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Segunda-feira, 13/2/2006
O Google e o negócio da China
Nemo Nox
+ de 12300 Acessos
+ 1 Comentário(s)

A expressão "fazer um negócio da China" está ganhando um novo significado. Além de ser um empreendimento lucrativo, agora implica também em curvar-se aos desejos de um governo totalitário em troca da penetração num mercado de tamanho descomunal. Trata-se de uma manobra pouco surpreendente para corporações que colocam o lucro acima de qualquer postura política, mas causa espanto e indignação quando a protagonista do negócio da China é uma empresa que sempre se orgulhou de sua ética e ostenta em sua filosofia corporativa máximas como "democracia funciona bem na rede" ("democracy on the web works") e principalmente "você pode ganhar dinheiro sem praticar o mal" ("you can make money without doing evil"). Sim, o Google foi à China.

Conforme anunciado em 24 de janeiro de 2006 por Andrew McLaughlin, conselheiro da empresa, "para poder operar com base na China, nós retiramos algum conteúdo dos resultados de busca disponíveis em google.cn em resposta a leis e políticas locais". A justificativa? "Apesar da remoção seletiva de resultados ser inconsistente com a missão do Google, não oferecer informação alguma seria mais inconsistente ainda."

A notícia circulou rapidamente pela internet, despertando pelo caminho incontáveis comentários desfavoráveis. Entre as primeiras e mais veementes condenações ao novo contrato do Google está a Repórteres Sem Fronteiras, ONG dedicada à defesa da liberdade de imprensa, que acusou a empresa de hipocrisia e chamou o episódio de "um dia negro para a liberdade de expressão na China".

A resposta do Google não tardou e veio através do weblog oficial da empresa, o Google Blog. "Chegamos à nossa decisão perguntando a nós mesmos que caminho seria o mais eficiente para dar continuidade à missão de organizar a informação mundial e torná-la universalmente útil e acessível. Ou, de forma mais simples: como podemos oferecer o maior acesso à informação ao maior número de pessoas?" Se parece paradoxal achar que a melhor forma de distribuir informação é censurando parte dela, mais curiosa ainda é a completa ausência de qualquer referência ao fator econômico da decisão, como se não estivessem em jogo os lucros gigantescos num mercado que já tem mais de cem milhões de pessoas usando a internet e uma das maiores taxas de crescimento na quantidade de usuários da rede.

Na verdade, o Google está entrando no mercado chinês com algum atraso. Yahoo e Microsoft já estão lá, também censurando resultados de busca. Mas do Google esperava-se um comportamento diferente, afinal a empresa sempre fez questão de enfatizar seu anticonvencionalismo. No documento oficial enviado a Securities and Exchange Comission quando abriram seu capital, afirmavam que "O Google não é uma empresa convencional. Não temos intenção de nos tornarmos uma empresa convencional. Através de toda a evolução do Google como empresa privada, fizemos uma administração diferente. Temos também enfatizado uma atmosfera de criatividade e desafio, que nos tem ajudado a oferecer acesso imparcial, preciso e livre para todos que confiam em nós em todo o mundo." Talvez agora tenham que acrescentar: "menos na China".

Os defensores da postura do Google (entre eles os blogueiros Jason Calacanis, que recentemente vendeu sua empresa Weblogs Inc para o grupo AOL, e David Weinberger, autor do livro Small Pieces Loosely Joined) argumentam que, apesar de não ser uma decisão agradável ou popular, tem potencial para ser a mais eficiente a longo prazo para uma eventual abertura chinesa. Dar um gostinho do que um mecanismo de busca em moldes ocidentais pode oferecer e esperar que a censura governamental vá afrouxando suas restrições. Calacanis chega ao extremo de elogiar a coragem do Google por comprometer sua ética para fincar um pé na China. Mas é exatamente por ter usado essa ética como bandeira por tantos anos que o Google agora se vê vítima de tantas críticas. Sua pureza de intenções parece ter sido útil somente enquanto não se chocou com os interesses econômicos. Até que ponto estariam dispostos a adaptar seus princípios frente a novas exigências do governo chinês? Se a Microsoft censurou o weblog do chinês Zhao Jing, e a Yahoo forneceu informações que contribuíram para colocar o dissidente chinês Shi Tao na prisão, o que podemos esperar do Google? Eles realmente acreditam que "nosso compromisso com a China é a melhor (e talvez a única) maneira de ajudar a levar os tremendos benefícios do acesso universal à informação para todos os usuários de lá" ou estão somente interessados em fazer um negócio da China?

Para ir além
Leia também The Search, John Battelle e a história do Google.

Nota do Editor
Nemo Nox assina o blog Por um Punhado de Pixels.


Nemo Nox
Washington, 13/2/2006

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Gerald Thomas: Cidadão do Mundo (parte IV) de Jardel Dias Cavalcanti
02. A novela América e o sensacionalismo de Oprah de Marcelo Maroldi


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COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
19/9/2007
13h17min
Repórteres sem fronteiras não é uma ONG dedicada à liberdade de expressão. É antes uma entidade financiada pela CIA, pelo governo estadunidense, pela União Européia, implicada na defesa da tortura, de guerras e conivente com crimes cometidos contra jornalistas quando estes são de um espectro ideológico não neoliberal. Esta entidade se situa num campo extremo do neliberalismo, da direita e do universo ultra-conservador. Não é digna de credibilidade. Convido todas e todos a investigar seu histórico.
[Leia outros Comentários de emerson da silva]
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