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Sexta-feira, 10/10/2008 Entrevista a Thomaz Gomes, da revista ResultsON Julio Daio Borges 1. 1 milhão de pageviews/mês após 8 anos de trabalho. Você acha que demorou para atingir essa meta? (Eu acho esse número impressionante para um site que aborda cultura com qualidade e não se rende a fofocas, novelas etc.) Na verdade, eu nem achava que daria para atingir essa meta quando comecei (o Digestivo nasceu como um hobby em 2000). Escrevi, outras vezes, que as revistas culturais tradicionais, no Brasil, morriam logo nos primeiros números, ou não passavam de algumas dezenas de milhares de exemplares mensais (como a Bravo! e a Piauí agora). O fato é que o Digestivo tem se convertido num site de interesse geral, concretizando algo que seu sempre imaginei para a cultura: que ela pudesse ser mais acessível, menos chata, mais interessante mesmo. Claro, não vamos "democratizar" a alta cultura, mas o prazer de um bom texto, nesta época de e-mails, deve estar ao alcance de todos. Voltando ao início da sua pergunta: embora fosse obstinado desde o começo, fiz as coisas muito intuitivamente, trabalhando com a qualidade e, não, com números (inicialmente). Hoje posso falar mais em metas, porque vejo que é possível trabalhar com elas depois de adquirir uma massa crítica. Quanto a "demorar", pegamos o pós-bolha; seria mais rápido hoje (Web 2.0). 2. Nesse tempo todo, como vem sustentando o negócio? No início, foram praticamente patrocínios: anúncios quase anuais ou semestrais, mais na linha institucional, como aconteceu com a Livraria Cultura, durante um bom tempo. Hoje, depois de atingir esse patamar de visitação, a maior parte das receitas vêm de anúncios vendidos por agências de publicidade, especializadas em campanhas para a internet. Há, ainda, alguns anunciantes de longo prazo, como a Cultura (que continua). Há, também, outras fontes, como anúncios automatizados, tipo Google e Submarino. E, para completar, há a produção de conteúdo (para outras mídias), realização de eventos (produção cultural) e até consultorias (para outros sites que querem crescer, se adaptar mais à tal Web 2.0 etc.). 3. Acha que agora você tem bala na agulha para negociações mais ousadas de patrocínio, contratar pessoal, ampliar a ação do site? Quais as perspectivas para o Digestivo? Vão se transformar em empresa em busca constante de ampliação e expansão? Pode adiantar pra gente um print de como será o portal? :-) Acho que sim, que estou negociando melhor de uns tempos pra cá. Acontece que certos valores, e certos tipos de trabalho (até certos clientes), começam a não "compensar" mais. Você pode perder um negócio grande e mais interessante se continuar focado nos "pequenos", atendendo a pequenas solicitações, muito preso nos detalhes... Antes, também, os resultados, como eu disse, eram mais "institucionais", gerando, basicamente, valor para as marcas das empresas patrocinadoras. Hoje é diferente, eu tenho números — e não só de visitação, mas de receitas, por exemplo, que geramos para outros sites como Submarino e Google (de novo). Logo, existe uma base real para a negociação. Quanto a perspectivas, a idéia é estruturar melhor a empresa. Nestes anos, passamos a maior parte do tempo focados no aspecto editorial, que era nosso principal produto, e que precisava ser desenvolvido até atingir a tal massa crítica de que falei antes. Agora temos "linhas de negócio", digamos assim, que precisam ser desenvolvidas, então precisamos mais de administradores do que de jornalistas, se é que você me entende... Infelizmente, não tenho nenhum "print" para te passar (ainda). Vamos começar a mexer nas paginas internas, primeiramente, e depois passaremos para a homepage. (Eu falei na questão do portal muito pela visitação que atingimos, mas a aceitação foi tão grande (da idéia) que acabei me convencendo de que o caminho para a home é esse mesmo...) 4. No mundo dos negócios e da internet, oito anos parece uma eternidade. Penso muito na relação tempo/sucesso, quanto tempo uma pessoa persistente demora para marcar seu gol. A gente até escreveu uma matéria sobre o assunto na edição deste mês da Results (link). Você acha que poderia ter atingido essa meta mais cedo? O que teria faltado? O que aprendeu sobre audiência, empreendedorismo, negociação, funding nessa trajetória? Bem, o Digestivo atingiu o sucesso editorial relativamente cedo — acontece que esse tipo de sucesso nem sempre se reflete em sucesso empresarial (da empresa mesmo). Quando o site tinha menos de um ano, recebemos um primeiro e-mail de cumprimentos do Millôr Fernandes (eu ainda trabalhava em banco). Antes do Digestivo, eu já havia recebido um telegrama do Rubem Fonseca. São, além de grandes escritores, pessoas muito reservadas, meio inacessíveis, que não ficam enviando os parabéns para qualquer pessoa (ou empreendimento)... Com dois anos, saímos na Carta Capital (ao lado do extinto NoMínimo); com três, conseguimos a Livraria Cultura como anunciante; com quatro, saímos no Manhattan Connection e fizemos uma revista (em papel) com FGV/SP. Editorialmente, as coisas continuaram, mais ou menos, nesse ritmo... Ocorre que a empresa só começou a se desenvolver, plenamente, em seu segundo ano de atividades (2005, quinto ano de Digestivo — o site nasceu, como domínio, bem antes da empresa). Como falei anteriormente, pegamos o pós-bolha — não intencionalmente, é claro, mas porque meu interesse, inicial, não era lançar uma empresa na bolsa, era mais realizar um sonho de trabalhar com cultura e fazer alguma coisa de relevante, para essa área, na internet. Eu falo muito em Web 2.0, porque acredito que as coisas "aconteceram" para nós, empresarialmente, a partir daí (2005) — você sabe: banda larga, conteúdo gerado pelo usuário, ascensão das mídias sociais... O que eu teria feito de maneira diferente? A gente sempre acha que teria planejado mais, desde o começo, mas existe uma espontaneidade, no início, que é necessária para a criação de qualquer negócio. Se você começa estruturando muito, a criatividade morre e não sai nada com muita personalidade. A grande questão — como coloquei na primeira resposta a você — é que eu não me imaginava como "empresário", logo de saída, mas como editor de revista... Se fosse abrir outra empresa, faria hoje muito diferente do que fiz; mas só posso dizer isso agora porque passei por essa fase preliminar ("de pessoa física para pessoa jurídica"). 5. Houve momentos em que pensou em desistir? Por que não o fez? O que enxergava no futuro? O que o mantinha trabalhando nisso? Eu vivi na linha tênue entre a obstinação e a teimosia: tive, claro, motivos para desistir, mas nunca aceitei "depor as armas", porque, no fundo, sabia que encontraria o caminho. Foi, também, uma aposta de vida, uma necessidade de encontrar "coerência", de acreditar que havia um sentido maior no meu trabalho (difícil de achar, para mim, dentro de um banco ou de uma grande corporação...). E tive, naturalmente, o apoio da minha família, da minha namorada (hoje, esposa) e de muitos bons amigos. Eu, intuitivamente (de novo), sabia que a internet era uma coisa para o futuro. Sempre discuti, muito com jornalistas, que a digitalização viria em todas as áreas da cultura. Eles teimavam (muitos ainda teimam), mas estamos vendo que a internet vai tomando, cada vez mais, conta... Eu não conhecia o Warren Buffett em 2000, mas estava seguindo seu conselho (sem saber): estava "comprando na baixa" (pós-bolha) para "vender na alta" (Web 2.0 e depois). Montar uma coisa na internet, em 2000, era como comprar um pedaço de terra no meio deserto; mas prevaleceu também aquela máxima do filme Campo dos Sonhos: "If you build it, they will come". Se você construir, eles virão... Para ir além Revista ResultsON Julio Daio Borges |
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