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Terça-feira, 15/5/2001
Vamos fazer o português entrar na moda!
Adriana Baggio

Acredito que todo mundo concorda com os argumentos do deputado Aldo Rebelo para embasar o projeto de lei que visa punir o uso de estrangeirismos em detrimento da língua portuguesa. Mas a forma como deputado pretende fazer isso é causa da polêmica que envolve a idéia.

Em primeiro lugar, é mais um projeto de lei. O poder legislativo está cheio de projetos de leis muito mais pertinentes no momento, e não consegue votá-los. O poder judiciário não dá conta de todos os processos que têm para julgar, atrasando o benefício da justiça para muita gente. Por mais que a defesa da língua portuguesa seja importante, existem outros projetos para serem votados e outros processos a serem julgados, muito mais urgentes do que o proposto pelo deputado. Isso não quer dizer que novos projetos de lei não devam ser propostos. Quando algum tipo de má conduta pode ser desencorajada pela criação de uma lei, com certeza é pertinente a aprovação desta lei e a colocação em prática de todos os mecanismos que façam com que seja cumprida, e os infratores sejam punidos. Mas não acredito que somente uma lei vá resolver os séculos de "contaminação" da língua portuguesa falada e escrita no Brasil.

Por que os estrangeirismos "pegam" tão fácil no Brasil? Porque significam status, ou melhor, posição social. É um problema muito mais sociológico e antropológico do que legal. No jargão técnico, econômico, comercial, de moda, o domínio de palavras estrangeiras pretende mostrar um conhecimento além daquele que normalmente a pessoa alcança. Serve para diferenciar uma pessoa da outra, e essa é uma busca incessante, que nos consome há muito tempo. A língua é apenas uma das ferramentas utilizadas para satisfazer este anseio. E cá entre nós: é muito mais chique comprar numa "sale" do que numa "queima total", não é?

A mídia, a sociedade, o mercado de trabalho, valorizam as pessoas que sabem se comunicar num dialeto inacessível à maioria, e aí a gente tem mais um tipo de exclusão. O uso de estrangeirismo só vinga porque é incentivado, bem visto, é sinal de personalidade. Esse é primeiro ponto que deve ser combatido para que as pessoas troquem a palavra estrangeira pela original em português, que quer dizer a mesma coisa. Gente, é preciso virar moda falar o português, e falar bem! Quando a situação se inverter e for de bom tom a comunicação na nossa língua mãe, não vai ser preciso nenhum tipo de lei para mudar o comportamento da população.

Por outro lado, não vamos ser xiitas. A miscigenação de línguas é natural, e enriquece os idiomas. Alguns termos técnicos não existem em português, ou já foram assimilados em outra língua. Mesmo os franceses, que são xenófobos até o último pedacinho de croissant, acabam adotando palavras em inglês. Mas eles sempre dão um acento local: "ok", por exemplo, é pronunciado "oqué". A França, além de lutar contra a invasão de palavras estrangeiras, preocupa-se em disseminar o francês pelo mundo. A mistura de valorização com divulgação faz com que o francês mantenha-se firme, com personalidade.

O Brasil deveria começar a valorização da língua através do desenvolvimento da auto-estima de seu povo. É preciso sentir orgulho de falar o português. Para isso, os formadores de opinião devem trabalhar para a utilização preferencial da nossa língua. Os primeiros a entrar na nova onda serão os fashion victims, desculpe, as pessoas vítimas dos modismos. Quando esses aderirem, o resto vai atrás. É que nem moda: da passarela ao camelô é um pulo. Não dá pra esquecer também de fazer com que as pessoas procurem falar e escrever português da maneira correta, o que provavelmente não será fácil.Glorioso vai ser o dia em que as pessoas deixem de entrar numa loja cuja vitrine exibe sofisticadamente as palavras "sale", "discontinued models", etc, porque vão se recusar a serem manipulados e ludibriados em inglês, quando existem várias palavras que podem nos manipular e ludibriar no bom e velho português.

Adriana Baggio
Curitiba, 15/5/2001

 

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