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Quinta-feira, 8/8/2002
Gramado e a ausência de favoritismo
Lucas Rodrigues Pires

Gramado é um daqueles festivais esperados o ano todo. São produtores, atores, diretores e um público, composto basicamente de gaúchos, ávido por ver o que há de melhor na produção audiovisual nacional.

Além da ficção do cinema brasileiro, os documentários nacionais e o cinema latino também estão em evidencia nesta 30a. edição do Festival de Gramado, que acontece de 12 a 17 de agosto. A nova categoria de documentários é a grande novidade, o que dá força e vigor ao evento, pois é um dos gêneros cinematográficos que mais cresce no país, já representando cerca de 20% dos filmes exibidos comercialmente.

Para a categoria principal – melhor filme brasileiro de ficção em longa-metragem –, cinco disputam o kikito. São eles: Dois Perdidos numa Noite Suja (adaptação de José Joffily para a peça de Plínio Marcos), Durval Discos, Uma Onda no Ar(filme de Helvécio Ratton baseado na experiência da Rádio Favela em Belo Horizonte), Separações (nova comédia de Domingos Oliveira, também baseado em texto teatral) e Querido Estranho. Esse leque de filmes indica uma única coisa – não há favoritos a nada nesse festival. E isso é o que o torna mais atraente. Entre eles, nenhuma grande produção ou filme envolvendo alguns dos nomes consagrados do cinema brasileiro. Esperava-se que A Paixão de Jacobina, de Fábio Barreto, entrasse na competição, mas a organização e os produtores (Luis Carlos Barreto) preferiram apenas exibi-lo numa mostra paralela, como uma janela para a estréia nacional que deverá ocorrer em setembro.

Haver cinco “desconhecidos” na competição de Gramado é algo arriscado. Todos sabem que o festival se tornou um dos pontos onde muitos “famosos” aparecem para ver seus colegas. Ano passado, os prêmios foram divididos entre Memórias Póstumas, de André Klotzel, e Bufo & Spallanzani, de Flávio R. Tambellini. Querendo ou não, atores de peso como Tony Ramos, José Mayer, Reginaldo Faria e Sônia Braga eram as estrelas desses filmes. Para este ano, o ator mais conhecido do público talvez seja Débora Falabella, a jovem Mel da novela O Clone (atua em Dois Perdidos numa Noite Suja), e Daniel Filho, de Querido Estranho.

Mesmo sendo uma jogada arriscada, a organização resolveu mudar e não escolher um competidor que já chegue com pinta de vencedor, como aconteceu nos outros dois mais importantes festivais de cinema brasileiros – Brasília e Recife. Em novembro do ano passado, Lavoura Arcaica chegou à capital federal e levou os principais prêmios, apesar de ter dividido o de melhor filme com Samba Riachão (um injustiça não ter ganho o de melhor diretor – para Luiz Fernando Carvalho). Já em Recife, no mês de abril, O Invasor não deu chances a nenhum outro filme. Essa ausência de favoritismo pode levar a um festival muito mais aberto à visibilidade e aumentar a importância do público para a decisão final do júri. Com a maior participação da platéia, o festival ganha em credibilidade, e o que poderia ser um jogo para apenas “vestir a faixa” num time se transformaria numa grande decisão de campeonato disputada até o último minuto. Além disso, claro, os premiados teriam maior destaque na mídia, o que ajudará na hora de enfrentar a concorrência no mercado comercial de exibição.

Entre os documentários, três são inéditos em circuito – Edifício Master, A Cobra Fumou e O Poeta de Sete Faces – e dois já foram exibidos, Onde a Terra Acaba e Nem Gravata Nem Honra. Aqui também se configura uma “igualdade de chances” para levar o kikito. Onde a Terra Acaba, de Sérgio Machado, é um belíssimo filme, mas pode perder votos justamente por não ser inédito. Edifício Master tem a batuta de Eduardo Coutinho, o grande documentarista brasileiro, e isso pode pesar. Já O Poeta de Sete Faces, de Paulo Thiago, tem como tema Carlos Drummond de Andrade e, por ser 2002 o ano do centenário de nascimento do poeta, é bem provável que leve algum prêmio. A Cobra Fumou é o segundo episódio sobre a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, focando aqui a Força Expedicionária Brasileira (FEB). O primeiro foi Senta a Pua!, sobre a aeronáutica nacional nos céus italianos.

A competição latina servirá para vermos o argentino O Filho da Noiva, filme que tirou de Abril Despedaçado a vaga para o Oscar 2002. Não que isso seja importante, mas a produção recebeu muitos elogios na Argentina e teve bom público, além de contar com o ator Ricardo Darín, do excelente Nove Rainhas.

O colunista que aqui escreve estará indo para Gramado cobrir o festival. Na próxima coluna, haverá mais comentários sobre a competição e, se possível, algumas novidades positivas para o cinema brasileiro.

Lucas Rodrigues Pires
São Paulo, 8/8/2002

 

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