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Terça-feira, 24/1/2023
Obra traz autores do século XIX como personagens
Renato Alessandro dos Santos

Responda uma coisa, leitor(a): se você fosse um drone, preferiria sobrevoar Nova Friburgo (RJ), ou sua cidade? Vejo no YouTube imagens da “Suíça brasileira” (e como ficam Monte Verde (MG) e Campos do Jordão (SP) nessa história?) e não penso duas vezes: quem dera ser um drone, para Nova Friburgo sobrevoar. Eu sei, eu sei...

E que tal regressarmos ao ano de 1884, quando se passa a história deste romance; isto é, há poucos anos antes da Lei Áurea e da República?

O que acha, leitor(a)?

Dois autores nos convidam para a leitura de O fabuloso Dr. Palhares e, a julgar pela ordem das paixões que habitam ambos, História e Literatura – com letra maiúscula – encontram-se neste livro. O resultado é como se você somasse: sexta-feira à noite + sofá + Netflix = O fabuloso Dr. Palhares.

Vem?

Regressando ao último quartel do século XIX, Janaína Botelho e George dos Santos Pacheco uniram duas paixões a um objetivo em comum: contar uma história de mistério, mas situando-a em Nova Friburgo, cidade onde ambos residem e dividem seu tempo pesquisando, escrevendo e respirando as correntezas de ar de um lugar onde a natureza conspirou para encantar.

O fabuloso Dr. Palhares, como você já sabe, tem, como pano de fundo, a cidade montanhosa que, no passado, recebeu celebridades que, por ali, foram em busca do mais revigorante ar da região, aquela brisa das montanhas capaz de curar enfermidades associadas à alma e ao corpo. Machado de Assis, Casimiro de Abreu, Olavo Bilac e Rui Barbosa estiveram por lá e, aqui, nestas páginas, os encontramos também.

Há gente que vê, de cima, a palavra “SaÜde” bordada na cadeia de montanhas que, sorrindo, enaltece o ufanismo dos friburguenses. Mas, para se manter em evidência no coração de quem opta pela natureza em detrimento da urbe, a cidade nem sequer precisa de exageros assim: para escapar da fumaça, do trânsito, das obrigações que oprimem, subir a serra é decisão que a você cabe tomar, leitor(a), em dias em que sua saúde mental tem de valer mais do que esse nosso correr à deriva para que possamos, enfim, atingir o alvo; isto é, e$$e objetivo capaz de de$equilibrar o e$pírito que, in$ati$feito, parece nunca contentar-$e com a porca mi$éria que não para em no$$os bol$os. A ilusão é uma eterna panaceia na cabeça daqueles que, workaholics, não têm tempo para o pôr do sol. Em outras palavras, se nessa peleja que é nossa vida só dinheiro interessa, que pobre diabo somos nós, não?

Ilusão,
fábula,
fabuloso Palhares, o médico do povo: aquele que, como todos que aderem pela manutenção da saúde dos outros, coloca a vida alheia em primeiro lugar. Circula o médico pelas cercanias de Friburgo, sempre atento a quem dele necessitar. Mas, e além, o que há? Há Helena, filha de Pedrosa, um Paulo Honório bem longe da São Bernardo de Ramos, mas que em nada fica a dever ao latifundiário de mal com a vida. Há a engenhosidade costumeira que encontramos nas obras que saem da cachola de George, somada agora ao trapézio de Janaína também: duas partes dividem o romance e, nelas, o registro literário dá-se por meio de gêneros textuais diversos, especialmente, a carta e o diário. Quem os escrevem são o fabuloso e, além dele, seu amigo Theodoro.

Há surpresas pelo caminho? Não seria um livro do engenhoso George, se não existissem, e nos deparamos com elas da mesma forma que vários maratonistas, durante o percurso, hidratam-se com aqueles copos de água que as pessoas lhes dão. Água, aliás, é uma palavra-chave nesta obra, e não poderia ser diferente, considerando a fama que Friburgo tem, quando se pensa em águas medicinais que curam de beribéri a bronquite.

O léxico é outro atrativo: seu vocabulário vai melhorar, leitor(a), pois os autores recorrem a palavras que, hoje, repousam meio entregues à opacidade gasta do brilho que, ofuscando, por anos, chegou delas. Hoje, não mais: ósculo, tetanizado, caturrando etc. São muitas... Aliás, não é frustrante que doppelgänger, uma palavra bela, sofisticada e sempre em débito com Edgar Allan Poe, signifique... “sósia”? Pior que isso só cupcake.

Enfim, para evitar que caspa vire mandiopã, dentre outras opções, ou você leva uma vida menos abjeta, ou você viaja até Nova Friburgo, ou você dá um piparote nos problemas, ou você – em busca de refrigerar seu espírito – lê um romance. Como O fabuloso Dr. Palhares?

Renato Alessandro dos Santos
Batatais, 24/1/2023

 

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