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Quinta-feira, 6/10/2005
Por que eu não escrevo testimonials no Orkut
Adriana Baggio

Tenho uma amiga muito querida que me cobra um depoimento em seu perfil no Orkut. Tentei explicar a ela porque não escrevo testimonials e acredito ter sido meio vaga. Pois bem, refleti um pouco mais sobre meus motivos e descobri que eles são mais numerosos do que imaginava.

Em primeiro lugar, não escrevo porque não levo o Orkut muito a sério. Acho bacana a proposta e acho importante participar disso. Importante "profissionalmente", não pessoalmente. É deprimente interagir com as pessoas, "mensurar" sua popularidade ou a afetividade dos seus amigos através do Orkut. No entanto, ele é ótimo para recuperar e manter contatos, fazer brincadeiras, formar uma network.

Estou me referindo à profissão mesmo - sou publicitária - mas também à necessidade de qualquer indivíduo estar atualizado com o que acontece em termos de novidades e tendências de comportamento. Você pode continuar sendo uma pessoa de sucesso em seus relacionamentos sem o Orkut, mas vai sentir-se um profissional defasado se não estiver à par das novas tecnologias e das possibilidades e mudanças que são inerentes a elas.

Um exemplo disso são os blogs (a gente fala bastante deles aqui no Digestivo.). Eles também passaram da utilização puramente pessoal e se transformaram em importante ferramenta para vários segmentos profissionais ou de utilidade pública. De diários virtuais evoluíram para espaço de divulgação e discussão sobre informações de interesse geral. Alguns se especializaram, tornando-se verdadeiras publicações. Hoje, além de continuarem sendo diários, os blogs também têm funções muito mais relevantes - são responsáveis por grandes furos de reportagem (você viu a cobertura via blogs da crise política do Governo?) e aglutinam informações e mecanismos de ajuda durante as tragédias (você viu como os blogs auxiliaram as vítimas do tsunami da Ásia e do furacão de New Orleans?).

As empresas também perceberam o potencial dos blogs como ferramentas de publicidade, relações públicas, marketing viral, etc. Grandes marcas já consideram seriamente os blogs em suas estratégias de comunicação. Portanto, ser publicitário, jornalista ou relações públicas, só para ficar no mais óbvio, sem conhecer as possibilidades dos blogs, é impossível.

Acredito que com o Orkut é a mesma coisa. Vamos acabar descobrindo novos usos para ele. Comercialmente falando, isso já acontece. Existem comunidades criadas por lojas ou por marcas, listas de discussão, e por aí vai. A Master, agência de publicidade curitibana e uma das maiores do Brasil, fez um recrutamento de estagiários através do Orkut. Perceberam em sua principal característica - a disponibilidade do perfil detalhado dos usuários - uma oportunidade de fazer a primeira "peneirada" na quantidade enorme de candidatos que invariavelmente aparecem nessas seleções.

Bem, todo esse latim aí em cima é só para explicar o primeiro motivo da minha restrição aos testimonials. Quanto ao segundo: por não levar o Orkut muito a sério, também não é toda hora que tenho saco para entrar e fazer a "manutenção". Sem falar nos "bad, bad donuts for you" que acabam com a paciência de qualquer um, ou no encerramento inexplicável do Netscape toda vez que eu tento acessar o perfil de determinada pessoa. Como redigir um depoimento sincero e relevante para alguém nessas condições?

A questão da relevância tem a ver com o terceiro motivo. Não sou expert em Orkut mas, pela lógica do programa, deduz-se que existe uma hierarquia (ou função) entre as mensagens que deixamos para nossos amigos. No entanto, as pessoas confundem testimonials com scraps e messages. Se eu fizesse algum depoimento para alguém, seria sincero, profundo e atemporal. É diferente de deixar um recado ou fazer algum comentário pontual, mais adequado para a página de scraps. Outra coisa ridícula - pode conferir! - é que grande parte dos testimonials começa assim: "Bem, o que dizer de Fulaninho de Tal.".

O quarto motivo é bem pessoal e tem a ver com a minha personalidade. Um depoimento sobre alguém de quem gosto teria emoção, subjetividade, referência a histórias e momentos compartilhados, segredos. Tenho um certo pudor em expor assim meus sentimentos de amizade, afeto ou amor. Pois é, a timidez me impede de dizer o quanto aprecio algumas pessoas.

Veja bem, o verbo é dizer. Isso significa que prefiro mostrar através de um sorriso, ao estender a mão, nas conversas, nas risadas. Ou seja, coisas impossíveis de se fazer no ambiente virtual, né? E depois, vamos dar o devido peso às coisas: declarações de amor e de afeto são muito importantes para estarem misturadas às bobagens que as pessoas escrevem no Orkut!

O último motivo, querida amiga, é que deixar um testimonial para você e não fazer o mesmo com outra pessoa poderia me colocar em maus lençóis. É delicado ranquear amigos! Prefiro deixar que essa "classificação" aconteça normalmente, através da dinâmica hipócrita do mundo real. Você sabe que é uma de minhas amigas preferidas, mas porque esfregar isso na cara dos menos afortunados?

Apesar de nunca ter deixado um depoimento para meus colegas de Orkut, tive a honra de receber dois. O fato de não escrever testimonials não impede que eu goste e agradeça os que foram deixados no meu perfil. Para mim, o Orkut é uma brincadeira, uma experiência, mas para outras pessoas talvez não seja. Vindo delas, mesmo sendo postada no ambiente artificial de um site de relacionamentos, uma mensagem tem grande valor.

Adriana Baggio
Curitiba, 6/10/2005

 

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