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Segunda-feira, 7/11/2005 A internet e o cinema Marcelo Miranda A proposta do momento por aqui é escrever sobre os 10 anos de internet comercial no Brasil. O editor deste Digestivo, Julio Borges, já fez um trabalho de mestre ao reconstituir, na sua visão pessoal, como se deu a chegada das modernidades virtuais nas nossas terras. Pensei em copiar um pouco a idéia e trazê-la para as epifanias que a internet me proporcionou. A maior diferença de mim para o Julio é que ele começou nos primórdios e pegou praticamente todas as fases. Eu, não. A internet, na minha vida, só passou a existir no começo de 2000 - e, como quem me acompanha aqui deve imaginar, se deveu muito ao meu interesse e relação com o cinema. Em 2000, saí da minha cidade-natal para estudar Jornalismo em Juiz de Fora (MG). Meu contato com computadores, até então, se resumia a processadores de texto e programas de desenho (alguém lembra do Paintbrush?). Ao entrar na faculdade, fiquei maravilhado com a sala de informática, mais ainda ao saber que teria acesso ao famoso troço chamado internet, que era a moda entre os amigos. Logo ao descobrir do que aquilo era capaz, tratei de procurar tudo relacionado ao assunto que mais me interessava: cinema. Só que eu não sabia como ou o que procurar. Imagine uma criança de frente para o maior de todos os brinquedos da sua vida, mas sem consciência da capacidade embutida nele. Era eu de frente ao computador da sala de informática da faculdade. Nesse momento de tensão, uma amiga chegou para mim e disse que conhecia um site muito legal que falava... de filmes! Tratei de anotar o nome do danado e fiquei estupefato quando o conheci. Era o hoje praticamente finado e-Pipoca - à época, no auge de notícias, comentários, debates, fichas das produções, críticas. Se eu já estava encantado com os recursos do e-Pipoca, enlouqueci quando me tornei um "usuário VIP" (alcunha que era dada a qualquer leitor que se dispusesse a se cadastrar na página). Tirava sarro como moleque mimado: "sou VIP no e-Pipoca, sou VIP no e-Pipoca", até descobrir não haver nada demais nisso. Daí para frente, um pulo. Afinal, como todos os "surfistas" da internet sabem, chegar a uma página é chegar a milhares. E dá-lhe dezenas de outros sites de cinema que fui conhecendo, alguns os quais sigo freqüentando, como o Cinema em Cena, o Adoro Cinema, o Cinemascópio e o maior de todos, o já mítico IMDb. Fui aprendendo onde procurar exatamente informações de filmes, fichas técnicas, análises, resenhas, fotos, notícias e uma infinidade de outras coisas que me mostraram o quanto o universo de conhecimento cinematográfico não se resumia à revista Set, como eu pensava. De rato virtual, fui me especializando e descobrindo outros sites que davam um passo além do informativo - casos da Contracampo e do Críticos.com, que se preocupam em, acima de tudo, pensar o cinema, algo que sempre me fascinou e me levou a querer trabalhar com isso vida afora. Também através da internet, conheci outras pessoas que queriam aprender cinema de verdade - não necessariamente fazendo, mas lendo, estudando, refletindo, escrevendo. Gente da minha idade, gente muito mais velha, gente muito mais nova. Gente de Minas, do Rio, Recife, Brasília, Natal. Gente de tudo quanto é profissão que se encontrava em espaços para falarem de um amor em comum - a imagem em movimento do cinema. Os fóruns de discussão me ensinaram muito mais do que as aulas que tive na faculdade sobre o assunto. Foi com eles que descobri vários livros fundamentais, troquei idéias e experiências, soube de filmes, diretores, tendências básicas do cinema que, de outra forma, nas condições em que eu vivia em Juiz de Fora (poucas locadoras com acervo realmente significativo, salas de exibição extremamente comerciais e quase nenhuma mostra), não saberia. Graças à internet, fundei com um amigo o Cinefilia, meu próprio site de cinema. Projeto independente, inicialmente inventado na molecagem, mas que me deu muitas alegrias e aflições nesses quatro anos de existência. Tornou-se uma revista eletrônica sem periodicidade: novos textos dependiam dos filmes vistos e analisados pelos "palpiteiros". Fizemos algumas parcerias com redes e distribuidoras, chegávamos a publicar quatro ou cinco longos textos por semana (éramos todos estudantes universitários e tínhamos bastante tempo), ganhamos leitores fiéis. Mas assim como o fervor de um começo de namoro, logo o calor se estabilizou, num patamar razoavelmente positivo. Atualmente mantenho o site junto com colaboradores e tentamos viabilizar sempre os "palpites", por mais que as circunstâncias não permitam da mesma forma que antes. Meu próximo passo foi na era dos blogs. O que para mim era simplesmente um diário virtual teve toda a concepção modificada e questionada quando visitei a página do Carlão Reichenbach, grande diretor brasileiro, autor de, entre outros, Anjos do Arrabalde, Alma Corsária e dos mais recentes Dois Córregos e Garotas do ABC. Ali estavam comentários instigantes e inteligentes sobre filmes obscuros. Percebi que não necessariamente os blogs deveriam servir de depositário de experiências pessoais. Do Carlão, tive contato com uma galera incrivelmente entendida de cinema e, mais uma vez, meus horizontes aumentaram de forma assombrosa (vale dar uma checada numa coluna que escrevi sobre alguns desses blogs). E por fim, atingi o estágio dos polêmicos downloads. Não, leitor, não sou um pirata de filmes. Apenas me dei conta do quanto programas como o eMule poderiam ser de extrema valia para se ter contato com cinematografias inexistentes no Brasil, filmes jamais exibidos por aqui, nomes quase nunca escritos ou pronunciados nessa terrinha mas devidamente reconhecidos e consagrados em outros lugares (raramente nos EUA). Muito do cinema asiático, em especial, eu tomei conhecimento baixando os filmes - geralmente em versões não muito boas e com legendas em inglês ou espanhol. Quem se dispõe a falar e escrever de cinema, quem pretende levar o trabalho a sério e não está bem localizado geograficamente (leia-se: não mora no Rio ou em São Paulo), precisa se virar com outros recursos. Somando tudo isso, a internet vem sendo a grande ferramenta para que eu tente, diariamente, me tornar um profissional melhor. Se ela não servisse para mais nada, só essa função (a de qualificar os usuários naquilo que eles se interessam) já justificaria sua existência. Marcelo Miranda |
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