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COLUNAS
Quinta-feira,
12/9/2013
Os ventos finais do inverno
Elisa Andrade Buzzo
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ilustra: Renato Lima
Ele entra pela fresta aberta na janela do ônibus, e é como se passasse um recado milenar com sabedoria oriental: Tudo passa. Nem sopro gelado, nem baforada quente, brisa constante, uma parte dos ventos finais de inverno, esta categoria que se estende a tudo que lentamente se desanuvia das nossas cabeças. Vento com um gostinho amargo de liberdade, de pequena treva que aguarda claridade exuberante, do qual ainda se desconhece o desfecho.
E o dia se estende lento no passar dos autos, no andar de gentes, em sua levitude de meio de tarde. É fácil transitar pela cidade neste momento de resfolegar, de dissipar o velho para encontrar um novo sopro. Parece haver uma camada de bondade em cada movimento que o motorista imprime ao volante, em cada marcha trocada. Quando o farol em frente ao Masp abre, e agora ele é um retrato em miniatura do museu, nada mais natural é esta alternância, do permitido ao proibido, da espera ao momento de simplesmente ir. Direitos e deveres naturais se dispendem no ar da derradeira estação.
Parece haver uma camada de falso determinismo em cada passo. Uma coisa é fato: Esta estação vai passar. Está passando, e com ela se vai um gesto obsceno, e com ela se vai um gesto de carinho ou desespero. Será para o melhor, para o que se encaminha a ser. Por isso, não se desanima tanto, mas há uma camada de tristeza, um olhar entediante e baço para o que passa sem maiores explicações. Que assim seja. O que é excelso não necessita de grandes explicações, antes gestos, que, como o inverno, vão adquirindo uma intensidade dolorida, uma tonalidade forte a ponto de ser necessário o seu desvanecimento.
Um menino fantasiado de super-homem, um entregador de flores. Os restaurantes fumegando, a 15 de Novembro tomada por pedestres na hora do almoço. As coisas continuam existindo, como sempre e antes. Andamos assim, pela cidade: Sem medo. Pelo Triângulo exala descompassadamente uma alegria destemida, a polícia vela tranquila as ruas, donde escoa em suor lento o meio da tarde. Até que venha algo a quebrar a monotonia benquista dos dias de ventos finais de inverno.
É com um sentimento domado que persigo um nada. Equilibrada em mim mesma nestes últimos dias, percorro uma cidade que se mostra boa, habitável. Ela tem a afabilidade de me aceitar sem que eu lhe dê maiores explicações de meus intentos lentos. Que tipo de realidade modesta e desfeita de contradições é esta que me aparece com o beneplácito da própria cidade? Se com este vento se dissipasse a letargia que o frio incutiu à ela, e então fosse colocada à prova as suas verdades mais entranhadas...
Elisa Andrade Buzzo
São Paulo,
12/9/2013
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