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Quinta-feira, 12/2/2009 USP: 75 anos de histórias várias Elisa Andrade Buzzo foto: Escobar Quando tentei entrar no departamento, fui barrada, vai onde? Boa pergunta, quase respondi. Vinha matar as saudades, não sei ao certo, rever as salas de aula, os murais, as carteiras e aquele clima intacto de década de 1970. Minhas asas foram cortadas em pleno voo e o segurança nem ligava, ordens eram ordens e não havia espaço para piedade com uma ex-aluna. Dá até pra entender essas medidas de segurança, há loucos soltos pela Universidade de São Paulo, você às vezes topa com eles na Praça do Relógio, no Bandejão Central, e não há como fugir. Melhor impedi-los de entrar. Ainda assim, a USP é generosa, pois mesmo quando te fecha uma porta, ela te abre outras janelas, te apresenta pessoas que vão mudar radicalmente sua vida. Lembra da escadaria da FFLCH? Dos bancos da Matemática? Do Mickey na Física ou do Cinusp? Sempre há recantos de amor e estudos marcados em cada um que passa por uma cidade universitária. Velhas histórias às vezes tão atuais. Ou banais. O dó é não poder mais comer no bandejão. Mas tem, logo ao lado, o Super Hot Dog, o melhor cachorro-quente de São Paulo. Portas e janelas disponíveis. São anos de convivência, e descubro que ainda há muito para se conhecer na Cidade Universitária Armando de Oliveira Salles neste seu aniversário de 75 anos. Fiquei empolgada quando soube que haveria uma exposição de fotografias da época de sua construção. Corri para o Memorial da América Latina, já que a mostra tinha duração de uma semana (de 26 de janeiro a 1º de fevereiro). USP em obras: a construção da Cidade Universitária, organizada por Maria Arminda do Nascimento Arruda, Lilia Moritz Schwarcz e Plínio Martins Filho, contava com 60 fotos, dentre elas 43 inéditas tiradas por um desconhecido funcionário que acompanhou as obras na década de 60. E foi emocionante como ver o desenvolvimento da nossa própria cidade-mãe, a terraplanagem, a abertura das ruas, a colocação das guias, dos postes de iluminação pública e muita, muita terra transbordando pra dar espaço aos esqueletos dos prédios daquela minicidade em pleno nascimento. O clima de canteiro de obras das fotos é levado às últimas consequências na organização da exposição, com as reproduções expostas dentro de tapumes em madeira compensada e decoração de sacos de areia. Mas não se deixe impressionar pela cenografia, as fotos é que trazem lembranças de uma imensa construção, que até hoje acontece. Basta fazer um passeio pelo campus. O prédio da Reitoria (hoje Antiga Reitoria) parece ter tido dias de glória em sua brancura, impávido. "Entrei na Cidade Universitária, um terrenão vazio, mal iluminado, pouquíssimas ruas de terra, lamacentas em dias de chuva. Lá longe, um predião branco, a reitoria, que ficava maior no imenso vazio, onde eram dadas as aulas de geografia. Seja o que Deus quiser, pensei", diz em texto da mostra José de Souza Martins, professor emérito da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). Pra quem ficou com vontade de ver um pouco do passado da USP em movimento, e não teve a chance do professor, tem um filme do diretor Walter Hugo Khouri, As Amorosas (1968), com algumas cenas rodadas por lá. Isso porque o ator Paulo José protagoniza um universitário, um dos eternos instisfeitos Marcelos de Khouri. Aos poucos o visitante pode reconhecer nas fotos outros prédios famosos, como o da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), da ECA (Escola de Comunicações e Artes) ou da FEA (Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis). Há imagens impressionantes, como aquela na qual emerge de um clarão inóspito uma silhueta negra. Aos poucos ela se delineia em formato de homem: um corredor na pista de atletismo do CEPEUSP (Centro de Práticas Esportivas da USP). E mesmo uma fotografia nos remete ao romantismo na Paris da década de 50 retratada por Robert Doisneau ― só que desta vez um casal de beija em frente à FFLCH, diversos fusquinhas estão estacionados e a luminosidade dos postes estoura no grande céu noturno. Numa esquina qualquer vê-se as famosas lajotas de concreto, sim, são aquelas mesmas que delimitam até hoje os caminhos de pedestres. Pois é, nem tudo está tão diferente assim, décadas depois. O início, tanto da exposição quanto da Cidade Universitária, é um mapa da Fazenda Butantan. Interessante reconhecer na topografia da região a parte mais baixa, formada por brejos, contornada pelo Rio Pinheiros. O passado mais remoto desta área também se inscreve na história da cidade de São Paulo, que ainda nos séculos XIX e XX era repleta de sítios em locais onde hoje esquecemos que pudesse haver uma zona rural. É o caso do bairro do Butantã, onde está o campus. "Terra dura" ou "lugar de vento forte" é a origem em tupi-guarani do nome desta região que consistia em uma sesmaria, obtida em 1697 por Afonso Sardinha. Lá fora instalado o primeiro engenho de açúcar da Vila de São Paulo de Piratininga. Será na área mais alta da futura Fazenda Butantan a inauguração, em 1901, do que seria o Instituto Serumtherapico, anos depois Instituto Butantan (1925). Nesta história a USP só vai entrar no ano de 1941, quando as terras restantes da fazenda são doadas para a construção da Cidade Universitária. Pois ver o que era ermo é uma experiência sem igual. A vastidão das ruas à espera do fluxo de alunos e de carros encontra os seus, os meus e os passos de tantos outros que formaram trilhas nos gramados uspianos, em busca de um caminho mais otimizado... Assim espero que a exposição percorra a própria universidade e possa rodar por outros campi, pois é necessário trazer à tona este testemunho recoberto por concreto, madeira, barro. Elisa Andrade Buzzo |
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