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Sexta-feira, 27/8/2010 Sobre o preço dos livros 2/2 Rafael Rodrigues Ilustra: o urso azul Como disse colunas atrás, "vocês que me perdoem, mas preço de livro não é mais desculpa para quem gosta de ler". Leitores sempre dão um jeito de conseguir o livro pelo qual estão interessados, seja indo a um sebo, seja aproveitando promoções de livrarias. Não se pode dizer que determinados livros são baratos, mas dizer que livro é caro ― assim mesmo, generalizando ― já não é mais possível. Até porque não se mede o preço de um livro apenas por seu valor financeiro, mas também pelo que ele representa para cada leitor. Um exemplo: qualquer uma das obras mais recentes de Rubem Fonseca é cara, para mim. Já as reedições dos seus livros que estão saindo pela editora Agir, não são. Tampouco acho caros os livros de Nelson Rodrigues que essa mesma editora tem reeditado. É como reclamar do preço de um romance de Dostoiévski (a citação do autor russo foi involuntária, em um primeiro momento, mas depois percebi que faz todo o sentido citá-lo junto a Nelson Rodrigues). Imaginemos que livros fossem comprados em leilões. Crime e castigo certamente seria disputado centavo a centavo. Na primeira parte deste texto falei das porcentagens destinadas a cada participante da cadeia do livro. E muita gente joga a culpa do "preço alto" nas livrarias. É certo que na maioria dos casos 40% do preço do livro fica com a loja, mas quantas livrarias não dão descontos de 15% a 20% para professores, por exemplo? A maioria dos estabelecimentos trabalha no esquema de consignação, ou seja, as editoras ou distribuidoras enviam os títulos para as lojas para que eles sejam "expostos", para que os clientes/leitores possam ver os livros e quem sabe comprá-los. Sendo mais claro: as livrarias não são donas de todos os livros que estão sob seu teto. Caso eles não sejam vendidos, ela os devolve sem maiores prejuízos, talvez apenas pagando os custos com transporte. Quando acontece um "livro-evento", como o mais recente de Dan Brown, ou os romances de vampiros da Stephanie Meyer, as lojas arriscam comprar uma grande quantidade de exemplares, já que a venda é tida como certa. Mas e quando esses livros encalham? Está feito o estrago. Sem contar as despesas que livrarias têm com funcionários, luz, água etc. Não sou um expert no assunto, mas as pessoas acham que, por venderem livros, as livrarias não pagam impostos, não pagam aluguel ou condomínio (no caso de a loja estar num shopping), não têm conta de água, luz e telefone. Livreiros devem ter lá seus benefícios, isenções ou descontos em alguns impostos, mas livrarias são empresas como qualquer outra ― assim como as editoras. Colocar nelas a culpa de o livro ser caro no Brasil é um ato irresponsável, e o advento dos e-books mostrou que a coisa não é tão simples assim. Pelo menos por enquanto, os preços dos e-books ainda é alto por aqui, se compararmos esses valores com os das versões impressas das obras. O livro eletrônico elimina a distribuição e os gastos com impressão. Então por que ainda assim o preço continua quase o mesmo? Em alguns casos, é possível comprar um determinado livro impresso na Estante Virtual ― detalhe: livro novo, não usado ― por um preço inferior ao da sua versão digital. Teriam as editoras aumentado o preço de custo dos e-books? Ou as livrarias têm mesmo culpa no cartório? Na minha opinião, esta última possibilidade não parece ter muito sentido. Na verdade, o mercado de e-books e e-readers, no Brasil, ainda vai passar por muitas transformações. A iniciativa de implantação de lojas de livros eletrônicos é louvável e necessária, bem como a criação de leitores eletrônicos por empresas nacionais. Mas a questão do preço ainda precisa ser melhor discutida. Como dito no texto anterior, hoje é possível comprar um Kindle por 600 reais. Nesse preço já estão incluídos os gastos com frete e as taxas de importação. Enquanto isso, a Positivo está comercializando o seu e-reader, o Alfa, por um preço de R$ 699,00. Enfim. Estamos no início de uma revolução. E ela não se restringe à plataforma de leitura, mas atinge todo o mercado e até mesmo hábitos das pessoas. Consequentemente, os efeitos disso serão sentidos pela sociedade. Afinal, se o futuro dos livros for mesmo a digitalização e a substituição do impresso pelo eletrônico, as livrarias físicas estão destinadas à extinção. O leitor não poderá mais abrir um livro e cheirá-lo, tampouco poderá emprestar uma obra ou ter um autógrafo do autor na folha de rosto. Por outro lado, e paradoxalmente, nos últimos anos, talvez até mesmo por conta de todo o frisson ligado à digitalização, os livros impressos passaram a ser mais valorizados. Há quem os utilize até como peças decorativas em casas e escritórios. Além disso, livros são motivo de orgulho e vaidade. Não há nada mais belo para um bibliófilo do que suas próprias estantes recheadas de títulos (muito embora a maioria deles não tenha sido lida pelos seus donos). Um livro não é apenas seu conteúdo. Dizer isso seria reduzir a invenção de Gutenberg a algo pequeno demais, que não condiz com sua importância. Há muito mais coisas em jogo. A digitalização de obras é algo que precisa ser feito, lógico, mas é necessário pensar com cuidado em maneiras de se preservar o modelo impresso e tudo o que depende dele. Não se pode querer acabar com o livro físico. Pensar nisso e torcer contra a plataforma impressa é, na minha opinião, mesquinho demais. Nota do autor Leia também "Sobre o preço dos livros 1/2". Rafael Rodrigues |
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