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Sexta-feira, 25/8/2006
Melhores Podcasts
Julio Daio Borges

Os podcasts, se não me engano, começaram em 2004, mas eu comecei a ouvir só no ano passado. De repente, vi um link no blog do Alexandre Inagaki e resolvi entrar. Quase caí de costas: era o Fred Leal, revirando todos os conceitos que eu tinha de rádio (on-line), no É batata!. Desde então, não parei mais de pesquisar e de resenhar podcasts (já que eu não resenhei blogs...).

E de uns tempos pra cá, as pessoas - quando descobrem os podcasts - me pedem uma lista de "melhores podcasts". O modelo, aqui, é o mesmo das minhas listas de "melhores blogs" (1 e 2). Demorei um pouco mais para fazer, neste caso, porque não achava dez podcasts que, cegamente, pudesse indicar. Podcasts são muito mais difíceis de começar, de manter e de acontecer do que blogs. Assim, vários podcasters desistem no meio do caminho.

Fora o "custo" de produção em matéria de tempo, energia e retorno, procurei considerar os podcasts sob alguns critérios. Qualidade técnica: podcast tem de ser "audível" (e podcaster não pode falar de dentro de um barril). Alguma periodicidade: novos programas têm de ser produzidos de tempos em tempos (passar pela Terra como passa o cometa Halley não vale). Projeto e interesse: a que vem um podcast? (Podcasters sem objetivo nascem e morrem todos os dias.) Facilidade de uso: streaming ou download? (Se não estiver claro, para o ouvinte, como ele pode escutar e/ou assinar um podcast, ele vai desistir.) Por último, a capacidade de renovação: no podcast, não dá pra enrolar como no blog (ou o podcaster caminha numa determinada direção ou a empreitada não tem sentido algum).

* É batata! - O Fred Leal - eu já disse isso a ele - parece que nasceu para a coisa. Acho-o naturalmente engraçado, como podcaster, mas sem avacalhar com o programa. Inteligente, mas sem ser pedante (ou mesmo chato). Interessante, sem ser comprometedor: trazendo informação nova, mas sem te obrigar a, toda hora, prestar atenção. O maior defeito do Fred Leal, a meu ver, foi interromper os episódios por muito tempo, e não conseguir mais reproduzir aquela euforia inicial. Talvez cansou ou o gás acabou - ou simplesmente não repercutiu como ele queria. (Ou merecia.) Talvez fosse tudo apenas experimentação e, depois de explorar os mais variados formatos, ele não viu mais graça. O Fred Leal já entrevistou na Flip; montou, como o Manhattan Connection, mesa-redonda; lançou pílulas diárias com poucas músicas; contou piadas; inventou personagens e contou "causos"; transmitiu do backstage de shows; sampleou podcasts (e podcasters) outros... Ressuscitou o Brizola. Por isso, para mim, ele é um dos Pais Fundadores. Por isso, tanta gente, como o Alexandre Matias, tem seguido o seu rastro. E assim vai continuar...

* Discofonia - entre o Fred Leal e o Guilherme Werneck, eu ia incluir o Nix, do Nightripper, mas ele abandonou o navio - legando, para a posteridade, mais de trinta programas sobre a história do blues... O Guilherme eu descobri mais ou menos na mesma época. Era muuuito mais profissional do que o Fred Leal (era, na verdade, outro estilo), e muito mais concentrado em música do que em jornalismo ou experiências engraçadas com locução. O Guilherme Werneck é um dos podcasters brasileiros mais entendidos em música - se não for o mais entendido. A "viagem pelos seus discos", como ele anuncia, nunca é tediosa. O Discofonia me fez ouvir "outros sons" que eu, naturalmente, não ouviria - e me fez atravessar sets inteiros, sobretudo de DJs, que eu agüentei estoicamente porque sabia que valeriam a pena. Tem uns dois ou três episódios do Discofonia que eu considero antológicos - o que o Guilherme fez com a Marina, sua esposa, é um deles. Fiz questão de conhecê-lo pessoalmente. O Discofonia me indicou ainda o Ultra Studio - podcast inteligente, engraçadíssimo, em duo - que lhe serviu de inspiração. Hoje, contudo, eu acho que, em matéria de arquivo, o Discofonia já o superou...

* Miscelânea Vanguardiosa - Depois do Discofonia, descobri também o Edgard Costa (que, no meu ponto de vista, se perdeu um pouco, na obrigação de "postar" todos os dias), o 5 a 1 (do Senise que, infelizmente, também parou) e o Maestro Billy (que é bastante profissional, com novidades e tal, mas que não faz muito o meu gênero). Agora, quem ficou mesmo, na minha "lista de assinaturas" (feeds ou iTunes), foi o programa do Ricardo Sá Reston. O Ricardo me apareceu por e-mail, quando viu que eu estava resenhando podcasts. Foi uma indicação que valeu a pena (uma das poucas...!). Ele é do Rio, é músico e fala só de música instrumental brasileira. Tem muito bom gosto (para o meu gosto, claro) e é bem didático. Dá pra sentir que cada episódio do Miscelânea Vanguardiosa é pensado e planejado com muito cuidado - o que eu admiro. O único defeito do Ricardo é falar rápido demais. Parece que ele ama tanto a música que quer deixá-la tocar, logo de uma vez, sem a sua intervenção. Tem feito um trabalho excepcional de divulgação, dos instrumentistas (e de suas bandas), que as rádios quase não fazem mais. O Miscelânea eu "baixo" na hora e não preciso de um momento específico para escutar: é sempre prazeroso.

* Vida Fodona - Como eu indiquei o Vida Fodona, do Alexandre Matias, há pouco, vale repassar meu percurso até este ponto. Ainda do Fred Leal e do Nix, eu pulei para o Risoto (de uma garota simpática mas meio barulhenta pra mim) e para o podcast do projeto Mim (que me interessou mais como conceito mesmo do que como podcast em si). Então dos podcasts do Trama Universitário (fui conhecer a Juliana Nolasco, no ano passado, e "trombei" com o Matias ao vivo), devo ter caído no Trabalho Sujo, que me conduziu, imediatamente, ao Vida Fodona. Os podcasts do TU são longos, elaborados e temáticos sets de DJs profissionais, mas, no meu entender, foi o Matias quem definiu, no Brasil, o formato de podcast de mais de uma hora. Como nenhum outro podcaster, acho, hoje, ele dá o sangue, correndo atrás de músicas novíssimas, ficando até rouco na locução, incluindo porções fartas de sua vida e humanizando a coisa toda sem perder o compromisso com o ouvinte. Não sei como ele consegue manter esse ritmo. Transpira, no Vida Fodona, aquele ar meio camicase de todo grande jornalista - que sacrifica quase tudo (ou tudo) em nome da notícia. Tenho enorme prazer em ouvi-lo semanalmente (ou mais de uma vez por semana); é um daqueles podcasters de quem você se sente amigo... Alguém aí falou em patrocínio?

* Música Discreta - Na linha "podcasts falados" (e pouco "tocados" ou nunca "tocados"), eu conheci, ainda, o do No Mínimo (que é basicamente o Pedro Doria lendo sua coluna da semana), o do Cardoso (que nasceu praticamente morto), o do Insanus (idem) e o do Yuri Vieira (que musicado, ou não, me agradou bastante - ainda que o Yuri seja meio inconstante...). Já no aspecto da teatralização, leva a taça o do Eduardo Fernandes (que, não sei por quê, não saiu dos três números). Logo, resumindo a ópera, quem chegou a um formato, vem desenvolvendo e obtendo algum sucesso - no reino do podcast assim "falado" -, é o Roberto D'Ugo Jr., com seu Música Discreta. Eu acabei de resenhar; então prefiro comparar com os demais (do que falar, de novo, a mesma coisa). Tem, digamos, a imaginação do Yuri Vieira e a seriedade do Pedro Doria. Tem a irreverência do Cardoso e do Insanus, mas tem também o rigor técnico do Eduardo Fernandes. O D'Ugo me disse que realiza aquilo tudo apenas com um microfone da Santa Ifigênia... - o que eu duvido muito. Quer me ajudar no futuro podcast do Digestivo; assim que descobrir o segredo dele, então eu divulgo...!

* Íntima Fracção - No além-mar, o Edgard Costa, que é um brasileiro em Portugal, me conduziu até o Íntima Fracção (cujo nome do podcaster eu nunca guardo; não registro e, pior, não sei agora onde procurar...). É maravilhoso, mas não é um podcast, na verdade - é um programa de rádio de Portugal, que o Edgard "retransmite" de vez em quando, e que eu já encontrei hospedado não sei em que outro site... Eu sei que é chato esse negócio do Íntima Fracção ser meio misterioso (também acho), mas o autor conseguiu uma mistura de lirismo e música que eu não vi em nenhum lugar. Nem no rádio. Num dos programas que tive a oportunidade de encontrar, ele repetia sempre a mesma música - mas era como se, depois de cada locução sua, a música soasse outra (!). Uma viagem total, para usar uma metáfora bem comum quando algo nos parece além da lógica e da razão. Nunca resenhei o Íntima Fracção. Como eu ia indicar uma coisa que nem eu consigo mais encontrar? Mas, aqui, é necessário. Lembra daquela discussão do cinema ser, primordialmente, imagem? Então, aplique esse conceito ao rádio - e imagine, neste instante, uma arte que seja só som. É o Íntima Fracção.

* Night Passage - Esse eu descobri meio junto com o Íntima Fracção, através, também, do Edgard Costa. Já tentei ouvir outros podcasts de jazz, mas não encontrei nenhum melhor, até agora, do que o Night Passage. E olha que eu procurei em inglês - nos Estados Unidos e na Inglaterra. A melhor rádio jazz que já ouvi na vida, aproveitando a deixa, foi em São Francisco - mas, lamentavelmente, ela se mostrou inacessível via internet. Enfim, o podcast do Night Passage "transmite" da Itália - é um sujeito engraçado, simpático e muito gentil, o "Renato from Rome" (que até me agradeceu pela resenha). Não sei como ele se mantém tão atualizado em relação ao jazz, mas gostaria de saber. O único problema do Night Passage é que ele anda muito espaçado ultimamente. Outro problema é que a locução era quase ininteligível no começo (mas, depois que eu reclamei, melhorou). Dá vontade de anotar os artistas e comprar todos os discos. Mas onde? E para pagar uma fortuna (nas lojas de importados)? Se eu tivesse mais paciência com o processo, eu "baixaria"... O Night Passage, na realidade, é uma prova de que o jazz não parou. Algo que o Brasil começa a descobrir com as recentes turnês internacionais de jazzistas ou artistas afins.

* Morning Becomes Eclectic - Esse eu também resenhei há pouco. É a melhor iniciativa, que eu conheço, no sentido de divulgar bandas novas em formato podcast. O Edgard Costa (ele, outra vez) tentava algo nesse sentido, tomando como ponto de partida o Trama Virtual. Mas, no seu caso, penso que ficava a novidade pela novidade (no mesmo sentido do "cover pelo cover" no Coverville) - entrava muita barulheira, muita coisa mal gravada e uma banda ou outra, apenas, que valia realmente a pena. O "Morning", digamos assim, é um programa de rádio de verdade: as bandas vão até o estúdio, dão entrevistas, tocam seus discos ou tocam ao vivo. Parece que o João Marcelo Bôscoli quer fazer algo assim na televisão - mas o perigo é acabar se confundindo, novamente, com as iniciativas da gravadora Trama (nem sempre unânimes...). Claro que nem tudo o que toca no Morning Becomes Eclectic é genial, mas há uma porcentagem razoável de programas acima da média - que você pode ouvir, tranqüilamente, duas ou três vezes... E a qualidade do áudio, para independentes (ou wannabes), é imbatível. A cada programa, ficamos mais convencidos de que a cena continua fervilhando. Ou melhor, sempre esteve - apesar do eterno descaso do mainstream.

* Gillmor Daily - Agora na linha dos podcasts falados "internacionais", o Pai de Todos é o Adam Curry - aquele ex-VJ da MTV americana que ficou famoso por consagrar o termo "podcast" (e também por quase se apropriar dele via Wikipedia...). Mas eu não gosto muito do Curry; apesar do pioneirismo, tem aquele jeito bem afetado de FM - e persegue um certo "gosto médio" que eu, particularmente, abomino. Se é para fazer FM, melhor fazer na FM então... Mas o Adam Curry deu origem ao Gillmor Daily, cujo autor às vezes até entrevista ele (Curry). Na linha "FM chiclete" tem, ainda, o This Week in Tech ou TWiT (os geeks sempre começam tudo antes na internet) e um pouco, mas bem menos, o Venture Voice (que eu acho ótimo - com entrevistas valiosíssimas...). O Steve Gillmor é jornalistão, super comprometido com a informação e com o ouvinte. Posta sempre, e muito, faça chuva ou faça sol. Supera em muito, para completar, o Jason Lopez, "concorrente" seu, que eu descobri, por acaso, antes. Gillmor é 100% autêntico: ri e reclama no ar. Tem sempre opiniões bastante sólidas e conhece profundamente o mercado. Eu não discutiria com ele, como discutem seus amigos, e feríssimas, no Gillmor Gang. Estão lá, por exemplo, o Michael Arrington e o Doc Searls. La crème de la crème da internet. Não dá pra perder o Gillmor Daily (e o Gang...).

* Eduardo Arcos en Dixo.com - Last but not least, um de meus blogueiros favoritos - que é também podcaster agora. O blog é melhor do que o podcast, mas é sempre legal ouvir o Eduardo Arcos - inconformado, como eu, com a lerdeza (ou burrice mesmo) da mídia estabelecida. Só que no México; acompanhando tudo o que acontece nos Estados Unidos. (Melhor do que muitos americanos, aliás.) Arcos e seus colegas eventuais de bancada giram em torno do papel dos blogs na sociedade (isso em podcast). Falaram muito, por exemplo, da atuação da blogosfera nas últimas eleições do México. Pena que os interlocutores do Eduardo nunca estejam à altura dele. Ele é hoje, via blogs, uma das figuras mais proeminentes da internet mundial (sobretudo da hispano-americana). Ou seja: no México, todo mundo está atrás dele. É a locomotiva da internet mexicana; e hispânica. Não, não toca nada de música. Foca em tecnologia, mas vai, devagarzinho, extrapolando para outros assuntos (como todas as iniciativas bem-sucedidas na WWW...). E se você quiser mais música, ouça o podcast da Magnatune, enquanto lê o Eduardo Arcos no ALT 1040.

Julio Daio Borges
São Paulo, 25/8/2006

 

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