COLUNAS
Terça-feira,
20/10/2015
Viagem através da estepe
Celso A. Uequed Pitol
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Quando Tchékhov publicou a novela "A Estepe", sua então incipiente obra consistia apenas em alguns contos curtos publicados em revistas literárias, elaborados nos intervalos do exercício de sua profissão, a medicina. Era, portanto, a sua primeira narrativa mais longa. E ele não a poupou daquela mirada irônica tão característica sua, que fizeram-lhe a fama como contista de primeira ordem: "minha 'Estepe' não parece uma novela, mas uma enciclopédia da estepe", disse ele em carta a um amigo.
O tom era levemente jocoso, mas o julgamento do autor tinha sua razão de ser: nas 144 páginas desta recém-publicada edição brasileira de "A Estepe" traduzida por Rubens Figueiredo destaca-se o espaço em que a história se passa, a estepe russa, a vastíssima planície da Eurásia que sempre provocou nos povos que a habitam aquela sensação de horizonte infinito e de tempo dilatado que convida a caminhar sem rumo. E os artistas russos - escritores, pintores, cineastas - sempre souberam responder a esse convite, transformando-a em matéria para a criação.
Neste ambiente dá-se a viagem do garoto Iegorutchka de sua terranatal até a escola particular, situada numa cidade longínqua. Está acompanhado de seu tio e de um padre, que passam o tempo inteiro discutindo sobre os mais variados temas, enquanto a mente infantil do menino percebe e processa pequenos e significativos acontecimentos.
Tchekhov atua aí como um paisagista da trajetória do menino pela estepe, onde desfilam os tipos humanos da região e da época: o camponês, o judeu, o mujique, o comerciante, o vagabundo. Mas sobretudo desfila o menino Iegorutchka e sua visão ainda ingênua dos homens e do mundo, que aos poucos se transforma conforme a viagem avança. Nesta relação entre ele, aqueles homens e aquele mundo constitui-se a narrativa de "A Estepe", pontuada pelo detalhe, a nuance e tudo o que a mirada apressada não capta. Podemos pedir licença para discordar um pouco de Tchékhov: " A Estepe" é uma pequena obra-prima.
* * * *
"Nas tardes e noites de julho, as codornas e os sisões já não piam, os rouxinóis já não cantam nas ravinas cobertas de florestas, as flores não exalam perfume, mas toda a estepe continua linda e cheia de vida. Mal o sol vai embora, a neblina envolve a terra e a tristeza do dia é esquecida, tudo é perdoado e a estepe suspira de leve, com seu peito largo. "
Celso A. Uequed Pitol
Canoas,
20/10/2015
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