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Quinta-feira, 20/9/2012
Desejo estéril
Vicente Escudero
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Nova Iorque, a capital mundial da vida noturna. Isso significa alguma coisa? O que se entende por vida noturna? Uma soma de entretenimento com as horas vividas fora do trabalho? Considerando que a concepção de entretenimento é tão extensa quanto a de prazer, a vida noturna de Nova Iorque pode ser reduzida ao entretenimento adulto, o único lugar do mundo onde os prazeres de todos os sentidos podem ser satisfeitos com a quantidade certa de dinheiro. A capital cosmopolita original, o destino da peregrinação de sonhos e abrigo de pesadelos possui uma vida noturna que não exige apenas o cartão de crédito. Ela também cobra um preço da personalidade. Tornar-se o objeto do desejo exige a renúncia a certos valores particulares. Uma quantia que está fora dos limites financeiros. A melhor definição dessa equação entre cidade e obsessão é musical, cantada em cool jazz por Carey Mulligan, em Shame: Se eu alcançar o sucesso lá / alcançarei em qualquer lugar / Só depende de você / New York / New York.

E são as horas fora do trabalho que definem o protagonista de Shame, Brandon, interpretado pelo mesmo Magneto de X-Men: Primeira Classe. A dupla formada pelo diretor Steve McQueen e o ator irlandês Michael Fassbender trabalhou antes em Hunger, outro estudo de personagem extraído das ideias mais perversas sobre a tortura do ser humano presentes na Divina Comédia de Dante Alighieri. Brandon é bonito, tem um ótimo emprego, Brandon tem um apartamento em Manhattan. Brandon coleciona pornografia e busca o sexo com a mesma disciplina de um cão farejador procurando drogas. E alcança a mesma eficácia canina com uma disposição tão primitiva quanto animal. Em certo momento do filme, Brandon insinua a uma de suas várias conquistas que uma cicatriz em sua nuca é na verdade uma estrutura vestigial dos neandertais. Quase um ato falho. Na verdade, a estrutura vestigial é interna; é o funcionamento predatório de seu apetite sexual, intenso o suficiente para diminuir qualquer outro interesse em sua vida, seu verdadeiro elo ancestral.

Nova Iorque à noite. O título do filme surge sobre a cama de Brandon no momento em que a cortina de seu quarto é aberta, iluminando o espaço onde ele consome sua droga e é consumido. A vergonha do hábito só existe quando exibido à luz do dia. Depois, a escuridão. Seja nos corredores do escritório onde trabalha ou nas andanças pela cidade, Nova Iorque está sempre às escuras, escondendo as sombras com a mesma eficiência que Brandon esconde seus hábitos das pessoas mais próximas. Um cativeiro meticuloso. Dentro de seu apartamento, quase uma reprodução de um quarto de hospital decorado com todos os tons de cinza existentes, Brandon recebe prostitutas, consome pornografia pela internet e se masturba no restante do tempo. Parece não ter escolha. Discute-se a possibilidade do vício sexual ser uma doença. Independente da resposta, seja qual for o diagnóstico, o sexo é toda a vida de Brandon.

O diretor não apresenta explicações sobre as histórias dos personagens. Steve McQueen iniciou sua carreira nas artes visuais, talvez o motivo mais plausível para a economia dessas informações na trama. Sabe-se o essencial: a vida de Brandon é o sexo e um pequeno tremor inesperado, seguido por um terremoto, parecem ser o início de sua derrocada e de sua salvação. Primeiro, seu computador é retirado do escritório para manutenção, revelando todo o histórico de sua perversão à assistência técnica da empresa. Em seguida, a irmã de Brandon, Sissy, interpretada por Carey Mulligan, aparece e se hospeda em seu apartamento, sem previsão de partida.

Sissy torna-se o carcereiro emocional de Brandon. Sem a liberdade da vida solitária, limitado pela personalidade carinhosa e estabanada da irmã, o cotidiano de Brandon se divide numa luta entre dois valores antagônicos. De um lado, há o esforço para manter o vício dentro de sua vida particular, controlado na incubadora do laboratório de sua solidão, a Manhattan dos prédios e fachadas gêmeas cortadas por ruas e avenidas, veias e artérias que conduzem seu vício a outros corpos. De outro, a companhia e ingenuidade da irmã trabalham como anticorpos contra a doença que o impede de encontrar prazer além do sexo. Uma batalha psicológica entre forças equivalentes, quase decidida pela fragilidade física de Sissy.

Nos momentos mais intensos deste combate entre o sofrimento da obrigação sexual e a necessidade de criar laços com outras pessoas, o auge da sociabilidade, do sentimento gregário de Brandon, é derramado em lágrimas numa epifania, durante a apresentação de Sissy cantando New York, New York em cool jazz para a pequena plateia de um bar no topo de um dos arranha-céus da cidade. O compasso lento da composição parece ser a única força capaz de frear o desejo sexual de Brandon, de permitir seu contato com a parte reprimida de sua personalidade. A apresentação de Sissy, filmada numa única tomada, assim como a corrida noturna de Brandon pela cidade, são contrapontos estéticos que servem para aumentar o contraste de sua luta psicológica. Sissy apresenta-se com a intensidade do reconhecimento familiar -dos laços de sangue- e da pureza da ingenuidade; com seu batom vermelho e vestido dourado transforma-se numa divindade. A corrida de Brandon por Nova Iorque é filmada durante a madrugada, quando os prédios e ruas não estão mais tomados pelo movimento constante e tudo parece uma única muralha de concreto, tão indistinta quanto as mulheres e homens da vida de Brandon. É a representação de sua indiferença.

Além da precisão e seriedade estética ligando as personalidades dos personagens aos ambientes, outro ponto alto do filme é a trilha sonora. Os momentos mais dramáticos são construídos sobre o imaginário da discoteca pop dos anos 80, algum jazz dos anos 60 e 70, com Chet Baker e John Coltrane e o piano de Glenn Gould, com um prelúdio e trechos das Variações Goldberg. Brandon, assistindo pornografia on-line ao som dos sussurros fantasmagóricos de Glenn Gould ao piano parece estar entrando em contato com os seres que habitam a própria alma.

O filme é um estudo sério do que seria a vida de um viciado em sexo. Deixando de lado a discussão sobre sua classificação como uma doença, o trabalho de Steve McQueen e Fassbender representa com fidelidade uma vida que se dedica apenas a alcançar o êxtase e mais nada. As mutações da fisionomia de Brandon em todas as cenas eróticas, enquanto se dedica ao vício, dão uma dimensão humana aterrorizante de seu sofrimento em busca de uma saciedade inalcançável. No início, Brandon flerta com uma mulher casada, no metrô. Ensaia-se a reciprocidade. Momentos depois, ela foge. No final, Brandon reencontra a mesma mulher, novamente no metrô. Desta vez, a agressividade sensual de Brandon é substituída pelas insinuações ferozes da passageira. Brandon parece relutante. Sua angústia é um sinal de que o controle do vício talvez não signifique uma mudança de sua personalidade. Brandon parece ter se reencontrado consigo e descoberto que seus laços com outras pessoas, mesmo curado o vício, ainda continuarão frágeis.


Vicente Escudero
Campinas, 20/9/2012

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