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Sexta-feira, 19/5/2023 Nélio Silzantov e a pátria que (n)os pariu Luís Fernando Amâncio O pior não passou. É verdade que conseguimos defenestrar o ícone da boçalidade nacional. Mas não estamos a salvo. O fantasma da barbárie segue à espreita. Com olhos de fogo e baba espessa pendendo dos lábios. Os exemplos de que o boçalnarismo segue como ameaça são diários. Nos discursos de deputados e senadores que se orgulham de seguir seu legado medieval, ao cantor sertanejo que constrangeu uma repórter trans com a pergunta “você tem pau?”. Ou no motorista de aplicativo que lançou seu carro sobre um suposto ladrão e fez vídeos comemorando o ato enquanto o alvo agonizava. Dentre tantas outras possibilidades que transbordam nos telejornais vespertinos de calamidades. E é esse futuro catastrófico, ou as possibilidades dele, que encontramos em Br2466 ou a pátria que os pariu, segundo livro de Nélio Silzantov. A obra, publicada pela Editora Penalux em 2022, reúne 26 narrativas distópicas. Contos de um futuro não muito distante, de fácil reconhecimento para quem se arrasta pelas cidades brasileiras. O livro se divide em quatro partes: “O Estado é uma máquina de triturar homens”; “Os homens são bestas que se devoram e louvam”; “O credo é a peste sedenta de morte”; e “Com quantos caracteres se constitui um caráter”. Como se pode ver, Nélio é ótimo com títulos. Alguns contos também possuem excelentes nomes. Cito, como exemplos, “Toda insanidade é uma forma desesperada de adestrar um marido”; “A solidariedade é uma hashtag pra iludir seguimores”; e “O velório de Deus foi numa terça-feira e você não levou flores”. Dentro deste recorte conceitual - a distopia - os contos de Br2466 possuem variações. Por exemplo, há aqueles mais focados em um Estado totalitário, que oprime as individualidades e manipula seus cidadãos para obedecer uma ordem estabelecida. Em outros, encontramos as mazelas do fanatismo, sobretudo o religioso, e as mais diversas violências. Desde as sociais, até as de gênero. Na distopia de Silzantov, compreendemos que o lobo do homem é o homem coletivo. Seus personagens estão sempre batalhando pela sobrevivência contra uma sociedade hostil, que parece disposta a esmagá-los a qualquer custo. Os textos de Br2466 são densos, afinal a temática assim o pede. Alguns flertam francamente com a filosofia, que é a formação do autor. Nélio Silzantov é autor de Desumanizados, de 2020, romance também publicado pela Penalux. Além de escritor e professor de filosofia, ele mantém o site Ágora Literária, espaço bastante recomendável para aqueles que desejam conhecer novos lançamentos da literatura nacional. Br2466 ou a pátria que os pariu pode ser encontrado aqui. “Os patriotas estão nas ruas, saudosos das prisões alheias, torturas e desaparecimentos. Não se importam com a venda do país, desde que não sobre nada aos verdadeiros donos desta terra e os patriotas saiam lucrando, como sempre. Os patriotas não se importam com a extrema miséria do povo ou se ele morre de fome, desde que todo aquele que quiser, possa ter em mãos o seu próprio fuzil.” Luís Fernando Amâncio |
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