Li no site português Observador que, em 25 de outubro, foi devolvido à biblioteca da cidade norte-americana de Guilderland um livro que havia sido retirado de lá...em 1974! O caso me recordou um episódio da minha infãncia que creio nunca tenha contado a ninguém.
Morei dos 5 aos 22 anos em Bento Gonçalves, na serra gaúcha, e sempre fui assíduo frequentador da Biblioteca Pública Castro Alves, nos vários endereços que ela teve, sempre no Centro da cidade. Sempre, menos num período de alguns meses...
...nos quais eu mantive em meu poder um livro que havia retirado de lá e do qual gostei tanto que simplesmente decidi não devolver. Eu teria então por volta dos meus 10 ou 11 anos, e devo ter achado o máximo a ideia de poder ler aquele livro à hora que eu quisesse.
Porém, essa euforia inicial durou pouco. Afinal, como eu ainda era um sem-rendimentos, todos os livros que circulavam dentro de nossa casa ou eram livros didáticos ou presenteados por minha mãe, ou então volumes retirados da já citada biblioteca Castro Alves, que os cedia por uma semana, se lembro bem. Um livro que minha mãe não comprara e que fosse visto circulando pela casa por semanas a fio despertaria suspeitas. Ou seja, a ideia de "ler quando eu bem entender" já ficara descartada.
Eu já tinha idade suficiente para saber que estava fazendo algo errado - tecnicamente, era um furto. Então, depois de algum tempo, somou-se à preocupação já citada de ter o furto descoberto a consciência de que eu havia pego um livro destinado a todos e o desviado para meu deleite pessoal (um deleite que já nem ocorria mais).
Então um belo dia decidi dar uma fim àquela situação e enfrentar as consequências, quaisquer que elas fossem. O que me assustava particularmente era a questão da multa, afinal sendo eu um sem-renda, caberia à minha mãe ter que pagar, e aí inevitavelmente ela acabaria sabendo do meu delito. Pus o livro na mochila e me dirigi à Castro Alves, onde enfim entrava depois de meses ausente e apresentei como justificativa pelo atraso um singelo "esqueci de devolver!".
Não sei dizer se as funcionárias da biblioteca acreditaram, de todo modo ficaram felizes pela volta do livro (e, quero crer, por eu ter enfrentado a situação) e acabaram me isentando da multa (o que fez com que minha mãe jamais soubesse do ocorrido). Dali em diante, voltei a ser habituê na Castro Alves, devolvendo o que retirava sempre dentro dos prazos.
Lição aprendida: fazer a coisa certa sempre é a melhor opção!