COLUNAS
Segunda-feira,
23/9/2013
Só por uma noite
Carina Destempero
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O problema não é ele, eu é que tô morrendo de medo.
Medo de quê?
De sofrer. De me envolver de novo, me apaixonar, perder meses ou anos da minha vida em uma relação que não vai dar em nada.
E aonde a relação tem que dar pra que você não a sinta como perda de tempo?
Ah, não sei. Lembrei agora que outro dia ele me disse, Não saber o dia de amanhã não é motivo pra não viver a noite de hoje. Acho que ele pensou que isso iria me convencer, mas aí é que não quis mais sair mesmo. No começo todo cara diz que ama, que é pra sempre, que não vai te trocar por outra mais gostosa daqui a dois meses, mesmo que seja mentira, e se nem agora ele consegue dizer isso, imagina depois.
Então o problema é que ele não te dá uma garantia falsa de eternidade?
Ia dizer que você entende tudo errado, mas acho que é isso mesmo. O meu coração ainda tá todo arranhado, eu estava bem curtindo a minha solidão, lambendo as feridas, quietinha, aí me surge esse cara que tem tudo a ver comigo, que me quer, e só o que eu consigo pensar é se ele ainda vai me querer daqui a dois anos. E eu sei que não tem como saber, não temos garantia, blá blá blá, mas eu preciso que ele me diga alguma coisa pra me dar coragem, mesmo que seja uma ilusão.
Mas ele te disse, e algo muito mais real. Ele disse que quer você, hoje, e que não saber o futuro não é motivo pra não viver o presente. Talvez o problema seja que o que ele disse não vai permitir que você o culpe depois, que você diga que ele mentiu, te iludiu, disse que te amaria pra sempre e te abandonou. O que ele disse joga a bola pro teu campo. Não há garantias, a decisão é só sua.
Sei que eu pareço uma criança mimada, mas eu já decidi demais. Dessa vez não quero decidir, quero que ele decida.
Ele já decidiu, e já te disse isso. Mas ele só pode decidir por ele, só pode arriscar o próprio coração. O seu, cabe a você.
......
Encerrei a sessão e ela saiu da sala em silêncio, com a cara tão fechada quanto o coração parecia estar. Já em casa, à noite, fui reler o texto de Freud no qual ele diz que "Uma flor que dura apenas uma noite nem por isso nos parece menos bela", e fiquei pensando em como tudo seria mais fácil se bastasse que alguém nos dissesse algo, ou que lêssemos em um livro, e logo em seguida aquilo passasse a valer na nossa vida, também. E aí percebi que essa é uma ilusão tão grande quanto achar que é possível saber o amanhã hoje. Decidi fechar o livro e aceitar, de novo, viver sem saber - mesmo que só por uma noite.
Nota do Editor
Texto gentilmente cedido pela autora. Originalmente publicado no blog Confraria dos Trouxas.
Carina Destempero
Rio de Janeiro,
23/9/2013
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