|
Terça-feira, 9/5/2006 Carta de um jovem contestador Rafael Rodrigues Caro Christopher Hitchens, Não sei o que mais me atraiu em seu livro Cartas a um jovem contestador, se a simples e bonita capa ou se o título. As duas coisas com certeza me deixaram muito curioso. Em parte porque me fez lembrar de Cartas a um jovem poeta, de Rainer Maria Rilke, o qual já li e gostei muito e no qual você se inspirou para escrever a sua obra. Cartas a um jovem contestador (Companhia das Letras, 200, 129 págs.) é o mais recente livro do jornalista inglês Christopher Hitchens publicado no Brasil. O título faz referência - e por que não uma reverência - às Cartas a um jovem poeta, do poeta alemão Rainer Maria Rilke (1875-1926). Em suas Cartas a um jovem contestador, Hitchens se dirige a um jovem fictício que representa a juventude um tanto quanto perdida de hoje - bombardeada com informações de todo tipo - e a todo aquele que tiver acesso à obra. Apesar de você - e me permita chamar-lhe de você - não se dirigir a alguém específico, suas "cartas" dão realmente a impressão de correspondências. O que, se você não tivesse o dom da escrita, não seria possível. Acredito que todo jovem tem um espírito contestador. Alguns o usam, outros não. Eu mesmo, há alguns anos, tive a oportunidade de participar ativamente de movimentos estudantis - poucos, ainda bem - e com isso pude aprender uma das lições que você ensina no livro: pensar por conta própria. Mas, enfim, deixemos minhas experiências de lado. Ao contrário do que parece, escrever cartas não é tão simples. O livro de Christopher Hitchens poderia perfeitamente ser um fracasso. Não por suas idéias, mas sim pela fragilidade da estrutura escolhida para servir de base para elas. Mas não. As cartas do jornalista inglês não são "aborrecentes". Muito pelo contrário. O leitor fica preso às palavras e idéias de Hitchens. É incrível como nossa sociedade vem sendo alertada ao longo dos anos e ignora tais alertas. Me refiro às palavras de Émile Zola, que você reproduz em sua primeira carta: "Cem anos depois da Declaração dos Direitos do Homem, cem anos depois do supremo ato de tolerância e emancipação, voltamos à guerra religiosa, ao mais odioso e mais estúpido dos fanatismos". Outra citação da qual gostei muito foi a de Eugene Debs que, segundo você, "costumava dizer a seus eleitores" que "ele não os conduziria à Terra Prometida mesmo que pudesse, porque se eles confiassem o suficiente nele para ser conduzidos para dentro dela, também o seriam para ser conduzidos para fora dela". Acho que pensamos muito pouco por nós mesmos, Hitchens. Seria ótimo se todos colocassem em prática seus conselhos e suas idéias. Que não devem ser vistas como um manual a ser seguido. O próprio Christopher Hitchens incentiva o leitor a se informar, pesquisar - ele cita e indica várias obras e autores em todas as cartas - e a pensar de maneira independente: "Procure o debate ou a discussão por eles mesmos; o túmulo fornecerá muito tempo para o silêncio". E um pouco depois, fazendo uso das palavras de George Konrad, "o dissidente húngaro que manteve sua integridade através dos tempos crepusculares": "Se você não gosta do estilo dos outros, cultive o seu próprio". Bom, não vou me prolongar. Resolvi enviar-lhe esta carta inspirado em um respeitado jornalista brasileiro, Daniel Piza, que também lhe dedicou algumas linhas. Mas, ao contrário dele, não posso acrescentar nada aos seus escritos ou discutir qualquer assunto com você. Daqui a alguns anos, com uma maior quantidade de leituras, e uma quantidade bem maior de conhecimento, quem sabe. Esta carta que lhe envio serve apenas para demonstrar minha admiração por suas idéias e agradecer pelos conselhos em seus escritos. Bom, isso é tudo. Que você continue sendo sempre um contestador - mesmo que não tão jovem... Instigante do primeiro ao último parágrafo, Cartas a um jovem contestador assume lugar cativo na estante das obras que visam abrir mentes e, mais que levantar questões, mostram o caminho para se chegar a soluções. Nota do Editor Texto originalmente publicado no Paralelos Blog. Rafael Rodrigues é estudante de Letras e atualmente, escreve para o Simplicíssimo, para a Argumento e para o Paralelos.org. Para ir além Rafael Rodrigues |
|
|