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Sexta-feira, 11/7/2008
O Twitter e as minhas escolhas
Ana Elisa Ribeiro

O que é que é?
Tu o quê? Tuíter? Ah, tá, com dábliu e dois tês. Entendi. Mas pra quê serve mesmo? Ué, mas não é um Orkut mais cult? E tem que ser jornalista (ou achar que é) pra caber aí dentro? Um mundinho à parte, tipo um mural de recados. Não, né? Mas isso eu faço por e-mail, desde que o mundo é wide, uai. Eu nunca sei direito o que estou perdendo. Mas é que, atualmente, a gente está sempre perdendo alguma coisa quando escolhe um lado para onde olhar. A despeito do tantão de possibilidades que eu tenho, continuo tendo apenas dois olhos. E o pior não é isso. Minha acuidade visual é dada pelas minhas limitações biológicas (a palavra "limitações" não é bem o termo) e minhas fóveas dão mais foco ainda ao que meus parcos dois olhinhos ex-míopes podem ver. O mesmo acontece com minha pobre capacidade cognitiva. Segundo alguns filmes e livros (que ainda são ficção, fricção, meio masturbatórios, diga-se), ainda nascerão crianças com capacidades alteradas, assim meio homens-máquinas ou super-homens, ainda geneticamente modificados tal como batatinhas Chips, mas ainda não rolou. Estamos engatinhando, meu caro. Você e sua rede mundial que não balança, mas cai de vez em quando.

Marque uma opção, a caneta
Não fiz as contas ainda, mas se fizesse, verificaria que passo muitas e muitas horas do meu dia mexendo na minha caixa de e-mails. A maior parte disso é trabalho. Recebo, entrego, respondo, oriento, organizo, convido, aceito. Outra parte são os amigos que, não fosse o Gmail, já não seriam mais amigos. Neste caso, a distância física é amenizada pelo contato via Gtalk ou via mensagens mesmo. Nem que sejam apenas um "oi". Outra parte do meu tempo eu passo navegando por sites que visito sempre: a instituição onde trabalho, livrarias habituais, novidades da Biblioteca Nacional, acervos, cursos, universidades, o de sempre, garçom. Vez ou outra procuro por um endereço, um nome, um currículo. Nada assim tão desnorteado como querem fazer crer os teóricos da internet como um labirinto infinito. E eu, pô? Não conto? E meus objetivos?

Meu marido passa ainda mais tempo do que eu na rede. Fica on-line por horas a fio, fazendo nunca se sabe direito o quê. Não pensem bobagem. Vejo que não rola MSN e nem gracinhas no Orkut, embora eu até fiscalize de vez em quando (afinal, nós dois nos conhecemos pela internet e eu sei que de virtual isso não tem nada).

Meu marido, jornalista de carteirinha, difusor da idéia de que "o jornalismo morreu!", passa (ou gasta ou perde, não sei ao certo) mais tempo on-line do que eu não porque tenha mais o que fazer lá, mas porque tem mais contas disto e daquilo.

Mantenho, atualmente, além das contas bancárias herdadas dos tempos em que cada faculdade onde eu lecionava me obrigava a ser cliente de um banco, duas contas de e-mail no Gmail (freqüentemente usadas), uma conta no Hotmail (antigona), o acesso ao setup do Digestivo Cultural (desde 2003), além de contas em livrarias, provedor de internet, jornais de acesso não-pago, bancos de textos acadêmicos e três contas em sistemas que administram a vida escolar de alunos de três instituições de ensino. Já não basta? Todos eles têm logins e senhas. Todos eles gastam meu tempo.

Tive conta no Blig (em 2002, no extinto e divertidíssimo O Corvo), conta na agência Carta Maior, conta no Blogger (quando era gratuito, na atualmente improdutiva Estante de Livros), conta no Orkut (que não agüentei nem por um mês) e uma conta recém-aberta e recém-abandonada no WordPress. Twitter para quê? Pode haver alguma discussão muito inteligente lá e eu estou perdendo. Pode haver uma rede maravilhosa de contatos ali e eu estou perdendo. Por ser um jeito inovador de estabelecer relacionamentos e eu, de novo, estou perdendo. Mas o que é que eu não estou perdendo neste mundo de sensações paramnésicas? É isso aí, bro. Preciso escolher. Não dá tempo de trabalhar 10h por dia, corrigir 300 redações por semana, ler e estudar por algumas horas diárias, tratar com pessoas de verdade e ainda ter todas essas contas ativas. A não ser que eu trabalhe o tempo todo aqui, o que não é o caso. O meu caso.

Então vamos fazer assim: você aproveita tudo o que o Tuíter pode oferecer e depois me conta. Não consigo mais ser blogueira, snif, porque virei mãe de família e alguém precisa dar jeito na bagunça desta sala. É ou não é? Não consigo mais ser blogueira porque eu tinha de escrever todos os dias um textinho, um negocinho qualquer, pra não deixar morrer o clima entre nós, eu e o leitor. Mas aí eu vi que ficava difícil cumprir a tarefa. Cumprir bem, então... começou a ficar impossível. Daí deixei o blog à francesa. Remendo sem costura. E ninguém notou. Não consigo me adaptar ao Orkut, que caso sério! Não me adapto mesmo. Aquelas mãozinhas, aqueles recadinhos, aqueles avisos. Meu Deus, o que vou fazer da minha vida? E agora? Graças a Deus (ele mesmo) existe o e-mail. Este, sim, o sistema bacana que resolve, de fato, muitas coisas da minha vida.

Eu entendi sim, sô. Não sou burra. Não muito. Entendi que a lógica colaborativa é bacana demais. Que as pessoas distribuem informação, se ajudam. Meu marido recebe pencas de dicas de concurso, persegue casos da imprensa. A moda agora é a richinha do Pedro Doria com aquela história de propaganda política. Não é isso? Pois é. Não ligo a mínima, cara. Será que tenho algum problema?

Bom demais querer saber uma informação e jogar a pergunta na rede. Pescar um peixão em dois minutos. Às vezes menos. Outro dia fiz isso por e-mail. Precisava de alguém que soubesse muito espanhol. Estava lá o candidato em algumas horas. Mais de um, até. Bom demais. Melhor do que sair pedindo indicação por aí. Mesmo assim, fico pensando se não estou com algum grave problema. Nem sou velha nem nada, para dizerem que tenho resistência. Olha, tive blog muito antes de muita gente. O negócio é falta de tempo mesmo. E a certeza de que "você está perdendo" é default na vida da gente. O que é que estou ganhando quando faço minhas escolhas?

Ana Elisa Ribeiro
Belo Horizonte, 11/7/2008

 

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