|
Quarta-feira, 15/4/2009 Como os jornais vão se salvar Luiz Rebinski Junior Um dos argumentos de quem defende a internet como o novo messias da comunicação é de que os blogs não precisam ser, necessariamente, jornalísticos, nem fazer jornalismo da maneira que conhecemos desde sempre. E é a mais pura verdade. Realmente, um blog não precisa ser jornalístico, pelo contrário, pode ser o que bem entender, falar sobre qualquer assunto da maneira que achar melhor, desdenhando ou aderindo aos dogmas do bom jornalismo. Esse tipo de argumento é apenas uma forma de desfigurar o debate e levar a discussão de maneira enviesada. A grande discussão não é sobre o que é a internet, mas sim sobre o que ela pode ou não vir a ser em termos de comunicação de massa. Sendo mais claro, o que se discute é se a internet poderá ou não ser capaz de substituir a mídia impressa, principalmente os jornais diários. Ninguém está preocupado com os blogs que se dedicam às amenidades do dia a dia ou àqueles que publicam receitas de bolo. O que preocupa é saber quem ― e de que forma ― substituirá o velho jornalismo impresso (se ele se for, é claro). Afinal de contas, a crise dos jornais não é nem uma novidade, está aí muito antes dos irmãos Lehman causarem caos na economia mundial. Da hipoteca da sede do New York Times ao fechamento de redações centenárias, o jornalismo diário impresso dos Estados Unidos, talvez o melhor do mundo e aquele que nos serve de base, parece ruir aos poucos, sem saber para onde ir. Mas o problema é que o sistema está ruindo sem deixar herdeiros. É como se um mestre estivesse morrendo e seus seguidores não tivessem aprendido seus ensinamentos. O jornal impresso pode até estar morrendo, mas e depois? Das duas, uma: ou haverá uma revolução muito grande na forma de se produzir conteúdo noticioso, o que implica em pensar o jornalismo de forma diferente (com atores igualmente diferentes); ou simplesmente veremos os mesmos meios de comunicação, que hoje utilizam o papel, apenas migrar para a Web. Esse cenário, mais provável, simplesmente substituirá a plataforma em que os grandes jornais e empresas de comunicação exercem o seu domínio e influência. É pouco provável que o New York Times, caso encerre suas atividades impressas, não continue sendo igualmente influente na internet. E se isso acontecer, certamente a internet não significará uma ruptura com o sistema atual, apenas uma nova maneira de os meios de comunicação se moldarem conforme as novas exigências do mercado. Ou seja, o Times continuará sendo o influente Times, o Journal seguirá sendo o paladino da opinião conservadora americana e o Financial Times uma fonte confiável sobre economia. Isso sem falar, é claro, em outros mercados, como o japonês. Só o Asahi Shimbun, o mais influente jornal japonês e segundo em tiragem no país, vende em uma única edição diária mais do que a soma de todos os jornais brasileiros juntos. Com 12 milhões de exemplares diários (em duas edições, uma matutina e outra vespertina), o Asahi só perde, em tiragem, para o concorrente Yomiuri Shimbun, que imprime 2 milhões a mais de exemplares por dia. Com esses números, pelo menos no Japão, parece uma heresia falar em morte dos jornais. Mesmo sendo o mercado japonês uma exceção à regra. Esses números podem ser conferidos no excelente Os melhores jornais do mundo, livro em que Matías Molina mostra como os grandes jornais têm se moldado diante das transformações culturais e tecnológicas das últimas décadas. E a credibilidade dos grandes jornais, que o livro de Molina endossa com todas as letras, talvez seja o mais valioso bem que lhes sobre quando ― e se ― a imprensa de papel morrer. É até meio ilógico pensar que uma redação qualificada, com mais de mil jornalistas, como a do New York Times, seja pulverizada por blogueiros que, ainda hoje, só sabem sugar conteúdo das grandes redes de comunicação. O que não se pode esquecer é que sempre haverá público para o jornalismo de qualidade. E não se tem certeza de que o público leitor, cada vez mais exigente, vai aceitar receber, ainda que gratuitamente, um produto inferior àquele que está acostumado. Portanto, mesmo que as redações estejam cada vez menores e mais enxutas, terá que haver alguém que separe o joio do trigo, que vá atrás da notícia, que apure, perca tempo investigando, e traga um resumo ao leitor exatamente como há 100 ou 200 anos. E, ao que tudo indica, pelo menos por aqui, não serão blogueiros descompromissados que vão assumir essa tarefa. Por mais que pareça tacanha e atrasada, a noção de credibilidade ainda paira fortemente na opinião pública. O chavão "deu no New York Times" não é só apenas um exemplo de nosso provincianismo, mas também uma demonstração ― merecida ou não ― de credibilidade da imprensa junto ao público. É o que encoraja o publisher do NYT, Arthur Sulzberger Junior, a dizer que o Times é único e pode ser distribuído por qualquer meio disponível, papel, televisão, telefone, digital ou a tela de um computador. O resumo da ópera, portanto, é bem claro: por mais que a internet ganhe espaço em detrimento dos jornais impressos, o jornalismo, principalmente o bom jornalismo, não vai acabar. A notícia continuará sendo um produto valioso e que gera interesse. E se a notícia vai continuar sendo um produto rentável, haverá quem a produza e, como em qualquer ramo comercial, quem o fizer da melhor maneira se sobressairá. Quem era relevante no papel vai continuar sendo relevante na Web ou em qualquer outra plataforma. Então, é pouco lógico imaginar que as empresas de comunicação vão acabar e que em seus lugares veremos blogueiros independentes com alto poder de empreendedorismo. Até porque há outro detalhe importante: notícia de qualidade custa dinheiro e não é feita com a bunda na cadeira. A internet pode fazer com que falte papel para embrulhar peixe na feira, mas dificilmente fará com que as pessoas deixem de ser fiéis aos meios de comunicação que conhecem e que, por hábito ou ideologia, acompanham desde sempre. E isso provavelmente vai salvar a grande mídia. Luiz Rebinski Junior |
|
|