|
Quinta-feira, 8/1/2009 Balanço geral de 2008 Débora Costa e Silva Fazer um balanço geral de um ano parece simples, de tão comum. Chega no final de dezembro e a listinha de promessas para o ano seguinte já começa a ser esboçada: o que jamais poderá se repetir em 2009? Quais novidades do ano que passou eu quero "levar na bagagem"? O que tentei melhorar e ainda não deu certo? Quais foram as boas surpresas? O que rendeu frutos interessantes para o ano novo? O cenário das reflexões já é antigo conhecido: sinos dourados na porta, toalha vermelha com bordados verdes na mesa, forrada com travessas de tender, salada de maionese, peru, uvas, nozes e panetone. Bom, mesmo que sua festa de fim de ano não seja lá tão tradicional, acredito que a retrospectiva do ano que passou é fatal para qualquer um. Seja ela registrada apenas na cabeça, em listinha, na agenda, ou compartilhada com amigos, familiares e internautas (como é o caso), fica difícil escapar, já que o mundo (ou a mídia) conspira para este movimento de revival: dá-lhe musiquinha da Globo, propagandas com imagens de uma família perfeita saboreando um suculento chester e os e-mails (ah, os e-mails!) com mensagens propagando paz e harmonia em uma apresentação de Power Point. Alguns acreditam que este clima mágico que surge no Natal e dura até o réveillon é a manifestação da hipocrisia de uma sociedade capitalista e... (Ok, definitivamente o papinho marxista me cansou em 2008!) Bom, minha teoria é de que o fim do ano é a brecha que temos em um período de 365 dias em que podemos manifestar sem culpa tudo aquilo que vamos arquivando ao longo do ano e não falamos, porque "é ser sentimental demais" e sei lá porquê isso não cai muito bem no dia a dia. De qualquer forma, tanto faz, prefiro curtir o tal clima, sendo ele imposto por "eles" ou não e aproveitar que as pessoas ficam mais próximas, amorosas, calorosas e positivas. Ao fazer o meu balanço geral de 2008, não me escapam alguns filmes, shows, livros e acontecimentos culturais marcantes. Assim como o contrário também funciona: não consigo escrever para o Especial Melhores de 2008 do Digestivo Cultural sem pensar nas passagens mais pessoais e talvez menos culturais que envolvem cada fato. Inclusive, este ano (o primeiro como colunista), acabei escrevendo mais textos no estilo crônica do que resenhas. Não se foi uma fase ou um caminho que fui trilhando. Se é bom ou não, também ainda não sei ao certo, só sinto informá-los que, para o bem ou para o mal, esta é mais uma coluna-crônica. Não conseguiria fazer diferente justo agora, que a ocasião pede pitacos e avaliações pessoais. Bom, aí vai meu top 10 de 2008, misturando eventos com filmes, livros, shows e álbuns, além de referências contemporâneas ao lado de outras mais antigas também (afinal, nunca é tarde para conhecer alguns clássicos): Curso de criação literária na AIC Este ano prometia ser difícil desde o começo: fim da faculdade, do namoro e o desemprego (que eu já escrevi sobre, aqui). Um freela ali, outro aqui e nada. Estava totalmente sem perspectivas, até que, graças ao Julio e ao Digestivo, surgiu a oportunidade de fazer o curso de criação literária da Academia Internacional de Cinema (AIC). Não sabia o que esperar, então imaginava que iria ocupar meu tempo com aulas interessantes, com conteúdo inteiramente novo e instigante e conhecer pessoas bacanas. No final, acabei lendo com mais freqüência, conhecendo novos autores e, de quebra, dei um upgrade nos meus textos, viciados no padrão jornalístico. Tive oficinas com Márcia Tiburi, Marcelino Freire, Rodrigo Petrônio, Michel Laub, Marcelo Rezende, entre outros. A convivência com os outros alunos foi intensa, o que me proporcionou diversas amizades, com direito a contos escritos no boteco e saraus com temas, digamos, exóticos (como "Prato do dia" e "Ar-condicionado"). Não me descobri nenhuma poetisa, nem romancista ou algo do tipo, mas todas as referências literárias, dicas, conselhos e correções feitas nos textos, tanto nos meus quanto nos dos colegas, mudaram minha forma de escrever e, principalmente, de ler. Recomendo a todos que gostam de escrever, seja prosa ou poesia, que embarquem neste curso. Os professores incentivam os alunos a escreverem com exercícios bem focados e específicos e a carga horária, à primeira vista intensa, me parece ideal para o mergulho que será feito em cima das próprias histórias e criações ao longo do ano. Bruno Miranda/NaLata 2ª Semana da Canção Em 2007, compareci à 1ª edição do evento e já havia prometido a mim mesma que voltaria. Se não fosse para cobrir, seria como turista, mas já estava mais que decidido. No final das contas, acabou sendo melhor do que eu esperava: a organização do evento me chamou para escrever para o blog da Semana da Canção sobre os shows, festival, oficinas e palestras que são realizados ao longo da Semana da Canção, em São Luiz do Paraitinga. Sob a curadoria da cantora e idealizadora Suzana Salles, o evento está se consolidando por abordar e trabalhar três aspectos da música: difusão (com shows e oficinas cantadas), formação (oficinas e palestras) e fomento (festival de composição). Neste ano, algumas oficinas e palestrantes foram mantidos, mas muita coisa foi reestruturada e inserida. O Festival, por exemplo, deu aos participantes a possibilidade de serem analisados pelo conjunto da obra. Diferente do primeiro ano, em que cada músico concorreu com apenas uma composição, na 2ª Semana da Canção os compositores tinham espaço para apresentar até cinco músicas diferentes. Os vencedores deste ano foram Fábio Barros, Andréia Dias e Zé Modesto. Na esfera educacional, a novidade ficou por conta das oficinas voltadas para os educadores da cidade, que puderam aprimorar seus conhecimentos musicais para investir na formação artística das crianças da região. Quanto aos shows, destaco as atrações vindas do Nordeste, que incendiaram o público luizense, já acostumado com o ritmo pulsante do Carnaval. As melhores apresentações foram do Siba e sua Fuloresta, Lenine, Tom Zé e Moraes Moreira e Antonio Nóbrega. Adele ― 19 Depois de mergulhar no Back to Black, deu preguiça de escutar outras cantoras que seguiam a linha da Amy Winehouse, pelo menos no que diz respeito à sua música (as que seguem os escândalos, então, é melhor nem lembrar). Mas de tanto um amigo insistir, baixei o álbum 19, da cantora britânica Adele e viciei. Suas canções são mais pop e menos retrô do que as da Amy, mas a melodia das canções mostram a influência do soul e deixam à mostra também uma certa melancolia. A voz, não menos potente do que a da garota-rehab, é suave e passeia tranquilamente entre notas bem agudas, como em "Daydreamer" e "Crazy for you", mas também alcança graves confortavelmente em "Hometown Glory" e "Melt my heart to stone". Os arranjos variam bem, tendo canções apresentadas apenas com voz e violão (ou piano), outras com batidas eletrônicas com pegada mais dançante, ora mais pop, ora mais puxado para o soul. Ná Ozzetti ― Balangandãs Já escrevi sobre esse espetáculo aqui no Digestivo. Depois de escrever a resenha, vi o mesmo show mais três vezes (uma delas lá em São Luiz do Paraitinga, na 2ª Semana da Canção) e não vejo a hora de registrarem logo em CD ou DVD para poder ouvir o disco até riscar. Nas outras apresentações que vi, a sofisticação dos arranjos, do canto de Ná e dos instrumentistas era a mesma; o que mudou foi a dancinha feita pelos músicos ao final das apresentações, cada vez mais descontraídas, deixando o clima mais caloroso. Nada mais propício para um espetáculo que homenageia Carmen Miranda, a cantora mais tropical que tivemos até então. É bom ver que a vontade de cantar "Tico-tico no fubá", "Boneca de piche" e "Tahi", e dançar com as mãozinhas em círculos como a "baiana" fazia não é apenas do público. Mônica Salmaso ― Noites de gala, samba na rua Outro show incrível que assisti no Teatro Fecap foi de outra cantora, também magistral, que é a Mônica Salmaso. Meus ouvidos resistiram muito ao seu tom mais grave e à dramaticidade de sua interpretação, mas resolvi assisti-la porque identificava em algumas gravações uma delicadeza nos arranjos do grupo Pau-Brasil e um balanço sutil em seu vocal que me animaram. Bom, depois do show, virei fã. O repertório, muito bem selecionado, contém composições de Chico Buarque, gravadas no álbum homônimo. Assisti a um dos últimos espetáculos da turnê nacional, que já dura mais de um ano, cujo registro acabou de ser lançado em DVD. Percebe-se a ginga da cantora em "A volta do malandro", "Partido Alto", "Logo eu" e "Quem te viu, quem te vê", quando se mostra mais descontraída tocando tamborim. Aliás, a sutileza ao cantar se confunde facilmente com timidez, mas Mônica não tem nada de tímida. Pelo contrário, conversa bastante com o público ao longo do show, faz piadas e se mostra totalmente a vontade com os músicos e a platéia. Ficam lindas também as versões de "Morena dos olhos d'água", "Suburbano Coração" e a clássica "Beatriz". Foi uma descoberta e tanto, que me fez fugir um pouco do repertório óbvio de Chico Buarque e também do gosto usual por cantoras de timbres mais agudos. Curumin ― Achados e Perdidos + Japan Pop Show A primeira impressão que tive não foi legal. "Esse cara é um Jorge Ben moderninho", pensei. De fato, a sexta faixa do primeiro álbum, Achados e Perdidos, "Acorda, Simpático", para mim, continua sendo isso. Mas depois insisti em conhecer e achei o som do cantor, compositor e multi-instrumentista paulistano (ele toca, entre outras coisas, bateria e cavaquinho) muito bom. O grande lance do Curumin é que ele consegue misturar estilos e gêneros de uma maneira interessante, fazendo com que o resultado fique harmonioso e não pareça um "frankenstein", como parecem as músicas de centenas de artistas metidos a moderninhos e vanguardistas. Tanto o primeiro CD quanto o Japan Pop Show têm em suas composições uma pegada forte de black music, mescladas também com samba e soul, fazendo um som bem dançante e com um balanço próprio. Gabriel García Márquez ― O amor nos tempos do cólera Será que ainda tem o que falar sobre este livro e este autor? Creio que já se esgotaram todas as críticas, observações, ressalvas e elogios. O que posso dizer sobre ele não vai fazer muita diferença para quem já leu, mas, bom, pode fazer alguém querer ler, certo? Então vamos em frente. Demorei seis meses para engrenar a leitura, o primeiro capítulo me pareceu descritivo demais, tornando-o cansativo. Ao final deste primeiro capítulo, a história me envolveu e a leitura seguiu mais fácil. Diria ainda que a história é linda e atire a primeira pedra quem nunca leu um livro de amor e não ficou suspirando que nem bobo por uma semana inteira? Marcelino Freire ― Contos Negreiros Apesar de o livro ter sido lançado no início dos anos 00 e ter sido premiado com o Jabuti em 2006 na categoria Melhor Livro de Contos, ainda estou atrasada para comentar sobre esta obra de Marcelino Freire. Fui conhecer seus contos apenas este ano e graças ao curso da AIC que já citei ali em cima, onde o pernambucano foi meu professor. Além de ter me apaixonado pelo estilo da escrita, bem próximo ao da fala, obedecendo mais a oralidade, o universo que o autor retrata nos textos me interessa muito, tanto pela questão cultural quanto social. A forma com que ele conta as histórias já revela um talento em se "vestir com a pele dos outros", ou seja, a de ser um ficcionista. Ao ler os contos em voz alta, Marcelino dá ainda mais brilho às suas narrativas e fica difícil lê-los novamente sem lembrar da interpretação do próprio autor. Samir Mesquita ― Dois Palitos Depois de conhecer os Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século, organizado pelo próprio Marcelino, me pareceu mais fácil trombar com outros autores que também faziam micronarrativas. O que mais me chamou a atenção foi o curitibano Samir Mesquita, que publicou este ano a coletânea Dois Palitos, que reúne 50 microcontos, cada um com até 50 caracteres. O grande barato do livro é que ele, assim como o conteúdo, é micro: vem dentro de uma caixinha de fósforos. Por isso, não estranhe nas livrarias quando se deparar com essas caixinhas espalhadas pelas estantes: aproveite e gaste pouquíssimo tempo (e dinheiro) para apreciar o livreto, que é super divertido. Queime depois de ler Não me sinto muito à vontade para falar de cinema no Digestivo porque estou longe de ser cinéfila e gente que entende de cinema por aqui não falta. Comecei a correr atrás do prejuízo de uns anos para cá e ainda têm muitos filmes clássicos na minha lista. No entanto, não poderia deixar de comentar sobre o novo filme dos irmãos Ethan e Joel Coen. Fui assistir sem ter lido uma resenha ou sinopse qualquer e não sabia que se tratava de uma comédia. Então, estranhei os momentos em que tive vontade de rir, até que me deixei envolver pela imagem de um Brad Pitt de topete, afeminado, mascando incessantemente um chiclete a ponto de irritar o espectador. A história de um agente da CIA que é afastado do cargo se mistura com a de uma mulher que tem como objetivo fazer uma lipoaspiração no corpo, que se envolve com um homem casado e por aí vai o roteiro, muito bem costurado, passando para quem assiste essa sensação confusa e ridícula. Ao sair da sala de cinema, minha amiga ouviu um cara dizer: "esse filme não me acrescentou nada". Bom, nem sempre os melhores filmes são aqueles que passam uma moral da história. Este é para divertir, sem mais filosofias e ponto final. Quem quiser viajar na maionese, que viaje e crie teorias e mais teorias sobre o assunto, mas juro que é muito mais gostoso ver um filme assim, despretensiosamente. Débora Costa e Silva |
|
|