COLUNAS
Quinta-feira,
9/3/2017
Essas moças de mil bocas
Elisa Andrade Buzzo
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Suas imagens supersimpáticas por vezes aparecem em uma busca na rede ou em reprises de programas na televisão. Como elas parecem lindas, articuladas; fazem caras e bocas para falar de seu cotidiano reluzente, cada passo, cada balanço de cabelo tem suma importância para essas meninas que vivem e vendem de imagens.
Ah, como elas falam, e tudo sobre seu ritual de beleza lançam como superimportante: a sombra usada, o batom escolhido, o primer testado, o BB Cream suado, os cremes potentes para os cabelos. O que até poderia ser interessante. Mas há um quê de sacrilégio em tornar público esse mesmo ritual privado, em forma de pequenas dicas autênticas ou propaganda obscura.
E essa esfera doméstica, daquilo que é feito em frente ao espelho, no banheiro, no chuveiro, ganha o mundo na forma de fotos, de vídeos e de muita conversa para que não fique um segundo sequer de silêncio. Porque essas moças são produtivas; e não param quietas; não podem, e não é delas a culpa, é do movimento frenético que nosso tempo impõe e propaga; é do nosso querer diário e da acintosa fome nossa.
Assim, em seu largo dicionário de palavras, estão fora de questão a inatividade e a passividade. Dentro do caleidoscópio vertiginoso de suas vaidades está o convencimento e uma tentativa vã de abraçar todos os assuntos. Suas vozes são finas, o gestual é dócil, o sorriso uma constante.
E, saltando da tela para o mundo das realidades, em uma roda louca algumas dessas meninas se reúnem, tomando um chá da tarde com docinhos cenográficos. Não há tempo a perder com comida na boca, e ai daquele que tentar se intrometer com uma pergunta ou fala. Elas continuam sozinhas, tagarelando com seu próprio espelho e suas consumidoras virtuais. Isso é um caldeirão quente com espetos atravessando quem quer que se oponha. Eh, essas mil bocas com cílios vorazes que por vezes espocam e atormentam.
Elisa Andrade Buzzo
São Paulo,
9/3/2017
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