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Segunda-feira, 29/7/2002 Da crônica ao metajornalismo Nemo Nox Alguns dos maiores jornais do Brasil já começaram a publicar colunas específicas sobre weblogs. O que antes era mera curiosidade e recebia tratamento de moda passageira agora começa a ser encarado com seriedade pela grande mídia. E já são muitos os jornalistas que também começaram seus próprios weblogs. No meio desta efervescência, fica a pergunta: weblog é jornalismo? O problema em abordar essa questão de forma global é a enorme diversidade de modelos adotada pelos blogueiros. Temos de narrativas românticas a desabafos profissionais, de minicontos a relatos de viagem, de comentários do dia-a-dia a ensaios de marketing, a lista é infindável. Dentro desse caleidoscópio temático, somos tentados a comparar os weblogs às colunas de crônica tão comuns em jornais de ontem e de hoje, sendo também um formato adotado por algumas emissoras de televisão. Nos weblogs, em vez da coluninha semanal onde tudo pode ser assunto, até a falta de assunto, temos os posts diários onde tudo pode ser assunto, até para quem não tem assunto. Mas podemos buscar outra relação entre weblogs e jornalismo, mesmo excluindo os exemplos óbvios e raros onde o blogueiro está efetivamente usando seu espaço como repórter e fazendo cobertura de eventos. Há um elemento comum, além da estrutura linear-vertical de posts com data, unindo quase todos os weblogs: a grande quantidade de links oferecidos para outros sites, freqüentemente para sites da grande mídia. Neste sentido, o weblog pode ser considerado uma espécie de metajornalismo, um filtro personalizado e muitas vezes comentado, com liberdade inclusive para alinhavar fontes distintas num só post, citando e confrontando veículos concorrentes ou pontos de vista conflitantes. O link é talvez o elemento que mais caracterize a experiência da world wide web, e nos weblogs encontrou terreno fértil para uma explosão hipertextual. Jornais, revistas, programas de rádio e televisão, e até mesmo outros sites de notícias, passam pela análise diária de um exército de blogueiros que elogia, critica, acrescenta, desmente, analisa, retruca, questiona, e dá a sua própria versão dos fatos. O caminho é de mão dupla, com grandes veículos oferecendo matéria-prima aos nanicos, que por sua vez a retrabalham e remetem seus públicos pequenos porém segmentados de volta à origem, mas agora com um verniz crítico diferenciado. A simbiose é inescapável, e é a isso que começam a se render agora os gigantes da mídia, ao menos os mais ágeis. Os escribas estão soltos Um aspecto pouco lembrado é que os weblogs representam uma gloriosa volta à palavra escrita. Nos primórdios da web, por deficiências tecnológicas, o texto era uma prioridade em qualquer site - imagens estáticas demoravam uma eternidade no download, e sons ou filmes eram um luxo impensável. Numa sociedade dominada pelos meios audiovisuais, voltávamos subitamente ao domínio do texto. Depois, com a aproximação da mítica banda larga, a web começou a ser invadida pelo visual, e fomos inundados por sites bonitos porém desprovidos de conteúdo. Para muitos que não tinham o que dizer, numa paráfrase de mau gosto a McLuhan, o design passou a ser a mensagem, a única mensagem. Hoje os weblogs mostram que nem tudo está perdido para as belas letras. Pelo contrário, poucos imaginavam que poderia haver tanta verborragia espalhada pelo mundo, e legiões de escribas se lançaram à web mal os obstáculos para a publicação foram contornados (para fazer um weblog hoje não é necessário qualquer conhecimento de html, ftp ou outras siglas assustadoras para os neófitos). Os weblogs são bem mais que uma versão online dos velhos diários escritos à caneta num caderninho trancado a sete chaves. As influências são múltiplas, e vão dos velhos fanzines e jornaizinhos escolares mimeografados até os sites pessoais e os cronistas da grande imprensa on e offline. É curioso que os grandes veículos de comunicação, em geral, tenham dado tratamento de curiosidade ao fenômeno dos weblogs. Muitos jornalistas não se sentem confortáveis com a concorrência que surgiu de todos os lados e se manifesta diariamente na web, sem diplomas e sem compromissos, e prefere descartar o movimento como moda passageira. Mas é nos weblogs que vai surgindo uma nova geração de formadores de opinião, bem aos moldes anárquicos da internet, variando de modestos palpites sobre o último lançamento cinematográfico às grandes denúncias políticas. São milhares de Spider Jerusalem (personagem de Transmetropolitan, de Warren Ellis) soltos pelo mundo, relatando, denunciando, opinando. Nota do Editor Texto gentilmente cedido pelo autor. Nemo Nox é editor do blog Por um Punhado de Pixels e do site Burburinho, onde este texto foi originalmente publicado. Nemo Nox |
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