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Segunda-feira, 6/2/2006
Tabus do Orkut
Marcelo Miranda

E lá vem o amigo e editor Julio Daio Borges pedir uma coluna especial sobre tema específico. Sempre que ele faz isso, eu costumo travar, porque fico me questionando se terei algo mais interessante a dizer além do que os caros colegas de Digestivo vão escrever. Ainda assim, o desafio é sempre estimulante, e mesmo que o texto não fique tão legal quanto os dos companheiros de site, sei que terei cumprido um dever da melhor forma possível. Desta vez, o tema é Orkut - e tudo e qualquer coisa relacionado a ele. Começar dizendo o que é o Orkut seria tão óbvio quanto afirmar que tal ato é chover no molhado.

(Por via das dúvidas: Orkut é uma rede de relacionamentos virtual em que o participante pode interagir com outros através de amigos, comunidades, mural de recados, mensagens particulares, classificações e outras particularidades. Nada inédito, mas, juntando tudo, criou-se mania e vício mundial - sendo que mais de 70% dos presentes são brasileiros, elemento muito bem analisado por Celso Augusto Uequed Pitol em seu artigo.)

Curioso o quanto o Orkut já se tornou peça fundamental no cotidiano de milhões de internautas. A força do site é tamanha que já criaram-se tabus em torno dele. São justamente alguns desses tabus que tentarei abordar aqui. Parto do breve questionamento de três ações tomadas por determinados usuários para tentarem se proteger ou não fazerem feio perto dos "amigos" virtuais. A eles, então:

Fim dos scraps?
Cada membro do Orkut possui um mural de recados, também conhecido como scrapbook. É ali que podem ser postadas mensagens breves, comentando, lembrando, perguntando, se apresentando. Qualquer usuário, amigo ou não, tem acesso irrestrito ao mural de todos. Ou seja, ler recadinhos alheios é praticamente regra geral no Orkut, mesmo para quem não é enxerido. Pois atualmente está em voga uma espécie de movimento pelo sumiço dos scraps: diversos orkuteiros começaram a simplesmente apagar essas mensagens recebidas tão logo elas sejam lidas e respondidas, numa aparente tentativa de manter a privacidade sem perder a camaradagem. Alguns chegam a ponto de deixar um scrap fixo, escrito por si mesmo, "avisando" a quem acessar o mural de que seu recado será lido, respondido e apagado.

Ora, eu sou totalmente contra essa regra de apagar scraps no Orkut! Sim, um ou outro comentário às vezes incômodo, comprometedor ou inoportuno (contendo agressões, por exemplo, ou citando alguma ocasião que se quer manter em discrição), vá lá. Mas lançar mão de um quase ato institucional que censura a si próprio e a quem se dispõe a trocar idéias conosco é ignorar a essência comunicativa do Orkut e desvirtuar uma de suas ferramentas mais interessantes e instigantes. Afinal, acima de tudo, o site é uma grande brincadeira - ou deveria ser pensado como tal. Um espaço de interação que nos permite ter contatos além de fronteiras físicas com o simples clique, em muitos casos sem necessidade de se decorar e-mails, números de telefone, endereços e afins. Basta ir ao mural e deixar um recadinho. Quem apaga scraps não apenas está levando a brincadeira a sério demais e mantendo preocupações com algo que não deveria, a princípio, incomodar, quanto está se privando de momentos leves e descontraídos de diversão e amizade. Sem falar que pode passar a chatíssima impressão a conhecidos e amigos que há, ali, algo a esconder...

Por que aceitar amizade de qualquer um?
Sempre que alguém nos adiciona na lista de contatos, o Orkut nos avisa de que fulano "quer ser amigo". Você tem a opção de aceitar ("sim") ou declinar o convite ("não"). A maioria dos usuários simplesmente aceita, alguns não sem antes vasculhar o perfil de quem está pedindo na tentativa de saber se tratar de alguém "do bem", mas no fim das contas a aceitação acaba sendo regra. Dizer "não" poderia soar antipático.

Eu não penso assim. Já cliquei diversas vezes em "não" no Orkut. Por que eu aceitaria ser amigo de alguém que nunca vi ou sequer falou comigo pelo simples fato de fazer crescer minha lista de contatos? Por que diria "sim" a algum antigo conhecido que não teve qualquer tipo de importância na minha vida, sendo talvez gente que me marcou negativamente no passado ou sequer me deu atenção, mas, de repente, se deparou com a minha foto no Orkut, ressurgiu como um fantasma da Web e quis ser meu "amigo"? Se tal pessoa nunca quis ser amiga de verdade, não seria agora, on-line, que ela mudaria drasticamente de opinião. E se porventura isso acontecesse, eu preferiria que fosse ao vivo. Então, me dou o direito de negar o pedido. Se ela iniciar um diálogo (mesmo que através dos scraps), aí podemos conversar e, só depois, avaliar a tentativa de "amizade".

Confesso ser esta uma postura razoavelmente besta e, quem sabe, infantil da minha parte, mas durmo bem com isso. Nas ocasiões em que disse "não", eu não o fiz de maldade nem por instinto. Pensei bem antes e achei que me sentiria melhor recusando incluir na minha lista gente que eu não conseguiria ficar olhando no rosto quadriculado das fotos abaixo da inscrição "amigo". Se você foi um dos recusados, foi mal aí. Deve ter havido um motivo muito forte...

Sair do Orkut é solução?
Mais grave que apagar scraps, há outro movimento rolando na rede. É o chamado "orkuticídio". Como o nome adianta, trata-se da retirada plena e irrestrita do usuário do Orkut. Cada um tem suas razões, e quem somos nós para questioná-las. Porém, venho a público aqui fazer um apelo a quem "se matou" ou pensa no tão radical ato: não o faça. Seja lá o que houve, resista.

O Orkut é uma das invenções mais estimulantes da internet. Como dito, não existe nada de novo ali, mas sim a reunião de diversos recursos de interação em prol da formação de grandes comunidades. Participar de forma saudável e construtiva, falando de televisão, cinema, culinária, economia, música, sexo, emprego, futilidades e infinitos temas mais, apenas engrandece a experiência de estar no Orkut. Usar o scrapbook na sua finalidade, que é deixar recados breves, e não espalhar spams, correntes ou demais mensagens inúteis, torna o trânsito de informações menos constrangedor e mais agradável a todo e qualquer participante. Não provocar brigas virtuais, não atiçar rivalidades, não fazer intrigas ou futricas, só tendem a manter o site um ambiente de grande harmonia e respeito. Se todos fizermos isso, se todos seguirmos as normas básicas de educação que deveríamos aprender desde crianças na vida real e aplicá-las ao Orkut, ninguém precisará "se suicidar" e deixar de usufruir o grande mergulho virtual que se tornou o site.

Marcelo Miranda
Juiz de Fora, 6/2/2006

 

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