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Segunda-feira, 1/2/2010 Teoria dos jogos Gian Danton Criada no rastro da revolução científica que foi o surgimento da cibernética, a Teoria dos Jogos é um interessante recurso científico para a solução de conflitos. Criada por John von Neumann e depois desenvolvida pelo Prêmio Nobel John Nash (cuja vida foi retratada no filme Uma mente brilhante), essa teoria parte do princípio de que estamos, constantemente, jogando, seja na empresa, no casamento, ou na relação com os amigos. Existem dois tipos de jogos: os de soma zero e os de soma dois. Nos jogos de soma zero, se uma parte ganha, a outra, obrigatoriamente, perde (-1+1= 0). Nos jogos de soma 2, os ganhos de uma parte revertem em ganhos também para a outra parte envolvida na contenda (1+1=2). Aparentemente, todos os jogos são do tipo soma zero. Em um jogo de xadrez, todo mundo joga para ganhar, o que significará a derrota de seu adversário. Em uma guerra, os países lutam para ganhar e, portanto, derrotar seus adversários. Assim, para a maioria dos pensadores antigos, a melhor estratégia em um jogo é procurar ter o maior ganho individual. As situações de jogo ganharam uma metáfora do famoso paradoxo do prisioneiro. Nesse dilema, dois bandidos são presos e colocados em celas separadas. Os policiais, então, fazem a mesma proposta para cada um deles: 1 ― Se os dois ficarem quietos e não denunciarem seu companheiro, os dois serão libertados (nessa situação, os dois cooperam entre si). 2 ― Se um deles denunciar o outro, mas o outro não o denunciar, o que denunciou ficará livre, enquanto o outro pegará um ano de detenção. 3 ― Se os dois denunciarem um ao outro, ambos ficarão presos, juntos, por seis meses. Na primeira situação, os dois cooperam entre si. Na segunda situação, um coopera e o outro não. Finalmente, na terceira situação, nenhum dos dois coopera. Detalhe: os bandidos estão em celas diferentes e um não sabe o que o outro fez. O que você faria em uma situação como essa? De todas as possibilidades, a segunda é sem dúvida a pior. Se eu coopero e o outro não, eu fico com todo o prejuízo e ele com todo o lucro. A terceira opção também não é das melhores. Nesse caso, os dois não cooperam e dividem o prejuízo. Além do que, os dois na mesma cela, sabendo que um traiu o outro, pode levar a algumas noites de sono. A melhor opção seria, claro, os dois cooperarem. Mas é um jogo arriscado, pois se eu cooperar, o outro pode não cooperar e, como já vimos, essa é a pior solução. A lógica nos diz que a melhor resposta seria não cooperar, ou seja, trair. Mas John Nash demonstrou que isso é válido apenas para jogos com uma única partida. Nos jogos com várias partidas, a melhor estratégia é começar cooperando e fazer depois o que o outro fez na partida anterior. Se ele cooperou, continuamos cooperando. Se ele traiu, nós o punimos traindo também. As estatísticas demonstram que essa é a estratégia que garante melhores resultados. Na vida cotidiana, a maioria dos jogos é de várias partidas. As relações entre patrões e empregados, marido e mulher, colegas de classe, amigos, são sempre jogos de várias partidas. O que a teoria dos jogos diz é se deve começar cooperando. Deve-se iniciar com boa vontade, confiando na outra parte. Mas se a outra parte não cooperar, deve-se puni-la, não cooperando na partida seguinte e dando uma mensagem clara: traições serão sempre punidas. Uma relação profissional, por exemplo, nunca dará certo se as partes desconfiarem uma da outra. Se o patrão parte do princípio de que o funcionário irá sempre traí-lo e o funcionário pensa o mesmo do patrão, estabelece-se um clima organizacional dos mais temerários. Ao contratar uma pessoa, a empresa normalmente estabelece com o funcionário uma relação de confiança. Mas as traições são, ou pelo menos deveriam ser, punidas. O patrão pede ao funcionário que fique dez minutos a mais para terminar um trabalho e o funcionário fica porque sabe que, no dia em que chegar 10 minutos atrasados, contará com a compreensão do empresário. Quando a relação de cooperação mútua é quebrada sem punição, uma das partes acaba arcando com todo o prejuízo. O funcionário que fica dez minutos depois do horário sem cobrar hora extra, mas se aceita ser descontado ao atrasar 10 minutos acaba se tornando capacho da empresa. Da mesma forma, a empresa que vê o funcionário chegar atrasado todo dia, sem que isso seja descontado, terá um funcionário eternamente traidor. Descobri isso na prática ao trabalhar para uma faculdade para a qual implantei três cursos de comunicação (Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas). Na época, eu era apenas professor horista de cursos sequenciais, mas fiz os projetos dos três cursos e recebi as comissões. Escrever projetos de curso e receber comissões é o tipo de trabalho que costuma ser muito bem remunerado por consultores profissionais, pois envolve uma complexidade de ações e muitas responsabilidades, mas eu o fiz de graça, pois contava que a empresa colaboraria, numa relação de mútuo lucro. Quando os cursos foram finalmente implantados, assumi as coordenações, mas com um salário muito abaixo do esperado. Na verdade, menor que da maioria dos meus colegas professores horistas, alguns apenas graduados. Primeira traição. Na mesma época da elaboração dos projetos eu comecei a sugerir mudanças no marketing da instituição, que na época era totalmente amador. Logo, eu estava fazendo material de publicidade e assessoria de imprensa sem que isso incidisse sobre meu salário. Comecei a receber, inclusive, reprimendas quando havia problemas nessa área. Quando surgiu uma oportunidade de fazer doutorado, pedi apoio à instituição e recebi um sonoro não. O argumento é de que a instituição era ainda muito nova e não poderia arcar com ajuda financeira a professores. Já entrávamos no segundo ano e as reuniões, para elaboração de calendários e outros trâmites acadêmicos, entravam pela noite, até nos feriados e domingos, sem que se falasse em hora extra. Nessa época precisei faltar em um sábado de manhã e descobri, surpreso, que a falta tinha sido descontada de meu contracheque. A gota d'água aconteceu quando meu telefone tocou uma hora da manhã e era uma das diretoras me informando que uma comissão do MEC de Turismo (um curso no qual eu não lecionava) iria chegar aquela madrugada e que eu deveria pegá-los no aeroporto. Cada traição não punida dava aos donos da faculdade uma mensagem clara: eu sempre iria colaborar unilateralmente. Como o prisioneiro ingênuo do dilema, eu arcava sozinho com todo o prejuízo, enquanto a outra parte ficava com todo o lucro. Uma vez estabelecido esse esquema, é praticamente impossível reverter a situação. Acabei saindo da faculdade e para o meu lugar foram contratados três coordenadores, cada um recebendo o dobro do que eu ganhava. Gian Danton |
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