A noite do meu bem, de Ruy Castro | Julio Daio Borges | Digestivo Cultural

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COLUNAS

Segunda-feira, 18/7/2016
A noite do meu bem, de Ruy Castro
Julio Daio Borges
+ de 4400 Acessos


Desde que Ruy Castro publicou Chega de Saudade (1990), a bossa-nova assumiu um lugar central na música brasileira. Assim como o nosso modernismo dividiu a arte brasileira em "antes" e "depois", a bossa-nova, relançada no final do século XX, dividiu a nossa música em "antes" e "depois".

Os pré-bossa-novistas acabaram como o pré-socráticos: suas obras se perderam no tempo, restando apenas fragmentos. Assim, passamos as últimas décadas achando que, com Tom, Vinicius e João Gilberto, se deu o Big Bang. O resto era silêncio.

É verdade que o mesmo Ruy Castro escreveu Carmen (2006). E contou, no seu melhor livro, a história das cantoras do rádio, incluindo a mais célebre delas, que conquistou Hollywood nos anos 40 ― e reconstituindo, de lambuja, a história do samba, na chamada Época de Ouro, a era dos cassinos, os anos 30.

O problema é que Carmen não foi lido como Chega de Saudade. Nem mesmo como A onda que se ergueu no mar (2001), livro de ensaios sobre a bossa-nova e seus desdobramentos. E nem como Ela é carioca (1999), a enciclopédia de Ruy Castro para Ipanema. A bossa-nova e seus personagens prevaleceram, mais uma vez.

Consciente ou inconscientemente, Ruy Castro preenche a lacuna entre Carmen e Chega de Saudade com A noite do meu bem, a História e as histórias do samba-canção (Companhia das Letras, 2015). O novo livro começa, justamente, com o fechamento dos cassinos no Brasil, por decreto do presidente Dutra, em 1946. Cobre toda a era das boates, no Rio, e se encerra em meados dos anos 60, com a renúncia de Jânio, a presidência vacilante de Jango e a ascensão dos militares, da MPB e do rock'n'roll.

Se Ruy Castro havia dominado o assunto "bossa-nova" ― tanto que ninguém quase ousou tocar no tema depois dele ― e se praticamente esgotou a Era de Ouro, e o samba nos anos 30, até mesmo a Hollywood dos anos 40, com Carmen, ainda faltava essa "idade média", entre meados dos anos 40 e o início dos anos 60, que ele aborda com A noite do meu bem.

Esquematicamente, no universo do autor, podemos falar de algumas mudanças, que definem os contornos da nova obra. Em primeiro lugar, o cenário. Ruy Castro, um especialista em Ipanema, aborda Copacabana. Tudo bem que, depois de Carnaval no fogo (2003), o autor é praticamente um especialista em Rio de Janeiro. Mas, mesmo assim, Copacabana nos anos 50 é diferente de Ipanema nos anos 60 e depois.

Em segundo lugar, a mudança é estrutural. Com a proibição dos jogos de azar no Brasil, as produções musicais, antes patrocinadas pelos cassinos, têm de se adaptar. Assim, em lugar dos grandes palcos e do espalhafato de uma Carmen Miranda, por exemplo, tem-se o intimismo das boates, seja dentro dos hotéis, como o Meia-Noite, no Copacabana Palace, seja com endereço próprio, como o Sacha's.

Em terceiro lugar, o novo momento exige uma nova trilha sonora. Assim, em lugar do samba, que ganhou o mundo com Carmen, o samba-canção. Ao contrário do samba tradicional ― épico, com ritmo bem marcado, para tocar no rádio e até conquistar a avenida, durante o Carnaval ―, o samba-canção: lírico, reflexivo, para abordar a condição humana, as complexidades do amor, sem muito final feliz, e para dançar a dois.

Definido o cenário, o "modo de produção" e a trilha, vale falar, um pouco, do momento político, que se reflete na estrutura da sociedade carioca e na do Brasil, já que o Rio era a capital federal. A noite do meu bem, mesmo com o fechamento dos cassinos, ainda revela uma sociedade rica, em todos os sentidos, com uma vida noturna pujante e uma vida cultural que não fica atrás. Ruy Castro não fala só de música, e nem só dos desdobramentos de Getúlio e de Juscelino, mas do "café society" que viria a se tornar o "jet set", como hoje se conhece.

Claro que a especialidade de Ruy Castro é cultura, e música. E é provável que ele tenha escrito, nesse livro, uma das melhores histórias de Dolores Duran, a originalmente cantora de boleros, namorada de João Donato, depois compositora, parceira de Tom, e uma letrista de mão cheia. "A noite do meu bem", que intitula a obra, é um samba-canção dela. "Por causa de você", outro clássico de Tom, ganharia letra de Vinicius, mas, em favor de Dolores, o poeta a retirou.

Ruy Castro também conta, como ninguém mais talvez, a história de Antonio Maria (sorry, Joaquim Ferreira dos Santos). Originalmente um cronista da madrugada, que, além de alimentar os principais jornais da época, escreveu roteiros para musicais e as letras de alguns dos sambas-canção e ― por que não dizer? ― dos *sambas* mais emblemáticos, como "Manhã de Carnaval", mais conhecido como um clássico da bossa-nova, e "Ninguém me ama, ninguém me quer"... Sem contar que Antonio Maria viveu intensamente ― e seu romance com Danuza Leão é um dos pontos altos do livro. Aliás, seu desaparecimento antes dos 40 anos, e a marca profunda que ele deixou na cultura, dá uma ideia da intensidade com que viveu.

E Samuel Wainer, o primeiro marido de Danuza, um dos barões da imprensa da época, dono do Última Hora, uma lenda do jornalismo brasileiro, também merece a atenção de Ruy Castro. E brilha, porque o livro pega seu auge (ainda que Danuza o troque por Maria). É interessante, ainda, ver Ruy Castro abordar, en passant, Assis Chateaubriand, esse monstro biografado por Fernando Morais, e a dinastia dos Marinho, antes da TV Globo.

Mas lógico que o "prato principal" acaba sendo aqueles que Ruy Castro conhece mais, "de outros carnavais", digamos assim. A entrada de Vinicius de Moraes, recém-chegado de Los Angeles, por exemplo, é triunfal. Na fase em que conhece Lila Bôscoli e logo mais encontra Tom. Igualmente triunfal é a ascensão do próprio Tom Jobim, originalmente um pianista de boate, como seu colega e parceiro Newton Mendonça, mas que cai nas graças dos maestros-arranjadores da Rádio Nacional, como Radamés Gnatalli, que o adota, depois nas graças de compositores como Ary Barroso e Dorival Caymmi, ambos no auge, e finalmente é apresentado ao poeta e diplomata Vinicius de Moraes. Como o próprio Ruy Castro diz, no livro, "o resto é História".

Aprende-se muito, igualmente, sobre Ibrahim Sued, o futuro colunista social, autor das expressões "sorry, periferia" e "linda de morrer". Fernando Lobo, outro cronista da madrugada, pai de Edu Lobo e autor de "Chuvas de Verão". Doris Monteiro, uma cantora que precisa ser redescoberta. Humberto Teixeira, o parceiro de Luiz Gonzaga, e co-inventor do baião. Jacinto de Thormes, outro cronista influente, e implacável. Nelson Gonçalves, sim, o da "boemia" (originalmente, "boêmia" ― mas que ele perverteu, e "colou"). Johnny Alf, outro dos pais da bossa-nova, que o mundo esqueceu. E Sergio Porto, alter ego de Stanislaw Ponte Preta, que, justamente, consagrou "bossa nova" como termo (para designar novidades) e que batizou o Beco das Garrafas, como "Beco das Garrafadas" ― o mesmo "lócus" que, futuramente, viria a lançar gente como Elis Regina, Wilson Simonal e Jorge Ben (antes de Jor).

Com tanta gente boa, com tantos talentos e com tantas personalidades, a unidade de A noite do meu bem perde um pouco, como livro. Sem contar as histórias das boates em si, que, na verdade, são o fio condutor. A noite do meu bem não é tão "redondo" como Chega de Saudade ou Carmen, embora tenha momentos antológicos tanto quanto.

No conjunto da obra de Ruy Castro, contudo, preenche, conforme dito, uma "lacuna", que, para ele, seria algo muito natural. Ruy Castro, mais que biógrafo, vai se consagrando como um dos autores da história cultural do Rio, e ― sendo o Rio a capital da República, nesse período ― da história cultural do Brasil. Para quem já leu quase todo o Ruy Castro, como eu, A noite do meu bem é imperdível. Mas para quem não leu tudo ainda, Chega de Saudade e Carmen vêm antes ;-)


Julio Daio Borges
São Paulo, 18/7/2016

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