COLUNAS
Terça-feira,
25/2/2003
Não chore por nós, Argentina!
Félix Maier
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"Rico como um argentino" era uma expressão muito conhecida mundo afora para
sintetizar a exuberante história econômica argentina entre os anos de 1860 e
1930.
Em 1930, a Argentina era um dos países mais ricos e urbanizados do mundo.
Naquele ano, o país tinha mais automóveis por habitante do que a Inglaterra.
O desastre começou na década de 1940, com o peronismo justicialista. As
causas são apontadas por Og Leme: "Empreguismo, corporativismo, concessão de
privilégios, expansão desmesurada dos gastos públicos, protecionismo,
déficits, endividamento, inflação, corrupção etc. foram algumas das
conseqüências das políticas estatizantes que encontraram seu estuário nas
atuais dificuldades argentinas" (1).
Houve duas tentativas de reverter o desastre argentino: a do Plano Austral,
de 1985, e a do plano do justicialista Carlos Menen e seu Ministro da
Economia, Domingos Cavallo. Ambas foram fragorosamente derrotadas pelo
sistema econômico argentino vigente, baseado no patrimonialismo
pelego-peronista. Tal sistema consiste na dilapidação do patrimônio público
e privado, promovido por líderes sindicais e pela burocracia estatal, que
levou a Argentina, depois do Governo demagógico e populista de Domingos
Perón, a não encontrar mais seu caminho de desenvolvimento. No final de
2001, a Argentina literalmente "quebrou", teve seis presidentes em um mês e
deu um "calote" na dívida externa.
Se analisarmos as causas do desastre argentino enunciadas por Og Leme,
observamos que aqueles itens caem como uma carapuça para o Brasil vestir
(embora nunca tivéssemos sido "rico como um brasileiro"): temos
privilegiados marajás recebendo aposentadorias milionárias (professores com
mais de R$ 20.000,00; delegados de polícia com mais de R$ 30.000,00);
endividamento colossal (900 bilhões de reais, só de dívida pública interna,
pois a dívida externa sequer é mencionada pelos nossos analistas
econômicos); gastos públicos excessivos (vale-alimentação, vale-transporte,
auxílio-moradia, auxílio-paletó, 4 meses de licença-maternidade, verba de
gabinete, diárias, jetons, horas-extras, automóveis chapa-branca, passagens
aéreas etc.); corrupção desenfreada (Nicolaus & Silveirinhas); impunidade
generalizada (não há notícia de que algum criminosos de colarinho branco
tenha permanecido muito tempo na cadeia), devido principalmente a leis
lenientes e à Justiça inoperante. Nada mais parecido, aqui como na
Argentina.
Ainda não quebramos, garantem nossos economistas, embora virtualmente
estejamos quebrados há bastante tempo, pois os últimos empréstimos tomados
do FMI e outros bancos internacionais estão apenas servindo para pagar uma
parte dos juros da dívida. Oficialmente não quebramos, porém, parece que o
"crack" brasileiro é somente uma questão de tempo, que poderá se aproximar
rapidamente, principalmente se o conceito de Estado patrimonialista e
paternalista do atual governo "democrático e popular" for levado para onde
sempre quis levar o cérbero (2) petista. Nem por nada que Lula-laite
aumentou para 34 o número de "petistérios", alguns cobrindo as mesmas
funções de outros. Enquanto o País não quebra, o novo governo tentará criar
um socialismo tropical, de paladar tutti-frutti, passando por Davos e FMI,
porém com tempero de salsa cubana, um gole de mojito e uma baforada de
havana. Enquanto arrocha cada vez mais a população, com aumento de impostos
e preços generalizados, a "república dos barbudinhos" enfim desceu do
palanque. Nada de positivo se pode esperar de um governo baseado na
cooptação política do tipo "orçamento participativo" (3), na manutenção de
privilégios e regalias no serviço público, no assistencialismo demagógico
visto no projeto "Fome Zero" e nos vários tipos de "bolsas" que já
funcionavam no Governo FHC, além de outros que estão sendo criados pelo
atual governo: Cartão Fome Zero, Bolsa-Escola, Bolsa-alimentação, Cesta
Básica, Vale-Gás etc., fazendo do Brasil um formidável país "marsupial", no
dizer de Jarbas Passarinho. Autêntico voto-de-cabresto, esse "Fomebrás",
nestes tempos modernosos social-gramscistas, de grande utilidade para o
comando petista nas próximas eleições municipais, em 2004... Don't cry for
us, Argentina!
Desenvolvimento, progresso, trabalho, empreendedorismo, juros baixos, obras
estruturais, hidrelétricas, rodovias, ferrovias, hidrovias - em nada disso se
fala. Apenas se pede que o povo brasileiro, já massacrado por inúmeros
impostos e pela volta da inflação, adote os filhotes dos outros, como os
tico-ticos são obrigados a criar os filhotes de chopins, provenientes de
ovos dessas aves preguiçosas colocados em seus ninhos. O que mais se vê nas
Guaribas dos sertões brasileiros são mulheres com 7, 10, 15 filhos, quando
não deveriam ter um filho sequer, devido à falta de condição sócio-econômica
para criá-los. Claro que se deve combater a fome. Porém, de nada adiantará
levar comida aos pobres, se ao mesmo tempo o Governo não der condições
adequadas para a retomada do desenvolvimento e a conseqüente oferta de
empregos à população, para a real inclusão dessas pessoas à sociedade
brasileira. Por exemplo: além de comida para Guaribas e outros áridos
municípios do Polígono da Seca, deve-se levar água para lá, tanto para matar
a sede da população, quanto para incrementar a atividade agrícola. Nem que
seja por meio da transposição de águas do Rio Araguaia ou do Tocantins. Ou
do próprio Amazonas. Custa caro? Ora, o desvio de dinheiro feito na SUDAM
daria para fazer a transposição de águas do São Francisco para vasta região
do Nordeste.
Além do mais, nada disso terá valor, se o atual Governo deixar de realizar
um planejamento familiar sério em nosso País, com o incentivo do uso de
métodos contraceptivos. Por que ninguém do Governo toca nesse assunto? Medo
de ser excomungado por algum algum bispo católico? Medo de Dom Morelli?
Chega de fabricar "anjinhos" no Brasil, principalmente no Nordeste, que cedo
vão para o céu, quando não penam na terra de barriga vazia. Pois é a alta
taxa de natalidade entre os mais pobres que mais depressa faz girar os
ponteiros do "relógio da pobreza" (4), não só no Brasil, mas em todo o
mundo. E, finalmente, chega de colocar chopins em nossos ninhos, porque a
conta, mais essa, no fim, cairá sobre nossos costados, não no do Governo,
que apenas cria mais um factóide da consistência de uma bolha de sabão.
Por tudo isso, não chore por nós, Argentina!
Notas
(1) Og Leme, do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, resenhando o livro "The
Sorrows of Carmencita", de Mauricio Rojas, in revista "think tank" de
Set/Out/Nov 2002, pg. 26, do Instituto Liberal.
(2) Cérbero - Mitológico cão de três cabeças. O PT é um
cão-de-quatro-cabeças, devido ao número de suas tendências radicais
internas, ainda com saudades dos tempos soviéticos (mesmo Lula-laite ainda
nutre simpatia pelo tirano de Cuba), como se pode observar na magistral
reportagem de "Veja", edição de 23 de outubro de 2002.
(3) Orçamento Participativo - Mecanismo de manipulação política, através do
qual o Partido dos Trabalhadores (PT) busca aprofundar a estratégia
revolucionária leninista conhecida como "Dualidade do poder". As decisões do
"Orçamento Participativo" são tomadas não pela população das regiões em que
se dividem a Capital e o Estado (caso do Rio Grande do Sul - governos Tarso
Genro e Olívio Dutra, respectivamente), mas pelos ativistas do Partido e
pelos "quadros políticos do governo". Tarso Genro reconheceu que o
"Orçamento Participativo" foi concebido para operar uma "transferência de
poder para a classe trabalhadora organizada" e substituir gradativamente "a
representação política tradicional, vinda das urnas, pela democracia
direta", acrescentando que esse mecanismo político havia sido constituído
sobre "princípios gerais, originários da Comuna de Paris e dos sovietes"
(José Giusti Tavares, in "Totalitarismo Tardio - o caso do PT").
(4) Relógio da Pobreza - Inaugurado em 1995, durante a "Cúpula Mundial para
o Desenvolvimento Social", realizada em Copenhague, Dinamarca, para mostrar
a rapidez do crescimento da pobreza no mundo. A cada minuto (dados de 1999),
47 pessoas somam-se ao contingente de pobres - 25 milhões por ano. Na
América Latina, de 1980 a 1999, o número de pobres aumentou de 63 para 130
milhões.
(*) O autor é casado, tem um casal de filhos - nenhum chopim colocado no
ninho dos outros...
Félix Maier
Brasília,
25/2/2003
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