|
Quarta-feira, 15/7/2015 Minha Terra Tem Palmeiras Marilia Mota Silva Orlando, a cidade na Flórida onde ficam os parques da Disney, Universal e outros, é uma cidade americana típica, isto é, concebida para uma vida sobre rodas. Ali não há ruas com calçadas, lojinhas, vitrines, praças com árvores e bancos onde se possa ver a vida. Há vias expressas, avenidas com várias pistas, ligando os subúrbios com suas casas grandes, gramados impecáveis, simetria e perfeição meio opressivas, aos blocos de comércio, shoppings centers e condomínios mais centrais. Se é que se pode falar em centro nesse vai e vem de avenidas e elevados. O pedestre ali é um inconveniente que não se encaixa no projeto urbano. Para quem gosta de conhecer lugares caminhando é desconcertante. Um segundo olhar, no entanto, revela onde há vida na cidade, à parte do frenesi turístico dos parques e das pistas de alta velocidade. E me arrisco a dizer que Orlando é brasileira. Não tinha ideia da dimensão da presença brasileira em Orlando. Ali encontramos brasileiros em todas as áreas de trabalho: no turismo, naturalmente, no mercado de imóveis, venda e aluguel de casas por temporada. No comércio, uma infinidade de lojas e até supermercado, mas não é só isso: há professores, médicos, advogados, escritórios de contabilidade, bombeiros, motoristas... e confirmando o peso da nossa presença na cidade, temos finalmente um banco com funções plenas nos Estados Unidos (restrito à Flórida), o BB Américas. Em Orlando, temos padaria! Nada de bakery com seus produtos inodoros, frios, super-processados! Padaria como as nossas. Comprei pãozinho francês na Padaria Pão Gostoso. Café, pão de queijo, pastel de forno, bolo de milho na vitrine. Conversas animadas nas mesas, em volume baixo. Passei perto para ter certeza: todos falavam em português. A poucos metros da Pão Gostoso, outra padaria tinha Ana Maria Braga na tevê, ensinando a fazer receitas. A jovem no caixa disse: eu me sinto em São Paulo. Nem me lembro que estou longe! É, isso podemos dizer do brasileiro: adaptamo-nos com facilidade a qualquer cultura e fuso horário. Não há canto do mundo em que não se esbarre em um de nós. Em busca de uma vida melhor ou de uma terra sem males, como nossos antepassados, o povo guarani, nos aventuramos pelo mundo, mas não ficamos longe do Brasil. Mesmo integrados à vida do país adotado, nos reunimos em grupos, formamos comunidades, nos empenhamos para que as crianças falem português; cultivamos nossas tradições. Festa junina, por exemplo, é um ponto alto. No calor do verão no hemisfério norte, o fogo da fogueira é de papel celofane. Quentão, nem pensar! Mas tem quadrilha com casamento, padre e noiva prenhe, chapéus de palha, roupas remendadas, tranças, xadrez, babados, viola, acordeon! Alessandra e Alan, na festa do MBV (Mães Brasileiras de Virginia) Nos primeiros dias de minha estada em Orlando, encontrei na mesa de uma sorveteria um jornal local brasileiro: Jornal B&B, Brasileiras Brasileiros. Tamanho tablóide, 64 páginas, distribuição gratuita, um manancial de anúncios e informações, tudo em português. Uma dessas informações me deixou sem ar por uns momentos: A Flórida recebeu 100 milhões de turistas em 2014. Só a Flórida, essa península ao sudeste do país, cheia de terrenos pantanosos e mosquitos. Cem milhões! O Brasil inteiro recebeu, no ano em que hospedou a Copa Mundial de Futebol, sete milhões. Tudo bem que a Flórida tem essa concentração de parques de diversão, mas, ainda assim, a diferença é grande demais! Não estou sugerindo que seja culpa do governo. Não foi o governo que construiu a Disney e os outros parques que atraem grande parte desses turistas. Foi a iniciativa de empresários, com visão, capacidade de investir e correr riscos. O governo contribuiu - contribui - garantindo a infra-estrutura, rodovias, aeroportos, segurança. Agora mesmo o imenso e confortável aeroporto internacional de Orlando está sendo ampliado. Como desatar os nós que nos impedem de ser bem sucedidos nessa área em que temos atrações únicas, recursos infinitos e que traria tantos empregos, tantos benefícios? Eu sei, a resposta nos levaria ao labirinto antigo e suas saídas elusivas. Ainda assim, a pergunta insiste. Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá, as aves que aqui gorjeiam nao gorjeiam como lá...não permita Deus que eu morra, sem que eu volte para lá"...Canção do Exílio, Gonçalves Dias Marilia Mota Silva |
|
|