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Sexta-feira, 19/3/2010 O futuro (incerto?) dos livros Rafael Rodrigues O futuro dos livros de papel vem sendo discutido desde o surgimento dos livros eletrônicos (ou e-books), há mais de vinte anos. Mas as primeiras versões digitalizadas de obras impressas não chegaram a ameaçar os originais em papel pelo simples fator da mobilidade, já que os notebooks e netbooks não eram tão acessíveis como são hoje, e também por questões de saúde: a tela do computador agride bastante os olhos ― os monitores de LCD, que agridem menos, não eram tão comuns na época em que os e-books começaram a surgir. Nos últimos anos, com o advento dos leitores eletrônicos ― Kindle, Sony Reader e outros ―, os livros impressos passaram a ser mais discutidos ― e ameaçados. Para que estantes e mais estantes com milhares de obras armazenadas, se é possível carregar todas elas num aparelho pouco maior ― e mais fino ― que um livro? Assim pensam os entusiastas dos e-readers. O Kindle é o mais famoso e bem-sucedido deles, muito pelo fato de ser criação da Amazon, uma das maiores lojas virtuais do mundo, que tem em seu catálogo centenas de milhares de livros. Mas sua maior vantagem é mesmo a tela, feita com a tecnologia e-ink (leia-se papel eletrônico), que é bastante confortável para os olhos ― mais ainda que o LCD ― e que possibilita uma das experiências inerentes à leitura: o acender a luz para ler à noite, já que o Kindle não tem luz própria. Conectado ao site da Amazon, o Kindle é o mais prático de todos os e-readers disponíveis no mercado ― ao menos até o momento. Em poucos segundos, e com apenas alguns cliques, é possível comprar qualquer livro à venda na loja norte-americana ― ou mesmo baixar "samples", que são prévias gratuitas dos livros (geralmente o primeiro capítulo). Na versão mais econômica do Kindle 2 (sim, ele já tem mais de uma geração), cabem 1.500 livros. Ou seja: ele comporta muito mais livros do que a biblioteca de muita gente. E se a Amazon deixou as rodas de conversas literárias em polvorosa, a Apple, empresa comandada pelo "Rei de Midas" (ou "das mídias") Steve Jobs, quer movimentar ainda mais o mercado dos livros. Recentemente foi lançado o iPad, o tablet da Apple que, além de servir como computador portátil, pode ser utilizado como e-reader. E mais: Jobs já tem acordos costurados com grandes editoras norte-americanas, para fazer com seu iPad o que a Amazon faz com o Kindle. Mesmo com todas essas vantagens, nenhum dos leitores eletrônicos citados acima chegou com força ao Brasil. Ainda não há uma boa quantidade de obras em português para o Kindle, por exemplo. Além disso, para adquirir um é necessário gastar cerca de mil reais, por causa dos custos com transporte e impostos. O investimento compensa se você for leitor contumaz de obras em inglês: a Amazon vende os livros em formato Kindle por 10 dólares, em média. Mas aos poucos isso parece estar mudando. Já temos até um leitor eletrônico disponível no mercado brasileiro. É o Cool-er, comercializado pela livraria eletrônica Gato Sabido, especializada em vender livros digitalizados. O Cool-er, que pode armazenar até 5 mil obras ― se o proprietário adquirir um cartão de memória ― custa 750 reais, mas tem dois problemas: o próprio preço ― sem as taxas, o Kindle custa menos que ele ― e o preço dos livros digitalizados, que muitas vezes se aproxima do valor da obra impressa. Com tudo isso acontecendo, há quem já tenha decretado o fim dos livros de papel. Mas o que acham disso pessoas que não abrem mão de suas obras impressas de jeito nenhum? O escritor Menalton Braff (autor de "A coleira no pescoço" e "Moça com chapéu de palha", entre outros), por exemplo, diz que "Ninguém troca o jardim de sua casa por um vaso com flores de plástico, não é mesmo? Se alguém trocar, que o faça e não o condeno. Quanto a mim, quero sentar na minha poltrona reclinável, pegar o livro com as duas mãos, jogar a iluminação sobre ele e me afundar nele por algumas horas. Existe maior deleite?". Em recente entrevista ao jornalista Ubiratan Brasil, do jornal O Estado de São Paulo, o "multi-intelectual" Umberto Eco declarou que "O desaparecimento do livro é uma obsessão de jornalistas". Para Eco, "O livro (...) é como uma colher, um machado, uma tesoura, esse tipo de objeto que, uma vez inventado, não muda jamais. Continua o mesmo e é difícil de ser substituído. O livro ainda é o meio mais fácil de transportar informação. Os eletrônicos chegaram, mas percebemos que sua vida útil não passa de dez anos". A maior vantagem dos leitores eletrônicos é a possibilidade de carregar, em um único e leve aparelho, centenas ou milhares de livros. Para quem trabalha no ramo editorial, um leitor eletrônico é quase indispensável. Mas será que o chamado "leitor comum", o "leitor de fim de semana", vai se render aos e-readers? Há quem diga que a atual situação dos livros é semelhante à dos discos de vinil, quando do surgimento do CD ― as "bolachas", como eram apelidados os vinis, começaram a ser substituídas pela nova mídia. A questão é que, com o passar dos anos, estudiosos e "apreciadores ortodoxos" de música "descobriram" que a qualidade sonora do vinil é superior à do CD. E hoje o que vemos é justamente pessoas voltando a comprar vinis, em vez de CDs. Mas ainda assim os disco de vinil são vistos como uma extravagância de amantes inveterados de música. Será que é isso que vai acontecer com os livros de papel? Apenas bibliófilos farão questão de comprar obras impressas? As apostas são muitas, as previsões são as mais diversas. Mas, para saber o que vai acontecer, só mesmo esperando ― e pagando ― para ler (e ver). Rafael Rodrigues |
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