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Sexta-feira, 5/2/2010 Não é assim um smartphone Marta Barcellos Quando comprei meu primeiro smartphone, há quase três anos, não tinha grandes expectativas. Queria apenas aproveitar uma promoção da minha operadora, que entrava atrasada neste nicho, então voltado para executivos (isso foi antes do iPhone), e oferecia um plano atrativo, com internet ilimitada. Que surpresa. Nas primeiras semanas, mal podia acreditar que eu passara a levar um pequeno computador na bolsa. Com e-mail e consultas ao Google. Deslumbrada, fazia demonstrações para os amigos, que tendiam a desprezar um celular tão grande. O máximo, na "época" (três anos atrás!), eram os celulares mínimos, que cabiam na palma da mão. Longe de mim querer me insinuar como uma dessas pessoas que antecipa tendências tecnológicas. Muito pelo contrário. Especialmente no caso de telefone celular, nunca fui chegada, sempre achei invasivo ― o que de certa forma pode explicar o meu encantamento pelo silencioso smartphone. Demorava a trocar de celular e lembro de achar uma bobagem as primeiras câmeras acopladas, que encareciam horrores os modelos novos. Numa reunião de pauta, quando eu ainda trabalhava em jornal diário, lembro de ter discordado com veemência da chefe da sucursal, que previu todos os celulares com câmeras. "Imagina", eu disse. "Ninguém vai deixar de levar uma boa máquina fotográfica digital para as férias ou para uma festa." E não é que, com a câmera ali no celular, tudo virou festa? Foi com o entusiasmo do smartphone, e não com a indiferença inicial aos celulares, que decidi adquirir um netbook, há nove meses. Quando o aparelho chegou ao preço e ao peso (um quilo) que eu considerava ideais, corri para comprar. Imaginei que seria a minha independência completa do escritório: além do acesso à internet, como no smartphone, eu teria um teclado para escrever e uma tela maior para navegar. No meu mundo ideal, haveria redes wireless gratuitas para conectar a internet em todo lugar. O depoimento de um conhecido dava conta de sinal abundante em cidades europeias ― era só sentar no café mais simpático e se plugar. Como o shopping center mais perto da minha casa, o Shopping Leblon, tinha rede wi-fi em toda parte, imaginei que os outros também fossem assim. Na minha primeira viagem bate-volta para São Paulo, com o netbook a tiracolo, o meu sonho de liberdade começou a ruir. Lembro de ter percorrido o Shopping Villa-Lobos mendigando uma internet gratuita, quem sabe numa lanchonete. Os seguranças me davam informações desencontradas sobre onde eu conseguiria me conectar, até que me vi na situação de "filar" o sinal do restaurante Viena, sentada em um banco de fora, graças à senha soprada pela recepcionista da casa. No shopping Morumbi, semanas depois, não foi muito diferente. Ainda no meu mundo idealizado, um quilo de netbook não pesaria na bolsa. Mais uma vez, não era bem assim. Costumo caminhar muito pelo Rio (pelo menos dois dias na semana vou ao trabalho a pé) e como convivo com dores lombares, minha bolsa não é um exemplar típico do gênero feminino: graças a faxinas constantes, só carrego o estritamente necessário. Como o "necessário" pesava um quilo, passei a questionar a sua real utilidade. Sem falar no peso extra da fonte de alimentação (quantos gramas?), essencial para garantir que a bateria não morresse pelo caminho. Quando dei por mim, estava comparando o peso e o volume de um netbook aos de... um livro! Ora, quantas vezes a bolsa não tinha pesado por causa de um livro grosso que não tive oportunidade de ler? Depois do smartphone, no entanto, as leituras rápidas, para me distrair numa fila ou sala de espera, ficaram resolvidas. É nessa hora, por exemplo, que coloco em dia as colunas do Digestivo, feliz de poder dispensar as revistas gordurosas com celebridades retocadas. Foi em meio a essa experiência repleta de emoções (onde está a rede wireless? Minhas costas doem! Eu amo meu smartphone...) que a discussão sobre o Kindle, recém-chegado ao país, começou a pegar fogo. Tinha colocado-o na minha lista de desejos, logo que soube da novidade, empolgada com a ideia de ter mil livros em dispositivo levinho. De repente, porém, passei a desconfiar de sua praticidade. Para que carregar outro aparelho na bolsa sem internet? Se for para ler em casa, melhor continuar com os livros, pelo menos enquanto forem mais baratos do que comprar um e-reader. O netbook (ótimo para usar dentro de casa ou em viagens longas, depois de checar como é a internet no hotel) me mostrou que, nessas alturas, não dá para pensar em leitura digital sem garantia de conexão à internet, rápida e sem limitações. Afinal, há três anos eu disponho de um aparelhinho ultraportátil no qual consigo ler o que quiser, e até escrever um pouco. Mas, se não é o Kindle nem o netbook, qual será o novo sonho de consumo de quem gosta de ler, escrever, navegar e não ficar preso ao escritório? As reportagens especializadas me dizem que pode ser o tablet da Apple, ou que vão surgir opções de smartbook (o que será isso?). E lá vou eu tentar me manter informada sobre as novidades tecnológicas. Logo eu, que odiava celular. Nota do Editor Marta Barcellos mantém o blog Espuminha de leite. Marta Barcellos |
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