ― irremediavelmente associada ao passado pode fazer a nostalgia transformar-se em uma doença. Não estou aqui exagerando, nem sugerindo que Arnaldo Jabor e os espectadores lamuriosos de seu filme devam procurar tratamento. Refiro-me à origem da própria palavra e de sua primeira utilização. Composto a partir dos radicais gregos "nóstos" (que significa regresso) e "álgos" (dor física ou moral), o termo nostalgia foi usado em 1678 para designar uma enfermidade a que os suíços seriam predispostos quando estavam ausentes do lar. Segundo a dissertação do médico suíço Johannes Hofer, a doença podia ter caráter mortal.

A melancolia capaz de matar tornou-se depois tema de muitos estudos médicos na Europa, que identificaram a doença em exércitos que se afastavam de seus países de origem. Mais tarde, seria aplicada também para explicar o "banzo", que levava os negros africanos escravizados, transportados para terras distantes, a um estado de nostalgia profunda que induzia à apatia, à inanição e, por vezes, à loucura ou à morte. Nos dias atuais, em que sentimentos são facilmente diagnosticados como patologias, não deve ser difícil associar a nostalgia à depressão.

Por tudo isso, recomendo aos amigos doses moderadas de nostalgia, inclusive na arte. Para mim, em pequenas porções ela pode ser especialmente saborosa, mais pela liberdade de ficcionar o passado do que pela tentação de desvalorizar o presente. Feita a advertência, vá ao cinema, ao teatro e aos livros, e descubra em que tempo (no futuro?) mora a sua suprema felicidade.

Nota do Editor
Marta Barcellos mantém o blog Espuminha.


Marta Barcellos
Rio de Janeiro, 15/10/2010

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Cursiva de Guilherme Pontes Coelho
02. Casa cor-de-rosa de Elisa Andrade Buzzo


Mais Marta Barcellos
Mais Acessadas de Marta Barcellos em 2010
01. Palmada dói - 6/8/2010
02. Com ventilador, mas sem educação - 12/3/2010
03. A suprema nostalgia - 15/10/2010
04. Pelas mãos habilidosas dos grandes escritores - 17/9/2010
05. O futuro do ritual do cinema - 9/4/2010


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
18/10/2010
02h31min
Se não plantarmos atitudes, se não ilustrarmos a nossa vida de acontecimentos, de poesias, com certeza nossa memória amanhã será de um vazio contemporâneo ilustríssimo. E não estaremos reclamando da nostalgia. Mas do vento que plantamos, esperando as tempestades.
[Leia outros Comentários de Manoel Messias Perei]
18/10/2010
12h32min
A nostalgia é um sub-produto da experiência de vida de cada um. As travessuras infantis transmutam-se em transgressões e imprudências até que, aos 40, começamos a pensar no que não mais faremos ou veremos. É tão bom lembrar das goiabeiras no quintal, onde se subia sem medo. Não mais existem quintais ou goiabeiras. E quem é que aos 68 anos, escalaria goiabeiras em busca de frutas? Saudade é memória recente de coisas que talvez ainda possam ser repetidas. Nostalgia, não. Não veremos, sentiremos ou faremos mais o que virou nostalgia: tomar bonde andando quando se tem 13 anos: nem bonde existe mais; ir ao baile com música de conjunto e dançar "coxa a coxa"; comer uma feijoada de combuca no Papai da Aurora à meia-noite.; fazer um terno sob medida, um sapato no Motta e sair com a namorada. E os amigos? Alguns morreram, outros sumiram. Restou a nostalgia, a mumificação da saudade.
[Leia outros Comentários de Raul Almeida]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Fora de Órbita
Woody Allen
Agir
(2007)



Cooperativas de Trabalho - Manual de Organização
Vergílio Perius / org.
Unisinos
(1997)



E Se For Você 588
Rebecca Donovan
Globo Alt
(2016)



Jesus, Filho de Deus
J. Sobrinho
Vozes
(1982)



Livro História do Brasil O Dia Em Que Getúlio Matou Allende e Outras Novelas do Poder
Flávio Tavares
Record
(2004)



Em defesa dos trabalhadores e do povo Brasileiro 406
Em defesa dos trabalhadores e do povo Brasileiro
Anita Garibaldi
(2000)



Livro Infantil O Poço do Visconde Edição Comentada
Monteiro Lobato
Globinho
(2010)



Livro Princess Collection A Treasury Of Tales
Disney
Disney Press
(2006)



12 Grandes médiuns brasileiros 446
Daniela Hirsch
Harper Collins
(2016)



Soja nutrição e saúde com receitas práticas e saborosas
Conceição Trucom
Alaúde
(2005)





busca | avançada
89046 visitas/dia
1,9 milhão/mês