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Segunda-feira, 19/5/2008
O e-mail não é mais a mensagem
Luli Radfahrer

Comentaram uma entrevista minha ao portal Adnews, em que defendi, entre outros pontos, que o fim do e-mail estava próximo. Bem próximo.

Acho que não me expliquei bem (em entrevistas, sabe como é, nunca há tempo). Na verdade, acredito que a era do e-mail já acabou. Aquilo que todos usamos para combater spam, receber informações (e confirmações) desnecessárias e, de vez em quando, contactar amigos, é apenas o resquício de um meio de comunicação cujos dias de importância se foram. Em breve ele será tão relevante quanto uma carta manuscrita, enviada dentro de um envelope selado. O ciclo da tecnologia em plena ação.

Ele bem que teve seus dias de glória. Sua história se confunde com a da própria Internet e, mesmo sendo bem mais velho que a Web, nunca sofreu a humilhação de ser passado para trás por um "2.0" qualquer. Surgido na década de 1960 como uma forma de comunicação muito mais potente (e segura) que o correio, ele mudou pouquíssimo. Webmail, por mais que Microsoft, Yahoo! ou Google afirmem, ainda é o mesmo texto com arrobas, em um suporte mais conveniente.

O golpe veio de vários lugares, quase que simultaneamente, e foi uma genuína crise dos 40 anos que já dura um pouco mais de uma década. Tudo começou quando quatro rapazes de Liver Israel quiseram mudar o mundo e fizeram uma revolução ao criar um serviço de comunicação instantânea que permite saber se a pessoa com se fala está on-line ou não (ICQ ou, por extenso, I seek you). Coisa de nerd, diriam. A piada fácil na época era rimar o nome por extenso do serviço em inglês com o potente vírus de computador ILOVEYOU. Mesmo com muitas idéias tortas (a de usar um número para contatar o amigo, por exemplo), a moda pegou.

Mais ou menos na mesma época, alguns serviços de telefonia europeus promoviam o uso de mensagens de texto pelos celulares, que, naquele tempo, só falavam. Quer coisa mais de nerd que escrever "555885555444411088826 (pausa) 6667777026660222444663362111″ para dizer "Luli, vamos ao cinema?". Apesar de todo mundo ter serviços GSM ― uma inegável vantagem em termos de compatibilidade ―, o SMS esperaria o século XXI para pegar. E pegou. 10 bilhões por mês, só em uma operadora. Até porque todos logo perceberam que o envio de uma mensagem não deveria depender da intermediação de um computador.

E nem de texto: minha avó já sabia faz tempo que certas coisas não se diz por escrito. Eu não acredito que ela se referisse a estresse, sobrecarga de tarefas ou preguiça, provavelmente falava de privacidade. Pouco importa: a quantidade de informação a ser transmitida costuma ser inversamente proporcional ao tempo ou à disposição para escrevê-la e, em um mundo de banda larga (e conexão permanente), não faz mais sentido tentar "traduzir" seu tom de voz com emoticons, se você pode, simplesmente, falar! Não passa uma semana sem que alguém anuncie o fim da telefonia por causa de tecnologias como VoIP. Tudo bem, não há como negar que o tráfego de telecomunicações é importante demais para ser usado por voz em formato analógico (que, além de pesado, é ineficiente). Mas, enquanto a tecnologia não substitui de vez as linhas telefônicas, quem apanha mesmo é o e-mail.

A lista não tem fim: pelo Twitter, seus amigos sabem onde você está e o que anda fazendo. Ele é uma espécie de feed RSS do seu cotidiano (seja ele interessante ou não). Eu gosto dele, tem gente que não gosta, mas isso não é assunto para este texto. Por falar em feeds, qualquer blog decente envia seu conteúdo através deles, o que faz com que muitas malas diretas de conteúdo (newsletters) percam sua razão de ser. Como se não bastasse, o Flickr permite que seus amigos "assinem" as imagens que você cria... Você vai usar e-mail pra quê?

Talvez para a transmissão de comprovantes e documentos ― como tem gente que ainda usa o aparelho de fax hoje em dia ― e, claaaro, para publicidade não solicitada (e-mail marketing). Quem diria que os burocratas, advogados, jornalistas e publicitários seriam defensores desse meio que um dia foi a maior expressão da internet... (Quem sabe, daqui a uma década, deixemos a Web para que eles tomem conta...)

Descanse em paz, senhor e-mail! Poucos chorarão seu triste fim, sob certos aspectos semelhante ao velho, cansado e desatualizado serviço de envio de mensagens de texto por correio. Este, por mais que seja chamado de "tradicional", teve um importante papel na democratização, inovação e expansão do serviço de mensageiros (os tais moleques de recados) que veio a substituir. Mas quem se importa com isso?

O darwinismo tecnológico é cruel. Ainda bem.

Nota do Editor
Texto gentilmente cedido pelo autor. Originalmente publicado no site de Luli Radfahrer.

Luli Radfahrer
São Paulo, 19/5/2008

 

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