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Terça-feira, 14/2/2017
Oswald de Andrade e o homem cordial
Celso A. Uequed Pitol

Oswald de Andrade passou a segunda metade dos anos 40 dedicado ao estudo. O desligamento do Partido Comunista Brasileiro, ocorrido em 1945, e o desapontamento com os rumos do mundo pós-guerra levaram-no a rever posicionamentos: segundo o filósofo Benedito Nunes, Oswald esperava o “ocaso dos imperialismos, das ditaduras e da moral burguesa” – o que, como se sabe, não aconteceu. Ocupa-se, então, das leituras, sobretudo em filosofia, encaminhando ideias que frutificarão na década seguinte.

Um dos primeiros frutos destes anos decisivos para Oswald está na comunicação “Um aspecto antropofágico da cultura brasileira: o homem cordial”, apresentada no Congresso Brasileiro de Filosofia em março de 1950. Ali estão presentes dois elementos fundamentais: primeiro, a retomada das ideias antropofágicas dos anos 20, que a aproximação com o marxismo havia eclipsado; segundo, a leitura de “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque de Holanda – sobretudo o capítulo dedicado ao “homem cordial”.

Oswald sublinha a tendência do brasileiro a incorporar em si os sentimentos do outro. Esta tendência guarda proximidade com características do homem cordial delineado por Sérgio Buarque de Holanda em “Raízes do Brasil”. Cordial, de cors, coração em latim; é o homem movido pelas emoções e que tende a preferir a vida social, a comunhão, a “expansão para com os outros”, o “viver nos outros”. São os traços definidores do brasileiro – o homem cordial por excelência. O homem que “devora” – ritualisticamente – o seu semelhante.

Na leitura de Buarque, estes são traços problemáticos: o homem cordial seria resquício de um passado rural, arcaico e atrasado. A superação do atraso, com a urbanização e o desenvolvimento, sinalizará, também, a superação do homem cordial. Já Oswald vê nele a prefiguração de uma nova forma de ser e estar no mundo, onde a alteridade e a comunhão substituirão o individualismo do homem moderno.

Oswald desenvolverá este ponto de vista no ensaio“ A Crise da Filosofia Messiânica”,também de 1950, onde a decepção da década anterior dá lugar à releitura otimista e à esperança. As novas ideias frutificam: o homem cordial – emotivo, dado à comunhão, ao “viver nos outros” e à antropofagia ritual – não apenas subsistirá como será o modelo de um novo homem, de um novo mundo.

Celso A. Uequed Pitol
Canoas, 14/2/2017

 

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