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Segunda-feira,
14/10/2013
Canção de som e fúria
Carina Destempero
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"A vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, que nada significa."
William Shakespeare Sempre buscamos uma fórmula qualquer para viver, para fazer tudo certo, de modo que sejamos lembrados quando não mais estivermos aqui. Conformamo-nos até certo ponto com a finitude do corpo, mas não podemos nem pensar em ser esquecidos. Queremos deixar um legado, ser lembrados e, de preferência, reverenciados também. Exaltamos nossos feitos, escondemos os defeitos, manipulamos, escrevemos, apagamos. Alguns dizem que a vida não é literatura, outros que a própria vida daria um livro, e há quem se preocupe mais em escrever uma história do que em vivê-la. Porque viver dá trabalho. Temos que fazer escolhas, assimilar perdas, submetermo-nos ao fato de que há coisas que odiamos e não podemos mudar. E que há coisas que mudam sem nosso consentimento, também.
Acabo de viver algo assim. Pensei em escrever esse texto para falar de um pensamento que já é meu velho conhecido, a oposição entre viver e pensar, mas, ao reler agora a frase de Shakespeare algo novo surge, e uma palavra me toma toda a atenção: "contada". A vida é uma história contada. Tudo que é contado é, também, vivido. Porque o ato de contar implica necessariamente na existência de um outro, alguém que escute, leia, tome parte daquela história e, ao fazê-lo, dê vida a ela. O contar acabou me trazendo também a dimensão da escrita. Escrever é pensar ou viver? Acho que pode ser os dois.
Se você escreve para ser lido, para contar uma história, compartilhar seus pensamentos com o mundo, eu diria que se a escrita se aproxima mais do viver. Mas se é algo isolado, se nada do que você escreve é mostrado ao outro, se é um "prazer solitário" sem consequência alguma, aí seria pensamento. Paralisia. Neurose. Consequência é outra palavra importante nesse assunto. É a consequência, o efeito, que nos mostra que estamos vivos. Só quando algo é compartilhado, quando proporciona interação, novidades. Quer algo mais vivo do que mudar de ideia a partir da opinião de outra pessoa? Ou ainda, ao ouvir alguém repetindo a mesma palavra que você acredita já conhecer tão bem, de repente lhe ocorrer um novo sentido para ela? Por isso contar é viver.
Certa vez escrevi que só no ouvido do outro minhas palavras ganham voz. Talvez seja ainda mais que isso: é só na presença do outro que minhas palavras ganham vida.
Carina Destempero
Rio de Janeiro,
14/10/2013
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